domingo, abril 15, 2007

apanhar a última carruagem com o combóio em movimento

Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo de Abril 8, 2007

antes e depois

Luís David

Tem este país, Moçambique, alguns aspectos de originalidade. Digamos que aqui despontam, crescem, vivem, multiplicam-se alguns fenómenos. Podemos traduzir fenómeno por coisa anormal. Por anormalidade. Se de outra forma se preferir, por monstruosidade ou por aberração. Ora, uma das aberrações existentes neste país parece ser o de existiram duas aposições ao poder legalmente constituído. Uma, legal, oficial, parlamentar. Resultante do simples facto de tendo concorrido a eleições as não ter vencido. Por isso, como segundo partido mais votado, se constitui, por força do resultado apurado nas urnas, em oposição. A outra, a outra oposição, formou-se por si própria e a si própria se classificou de construtiva. Lá terá as suas razões e as suas motivações para adoptar o qualificativo pelo qual optou. Acontece que esta segunda oposição, a chamada oposição construtiva, não terá gostado de algumas declarações públicas do líder da primeira. Da primeira e da única oposição, de facto. Vai daí, se bem pensou, rápido agiu. E como é público e conhecido, apresentou queixa - crime na Procuradoria Geral da República. Com o argumento de incitação à violência. Ora, é bom, é tranquilizador, é tranquilizante, sabermos o que ficámos a saber. Que há, que existe neste país um Bloco de Oposição Construtiva atento aos pronunciamentos dos membros da outra oposição. Da verdadeira e única. E que quando lhe parece a membros daquela que membros desta última se excedem em termos de linguagem, logo os processa. Naturalmente, em defesa dos legítimos direitos de todo o povo. E, como se dizia, em tempos de triste memória, a Bem da Nação.


Na nossa política caseira, doméstica, nativa, indígena, o que parece de todo original é a capacidade imaginativa e criativa. De resto, ninguém poderá negar ausência de talento ou falta de espírito de iniciativa quando, como é o caso, se cria o que é chamado e ficou conhecido como Bloco de Oposição Construtiva. Em termos práticos e na realidade, trata-se de uma oposição à oposição. Mais claramente, de uma oposição fictícia à oposição real. Em termos de lógica, a oposição à oposição não pode ser diferente de oposição à oposição. Logo, e por exclusão de partes, a oposição à oposição parece não poder encontrar outra definição e outro espaço que não seja o de posição. Sendo, assim, a oposição à oposição, posição, logo é concordante com maioria parlamentar e, por inclusão de partes, com as políticas governamentais e com as suas formas de aplicação. Na nossa realidade política interna actual, perante a forma como estão distribuídos os assentos no Parlamento, não há espaço para uma terceira força. Que, em termos reais, nunca poderia ter força alguma. Acreditar que sim, é alimentar uma ilusão. A ilusão de que, fazendo oposição à oposição, é possível ganhar espaço e ter lugar na posição. Arranjar aquilo a que, em linguagem popular ou chula, se chama de tacho. Não um tacho, de barro, alumínio ou esmalte, para fazer comida. Mas, muito simplesmente um tacho. E, um tacho, em termos de política e neste caso, equivale a dizer que um tacho é um tacho. Ou que há quem procure apanhar a última carruagem com o combóio em movimento.