domingo, julho 08, 2007

O combate ao crime é um problema estrutural

Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo de Julho 8, 2007


antes e depois

Luís David

Para quem chegue pela primeira vez a Moçambique, num destes dias anormalmente frios de Julho, Maputo é uma cidade calma. Uma cidade onde se pode passear calmamente em qualquer artéria. Na qual não se detectam sinais de violência. De banditismo. De criminalidade. De assaltos. De roubo. Seja com recurso a ameaça com arma branca, seja por esticão. Enfim, por um qualquer método ou artimanha de que se socorre o ladrão menor. O ladrão de ocasião. Digamos mesmo que, nos tempos que passam, o tipo de ladrão ocasional a que as polícias pouca atenção prestam. Depois, aqui em Maputo, até estão aí essas patrulhas apeadas. De três ou mais agentes. Caminhando calmamente de artéria em artéria. Carregando as suas armas, cano apontado para o chão. Como que a tentarem dizer que aqui nada acontece de anormal, aqui nada vos pode acontecer. Como que a tentar dizer, nós cuidados da vossa segurança. Mas, esta imagem de segurança, de protecção, pode ser uma imagem de ilusão. É que estes polícias, estes homens e mulheres, que pensam poder estar garantir a nossa segurança podem ser tão vulneráveis como qualquer cidadão. E, até são. A forma calma como se movimentam, pode não ser mais do que uma calma inconsciente perante o perigo que correm. Pelo perigo que enfrentam, sem o saberem. Um inconsciência ou uma negligência que os pode transformar em alvo ou em vítimas do crime violento. Pelo simples facto de serem portadores de armas.


Durante bastante tempo, o argumento para a fragilidade no combate ao crime violento foi a falta de meios. Hoje, com os mesmos ou com mais meios, parece um argumento ultrapassado. Na realidade, o que estamos a assistir, o que estamos a verificar, é que o bandido, o ladrão, o criminoso mudou de táctica e de métodos de actuação. Tomou a iniciativa e tomou a dianteira. Não esperou para ver. Diz a realidade, que alguns dos crimes registados nas últimas semanas já deviam ter levado a um outro tipo de análise. No mínimo, a uma análise. E á concepção e divulgação de um plano de emergência, tendo em vista enfrentar e inverter a situação. É que permitir que se roube uma viatura parqueada numa esquadra, depois de recuperada a ladrões, não é normal. Como não é normal que os assaltantes a uma dependência bancária o façam com recursos a armas roubadas minutos antes a uma patrulha policial. Estranho não deixa de ser que, um agente que manda parar um condutor seja assassinado em circunstâncias pouco claras. Ora, perante a realidade destes casos recentes, parece necessário falar em preparação, em prontidão, em mobilização e em engajamento no combate ao crime. Mas, também e sobretudo na actualização constante do conhecimento sobre os métodos a que recorre o criminoso. Não nos deixemos cair, de novo, na ilusão de que o combate ao crime é um problema de falta de meios. Por, objectivamente o não ser. Quando agentes da polícia são desapossados das suas armas em acção de patrulha, a situação é bem mais complexa e mais perigosa do que parece. Quando ladrões entram em esquadra de polícia e retiram viatura recuperada a ladrões, desvanece-se toda a nossa ilusão de segurança. Toda a ilusão de que uma esquadra é o último local seguro a que o comum dos cidadãos pode recorrer em caso de ameaça. Como se sabe em nenhum dos dois casos pode ser invocada falta de meios. Nesta lógica, muito provavelmente o combate ao crime não é uma questão conjuntural. Não é, hoje, um problema de meios. É, isso sim, de vontades. Na nossa sociedade, na sociedade moçambicana actual, o combate ao crime é um problema estrutural.