terça-feira, outubro 12, 2004

Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo de 10 de Outubro, 2004

antes e depois

Luís David

podem ter um grande significado

Conserva a EDM, na sua história recente, factos e acontecimentos de inegável valor, de grande importância. Na e para a vida de todos nós, também. Pode dizer-se, sem exagero, são muitos os exemplos de trabalho abnegado, de heroicidade até. Seria de todo injusto não recordar o esforço desenvolvido para levantar torres de transporte derrubadas durante a guerra no sul do país. Seria de todo injusto não recordar o esforço desenvolvido para fornecer energia a Maputo, por meios alternativos, mesmo que parcialmente. Seria de todo injusto não recordar os muitos trabalhadores da EDM que se afoitaram em zonas minadas. E que, por isso, pagaram elevado preço. Pagaram o preço de rebentar uma mina. Certo é, que o fim da guerra veio colocar outros e novos desafios. O maior dos quais consiste, sem dúvida, na electrificação do país. É neste contexto, parece ser neste contexto, que a EDM mergulha, deliciada, no liberalismo económico. Mais. Atreve-se, mesmo, a enveredar pela via do capitalismo selvagem. E, aí, começa a sua desumanização. Mais grave, ainda. Renega, esforços, valores e vidas, perdidas no passado, para apostar numa via que sabe, ou devia saber, não ter futuro. Ou ter futuro mais do que duvidoso.


Recordar, aqui, o que tem sido o descalabro da gestão da EDM nos últimos anos é, no seu todo, um exercício inútil. Voltar a escrever sobre a forma como foi introduzida e é cobrada a taxa de recolha de lixo, sequer faz sentido. Porque ninguém age, ninguém quer saber quando se apontam ilegalidades. Mas, mesmo sabendo que assim é, que assim vai sendo, há factos mais recentes que não devem ser aceites como normais. Por exemplo, na minha zona, o prazo limite para o pagamento dos consumos de energia foi, durante muito tempo, o dia 10 de cada mês. Até Julho do corrente ano, assim foi. Depois, em Agosto, passou para o dia 5 e 25. Quer dizer, dois pagamentos num único mês. Já no mês de Setembro, o limite foi o dia 20. No mês em que estamos, vamos ter de pagar até ao próximo dia 15. Quer dizer, para quem possa não estar a perceber bem o que se passa, impera o caos e a desorganização na EDM. Com uma situação agravante. Quando são emitidas duas facturas num mês, como foi o caso de Agosto, são cobradas duas vezes a taxa de rádio e de recolha de lixo. Onde fica ou para onde vai este dinheiro cobrado ilegalmente, é questão que importa esclarecer. Por quem deve e tem poder para o fazer. Mas, tem mais em matéria de ilegalidade e da forma subtil utilizada pela EDM para extorquir dinheiro aos seus consumidores. A situação não é nova, há muito foi denunciada. Mas a vigarice continua. Estamos a falar dos tão publicitados credelec. Estes aparelhos, que para uns parece serem milagreiros e para outros milagrosos, comportam-se, mais coisa menos coisa, como as máquinas de casino, as conhecidas “caça-níqueis”. O lucro é sempre para o dono, o dono jamais perde. Primeiro, porque ninguém gosta de perder e, segundo, porque a máquina foi programada para ganhar sempre, foi programada para não perder. Pois, então, o dito credelec também está programado para que sempre que o consumidor compre energia pague a taxa para a RM. Sempre. Independentemente do valor da compra. Quem compra cem contos de energia, paga dez contos. Quem compra 500 ou mil contos, paga os mesmos dez contos. Quem compra energia três vezes por mês, pagas três vezes a taxa para a RM. Quem compra uma vez, paga uma vez. Questão última, é a de saber como a EDM controla esta cobrança, abusiva e ilegal, de taxas e como faz a sua entrega à RM. Ou se, simplesmente, faz uma entrega por estimativa. Possa perecer que não, em época de eleições estas pequenas coisas, estes pequenos esclarecimentos podem ter algum significado. E, se nos soubermos situar na nossa realidade, podem ter um grande significado.

segunda-feira, outubro 04, 2004

Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo de 3 de Outubro, 2004


antes e depois

Luís David


a continuação da paz é possível


Assinala-se, amanhã, mais um aniversário da assinatura dos Acordos de Roma. É uma data que se junta a muitas outras da história recente de Moçambique. É uma data que significa paz. E que tem a particularidade de, no acontecimento que deu origem à comemoração, ter sido protagonizada por dois moçambicanos, ambos vivos. Um, Joaquim Chissano, que está prestes a deixar a Presidência da República. O outro, Afonso Dhlakama, candidato ao lugar que vai ficar vago. E, foi há poucos dias, quando procedeu à entrega dos documentos para a sua candidatura a Presidente da República, que o presidente da RENAMO fez questão de deixar claro que a paz será um dado adquirido. Irreversível, como todos desejamos. Disse, na ocasião, aceitar os resultados das próximas eleições, sejam quais venham a ser. Como teve palavras elogiosas para com o actual Governo dirigido pela FRELIMO. Mais, palavras de reconciliação. Ou, se assim o quisermos entender, uma postura de Estado. Esperemos, e façamos votos, para que as cerimónias do dia de amanhã confirmem, venham confirmar as previsões de hoje e garantir um futuro de paz. Ou a paz no futuro. O que podendo parecer não é, exactamente, a mesma coisa.


Com a assinatura dos Acordos de Roma, Moçambique entrou numa nova era. Criadas as condições para a paz, assumida a paz como um bem, foi possível caminhar no sentido da reconstrução e do progresso. Mesmo que relativo, mesmo que mitigado. Aspecto importante e fundamental, é o de ter passado a ser possível a circulação de pessoas e de bens por todo o país. Salvo raras excepções e em zonas bem definidas. Que bem podem, num futuro imediato deixar, também, de ser excepção. O que não impede o entusiasmo com que se fala no desenvolvimento do turismo. Uma indústria que, como todos sabemos, pode vir a ser importante fonte geradora de divisas. Motivo de preocupação é, isso sim, o registos de assaltos, com armas de fogo, a viaturas que circulam por estradas do Sul do país. Principalmente na Nacional 1 e 4. Hoje, informação que passa boca-a-boca ou enviada por correio electrónico, aponta locais dos assaltos, métodos utilizados pelos assaltantes, marca e cor das viaturas em que se fazem transportar. Por estranho que pareça, até ao momento, a Polícia de Trânsito não divulgou nenhum alerta, não emitiu nenhuma informação sobre cuidados a ter em zonas consideradas de circulação perigosa. E, já teve suficiente tempo para o fazer. Esperemos que não seja necessário a perda de vidas humanas para a tomada de medidas que situação aconselha. A paz, convenhamos, não é só a ausência da guerra. Muito menos poderá ser um processo unilateral. A paz só é possível se for um processo global. E, os últimos sinais indicam que, se todos quisermos, a continuação da paz é possível.