domingo, novembro 30, 2008

um presente envenenado

Muito provavelmente, a este tempo, já terão sido divulgados os resultados finais das eleições autárquicas. Que, podem ter acrescido, que podem ter acrescentado pouco ou nada aos resultados parciais. Que poderão trazer novidade nenhuma em relação ao que vinha sendo conhecido. E, o que era conhecido atribuía a presidência de 42 dos 43 municípios à FRELIMO. As perdas da RENAMO, neste capítulo, parecem motivar algum descontentamento interno. Daí que quadros desta formação política tenham vindo a público defender a realização de um congresso extraordinário. De facto, a este nível de governação, a RENAMO perdeu terreno e perdeu espaço. Governa, hoje, em menos locais. Para se ser claro e objectivo, governa em nenhum local. Não governa nenhum município do país. Aparentemente, estamos perante um fenómeno que contraria a lógica. Porque a lógica seria consolidar posições antigas e conquistar novas. Assim não aconteceu. Mas, certamente, haverá outros aspectos a não perder de vista. Quando e principalmente, no seu íntimo, Afonso Dhlakama, já possa ter assumido que tem um mínimo de possibilidades de vir a ser Presidente da República. Talvez possibilidades nenhumas.

Vista a questão por prisma diferente, fica, neste momento, por saber quem irá ou quem poderá partilhar a vitória pessoal de Daviz Simango na Beira. E, muito claramente, se a vitória de Simango pode significar, em termos de futuro, uma derrota da RENAMO ou uma derrota da FRELIMO. A RENAMO, como a conhecemos hoje e conhecendo a sua génese, parece facilmente integrável. É facilmente dominável pela FRELIMO. Ou por uma certa FRELIMO. Será uma questão de negociação. De estatuto a conceder ao seu líder. Que já percebeu, que já entendeu, que tem hipótese nenhuma de chegar, em tempo algum, a Presidente da República. Por isso, resta-lhe a possibilidade de continuar a negociar para manter o estatuto de líder da oposição. O que já não será mau. E, ao que parece, não irá para além das suas ambições. A vitória de Simango na cidade da Beira, não é, em si, um processo simples. A sua governação vai exigir alianças. Pode vir a motivar a criação de novas formações políticas. Do que parece existirem poucas dúvidas. Por certo, os derrotados Namburete, em Maputo, e Samo Gumo, na Matola, serão potenciais aliados do vencedor na cidade da Beira. Às próximas presidenciais. Se assim, estamos perante um presente envenenado.

domingo, novembro 16, 2008

que a morte de Makeba inspire Saviano para novos combates

Miriam Makeba morreu aos 76 anos. Morreu perto de Nápoles, na Itália. Morreu de crise cardíaca e após ter cantado. Em missão das Nações Unidas e para chamar a atenção do mundo para uma questão aparentemente simples. A da necessidade de um muito maior empenho no combate ao crime organizado e ao tráfico de drogas. Ao crime organizado que, naquela região, tem como expoente máximo a Camorra. Ou, se se preferir morreu no decorrer de um concerto em homenagem a Roberto Saviano, autor de “Gomorra”. Que, hoje, vive “oculto e sob protecção policial”. Após a edição deste seu primeiro livro, que já vendeu mais de um milhão de exemplares em Itália. Um livro sobre o qual o “The Guardian” escreveu: “(...), de vez em quando, é preciso parar e relembrar que se trata da vida de uma grande cidade, numa nação rica, na Europa Ocidental; em membro fundador da UE; um país cujos negócios se interligam – perigosamente, sugere Saviano – com os nossos.

