segunda-feira, julho 30, 2007

caça às bruxas

Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo de Julho 29, 2007

antes e depois

Luís David

Há quem diz que o Desporto é uma escola de virtudes. Mas, pode ser um dito falso. Uma afirmação não verdadeira. Pode não passar de uma vontade. De um desejo. De uma crença. De um mito. O Desporto tem, isso sim, virtudes. Quando praticado dentro de certas normas. Quando praticado de acordo com valores éticos e morais de consenso, com base em regras aceites em comum. Ora, quando surge alguém a violar essas regras ou regulamentos para obter vantagens ou benefícios pessoais, o Desporto perde muita da virtude que se lhe pretende atribuir. Quando a vitória é procurada por meios ilícitos, deixou o Desporto de ter qualquer virtude. Quando alguém tenta aumentar a sua resistência física natural por processos artificiais, o Desporto é o primeiro derrotado. Quando alguém tenta, seja de que forma for, alterar a sua idade ou peso, para poder competir e tentar vencer os com menor idade ou com mais ou menos peso, o Desporto está doente. Neste caso, parece urgente fazer uma radiografia e alguns exames médicos. Não ao Desporto, como parece evidente. Mas a quantos tentam, por métodos e processos fraudulentos, chegar à vitória. Para que a ética e a moral, numa palavra a verdade desportiva não seja derrotada.


Digamos, sem receio de erro, que a realização dos Jogos Desportivos Escolares é uma boa iniciativa. Uma iniciativa feliz. Que permite a competição desportiva em diferentes modalidades e entre jovens de todo o país. Que permite um intercâmbio cultural entre jovens do todo nacional. Que proporciona uns tantos dias de convívio entre rapazes e raparigas, habitualmente, separados por milhares de quilómetros. E que, mais do que conquistar medalhas, talvez a grande vitória esteja na permuta de ideias, de pensamentos, de desejos, de ambições. Se assim, se o objectivo a atingir com os Jogos Desportivos Escolares vai para além da vitória provincial no campo meramente desportivo, algo está errado. Algo tem estado errado, algo pode estar errado na preparação psicológica desses jovens atletas, desses jovens competidores. É que eles podem, muito bem, estar, simplesmente, a ser preparados para serem, apenas, vencedores. Não para saberem aceitar a derrota, não para serem vencidos dignos. Tudo o que se diga ou possa vir a dizer, em nada justifica os casos de falsificação de idades. Verificados nestes Jogos de Quelimane. Menos ainda, as cenas de apedrejamento. De adeptos de vencidos, contra vencedores. Para além do elevado número de doenças diagnosticadas. Que, sem dúvida, afectarem o nível competitivo e de intercâmbio. Ora, a realidade parece indicar que estamos perante um tempo de parar para pensar. E, mais do que pensar, repensar todo o modelo de organização actual dos Jogos Desportivos Escolares. Parece fazer pouco sentido anunciar, hoje, punições severas para jovens falsificadores de idades quando, ontem, se lhes pedia vitórias sem condições. Vitórias a qualquer preço. É tempo de criar mecanismos para fazer respeitar os valores morais e éticos em que, pensamos, pensa quem tem o poder do mando, dever assentar o desporto nacional. Enquanto não, podemos estar apenas perante um processo diabólico. Um processo que, em boa gíria, se chama de caça às bruxas.