Roberto Saviano nasceu em 1979 em Nápoles, onde vivia a trabalhava até que, em Setembro de 2006, o êxito do livro, que cita nomes e lugares, o obrigou a viver oculto e sob protecção policial permanente. “Gomorra”, foi editado em língua portuguesa, com data de Janeiro de 2008, pelas Edições Asa II. Trata-se de um trabalho de jornalismo de investigação. Ou, se assim se preferir, de uma viagem ao mundo dos negócios e do crime da Camorra. Onde impera o “trabalho infantil”, tema que irá merecer abordem em próxima edição. Dizer que, após mencionar o número de mortos, ano por ano, desde 1979 até 2005, Roberto Saviano escreve: Três mil e seiscentos mortos desde que nasci. A camorra matou mais do que a máfia siciliana, mais do que ‘ndrangheta’, mais do que a máfia russa, mais do que as famílias albanesas, mais do que a soma dos mortos feitos pela ETA em Espanha e pelo IRA na Irlanda, mais do que as Brigadas Vermelhas, do que os NAR e mais do que todas as vítimas do Estado ocorridas em Itália. A camorra matou mais do que todos. E, logo a seguir, para que não percamos de vista o local a que se refere, acrescenta: Aqui é o coração da Europa. Aqui se forja a maior parte da economia da nação. Quais são as suas estratégias de acção, pouco importa. O que é necessário é que a carne para canhão permaneça atolada nas periferias, rebentada nos emaranhados de cimento e lixo, nas fábricas clandestinas e nos armazéns de coca. E que ninguém faça sinal, que tudo pareça uma guerra de bandos, uma guerra de maltrapilhos. Já na página seguinte (147), o autor de “Gomorra” escreve: A matança de Secondigliano atrai a atenção que faltava pelas dinâmicas da camorra há vinte anos. No norte de Nápoles a guerra mata em pouco tempo, respeita os critérios jornalísticos da crónica, em pouco mais de um mês acumula dezenas e dezenas de vítimas. Parece feita de propósito para dar um morto a cada enviado. O sucesso para todos. Foi, sem dúvida, para chamar a atenção do mundo sobre como se desenvolve o crime organizado naquela região de Itália que Makeba aceitou participar num concerto em Nápoles. Dizer que morreu como sempre soube viver, é nada. Dizer que morreu a lutar contra injustiças sociais, é pouco. Mas, talvez seja justo considerar imperativo que a morte de Makeba inspire Saviano para novos combates.

domingo, novembro 09, 2008

não passavam de farinha do mesmo saco

A campanha eleitoral para as Autárquicas do próximo dia 19, está em marcha. Os concorrentes à presidência dos 43 municípios já se fizeram à rua. Isto é, iniciaram as suas campanhas de propaganda eleitoral. Pelos discursos ouvidos nos dois primeiros dias, não existe matéria para qualquer tipo de avaliação. Para fazer uma avaliação. Para que se possa dizer onde e se há só promessas realizáveis. Ou se, pela inversa, também há promessas eleitorais que os candidatos sabem, de antemão, não poder nunca vir a cumprir. De registar, de salientar, o facto de o primeiro dia de campanha ter sido calmo. Pese o facto de uns poucos incidentes, isolados e localizados, entre simpatizantes de partidos concorrentes adversários. Neste contexto, resta desejar que este tipo de incidentes tenham sido os primeiros e os únicos. Que não se repitam. Que não tenham sequência e que tenham sido, apenas, precedente. De resto, a violência, o confronto físico não levam a local nenhum. Não podem resolver problema nenhum. E, se há ou quando houver violação da Lei, existe apenas uma solução. Só existe uma solução legal e civilizada. A do recurso às autoridades competentes.


Já no interior da RENAMO, surgem discursos diferentes. Bem diferenciados. Discursos, aparentemente, antagónicos. O que também não admira. Por não ser a primeira vez que tal acontece. De um lado, está o discurso belicoso e incitando à violência primária. Ameaçador. Do outro lado, ouve-se um discurso conciliatório, pacifista, legalista. Um discurso que, no mínimo, aponta para a aceitação do veredicto final do Tribunal Administrativo. Isto, depois de a Comissão Nacional de Eleições ter confirmado a exclusão de três candidatos deste partido. À presidências de outros tantos municípios. Devido à apresentação de documentação irregular. Ameaçar boicotar as eleições caso os referidos candidatos sejam, definitivamente, excluídos, não leva a lado nenhum. Revela, isso sim, uma total falta de cultura política. E um elevado défice democrático. A menos que estejamos perante uma nova estratégia eleitoral. Ou uma farsa. Com o objectivo de criar, única e exclusivamente, factos políticos. Em que possa haver uma divisão de tarefas. Segundo a qual, a um cabe a tarefa de desempenhar o papel de mau. Para o outro, fica a tarefa de desempenhar o papel de bom. Se assim, o método não contem qualquer inovação. Não constitui novidade. Possa não ter sido inventado pela polícia política colonial, foi por ela muito utilizada nos interrogatórios dos presos políticos. Uma vezes, eram interrogados pelo polícia mau. Noutras ocasiões, pelo polícia bom. Na verdade e em definitivo, não passavam de farinha do mesmo saco.

domingo, novembro 02, 2008

que se pronunciem os donos da verdade

Quando as águas do Nilo saem do leito do rio e inundam as margens, não há motivo para alarmes. Significa que as terras marginais, as terras adjacentes, ficam, naturalmente, fertilizadas. Significa época ou ano de cultura fértil. Abundante. Os homens não podem, não têm meios nem técnica nem poderes para evitar que as águas do Nilo saiam do seu leito normal. Habitual. Mas, em termos agrícolas, em termos de agricultura indígena, sabem como tirar o máximo de benefícios, o máximo de rendimento nas terras cobertas por muitas toneladas de lama. A lama, transportada para as margens pelas águas da inundação, é como que um benefício dos céus. Nós, por cá, parece não termos, fenómenos semelhantes. Nem cultura assim. Nós por cá, temos queimadas. Tema de muita falácia em tempos recentes. Modernamente, chamam de queimadas descontroladas às queimadas feitas pelos nativos. Pelos indígenas. Muito provavelmente, trata-se de um termo sugerido por uma qualquer ONG. Para não dizer imposto. Quer-se dizer, um eufemismo. Ora, digamos, com toda a propriedade, as queimadas, em si mesmas, não são um mal. E, constituem um factor importante na fertilização dos solos. As queimadas não começaram a ser feitas em Moçambique. Nem começaram a ser feitas ontem. Nem há dez, cinquenta ou cem anos. As queimadas começaram a ser feitas em épocas remotas. Remontam ao tempo em que o homem aprendeu a fazer fogo. Aqui, estamos a falar em termos de milénios. As nossas queimadas, nacionais, moçambicanas, não são descontroladas desde ontem nem desde de anteontem. Sempre foram descontroladas. Porque, se quisermos ser sérios e honestos, não há processo de controlar uma queimada a partir do momento em que é lançado fogo na mata. O que está a acontecer, parece simples. Elementar. As queimadas ditas descontroladas começaram a afectar interesses estrangeiros instalados. Interesses do capitalismo selvagem. Que nada têm a ver com a defesa da natureza. E, muito menos, das populações locais.


Dois incêndios no edifício do Ministério da Agricultura e um em serviços dependentes do Ministério das Finanças, em curto espaço de tempo, justificam alguma reflexão. Deveria. E uma reflexão séria e honesta. Mais do que uma reflexão, uma investigação. Que vá para além do que é óbvio e por todos sabido. Da esfarrapada desculpa da falta de meios para combater o fogo. A questão de fundo, nos casos em apreço, não é se existiam ou não existiam meios para combater o fogo. A questão de fundo não está em saber se os edifícios têm ou não escadas exteriores. Todos sabemos que não têm. E, não têm, aqui, como o não têm em nenhum outro país do mundo. Por tal não ser obrigatório. Em nenhum país se obriga a existência de uma escada interior e outra exterior. Sempre e quando exista um elevador. De resto, se o edifício não tinha condições de segurança para albergar um departamento do Estado, deveria ter sido recusado para tal fim. Mas, todas estas questões não passam de questões periféricas. Secundárias. Em definitivo, o que está em questão é saber se estamos perante simples acidentes, perante incidentes ou perante actos de sabotagem. Se sim ou se não, que se pronunciem os donos da verdade.