domingo, março 29, 2009

Todos haveremos de ganhar com a alteração

Parece estar a transformar-se em prática, nos últimos tempos, a contestação pública à forma de gestão de diferentes empresas. Públicas umas, sociedades anónimas outras. Nos diferentes casos, são trabalhadores quem contesta formas, actos e processos de gestão. Terão as suas razões. Terão os seus motivos. As suas motivações. E, a ninguém assiste o direito impedir esses trabalhadores de manifestarem as suas opiniões sobre. A sua visão sobre forma outra e diferente de gestão da empresa para a qual trabalham. De resto, fazer confrontar ideias e processos de trabalho é, a todos os títulos, um exercício útil. Louvável. Já não o será tanto quando se caia na tentação da acusação. E, de acusar sem provas. Sem prova da acusação que é feita. Em alguns casos. Ou de acusação por coisa mesquinha. Como parece ser o que acontece em outros casos. Temos de convir que as empresas que prestam serviço público ou que têm papel social ficam enfraquecidas com estes processos. E, se assim, ninguém ganha ou beneficia com o processo. Talvez, como dizia amigo meu, estamos a correr o risco de não encontrar ninguém que, no futuro, aceite ser PCA.


Tentar acusar, afastar, varrer, tudo quando seja PCA, parece ser exercício periódico. Altamente desgastante. Perigosamente destrutivo. Estamos, de novo, perante esse vendaval. Mas um vendaval que não parece natural. E que tanto pode vir a durar muito como pouco tempo. Que tanto pode causar muitos como pouco estragos. Ora, ao que se sabe, todas as empresas onde se afirma haver má gestão ou gestão ruinosa têm Conselhos de Administração. Têm colectivos de direcção. Têm Conselho Fiscal. Têm auditoria interna. Têm auditoria externa, cuja actividade e pareceres custam pequenas fortunas. Sendo que, sem possibilidade de desmentido, existem todos estes mecanismos de controlo, de acompanhamento e de aconselhamento, talvez seja de questionar se não é o modelo de gestão dessas empresas que está ultrapassado. Desajustado da realidade. É que esse modelo, em certos casos, parece, ainda, tentar harmonizar métodos e práticas socialistas com uma realidade capitalista. O que não é possível. Nunca foi, nem nunca virá a ser. Capitalismo e socialismo, não são verso e anverso de uma mesma realidade. Não são contraditórios. São, ambos, realidades em planos diferentes. O que o socialismo fez não foi eliminar o lucro. Base do sistema capitalista. O que o socialismo tentou fazer foi, isso sim, que o lucro fosse apropriado pelo Estado. E não por privados. O que, efectivamente, conseguiu. O que já não conseguiu, com sucesso, foi fazer uma distribuição equitativa da riqueza produzida. Ora, ao que parece, muita da confusão que hoje existe, entre nós, deriva do facto de se tentar gerir uma economia de mercado com resquícios de processos socialista. Tal não é possível. Deve o Governo interferir. E, interferir no sentido de alterar a legislação. Se tal se apresentar como necessário. E apresenta. É. Todos haveremos de ganhar com a alteração.

domingo, março 22, 2009

Ultrapassar a vontade e os interesses da hierarquia castrense

A lista seria, necessariamente, longa. Digamos, mesmo, fastidiosa. A lista a que me refiro, clarifico desde já, é a lista dos golpes de Estado. E dos assassinatos políticos. Em África. Desde a data em que os territórios até então dominados pelas, então, potências coloniais europeias, passaram a ser governados por elites nacionais. Sob qual tenha sido a forma de governação escolhida. Para o caso em apreço, para o caso que importa agora, há duas situações. As mais recentes. Que podendo parecer diferentes são, exemplarmente, iguais. A primeira situação, foi a registada na Guiné-Bissau. Onde o Presidente da República foi assassinado por militares. Barbaramente assassinado. E, clarifique-se, esta declaração não contém qualquer juízo de valor. É independente de o Presidente poder ter sido bom ou mau governante. A segunda situação, registou-se aqui bem mais perto de nós. Em termos geográficos. Foi em Madagáscar. Onde não terá havido mortos. Onde não terá havido derramamento de sangue. Mas onde os militares terão forçado o Presidente a dissolver o Governo e a abandonar o poder. E a entregar-lhes a si, militares, o poder. Em ambos os casos, parece estarmos perante um tipo de democracia que não deve vir a fazer escola. Que não deve vir a constar, futuramente, em manuais e compêndios escolares. Por ser uma democracia que assenta na ponta das espingardas. Por ser a negação da democracia.


Na Guiné-Bissau, aconteceu logo após o assassinato do Presidente da República. Militares de elevada patente apareceram perante as câmaras de televisões. A dizer que o sucedido não era, exactamente, o que parecia ter sucedido. Que sim, que o Presidente da República tinha sido assassinado por militares. Mas que os militares não queriam tomar o poder. Não explicaram o que queriam os militares que assassinaram o Presidente. Muito menos quem foram ou a mando de quem actuarem. De abertura de inquérito, sequer vale a pena falar. Disseram, isso sim, sem terem conseguido explicar ou justificar, que não tinha sido golpe de Estado. Terão dito, segundo relatos da Imprensa, que não queriam o poder. E, a teoria dos militares guineenses parece ter encontrado seguidores. Mesmo para além do minúsculo e ingovernável Estado africano do Atlântico. Europeus houve, ao que se ouviu, que terão apadrinhado a tese. E que terão gasto precioso tempo a tentar justificar, sem glória nem virtude, que quando se assassina um Presidente de República não estamos perante um golpe de Estado. Eis quando, em Madagáscar, também os militares, também militares, decidem pressionar um Presidente eleito. A abandonar o poder. E decidem, como parece terem decido, fazer sentar na sua cadeira um outro cidadão. Não eleito. Mas que parece ser da sua simpatia. Não gostaria de estar, e não estou, ao lado daqueles que irão ter muita dificuldade para justificar a legitimidade da mudança de poder na Guiné-Bissau e em Madagáscar. Os contornos ou as motivações que levaram os militares a tomarem o poder podem ser diferentes. Agora, o que é visível é que em ambos os países foram militares que tomaram o poder. Se se tratou de golpe de Estado, de golpe palaciano ou de putche, a resposta virá com o tempo. De concreto, estamos a saber que há descontentamento entre os comandos militares africanos. Mas, a democracia tem se saber ultrapassar a hierarquia castrense. Ultrapassar a vontade e os interesses da hierarquia castrense.

domingo, março 15, 2009

Coitadas das mil crianças moçambicanas

Orgulham-se os portugueses de uma recente sua invenção. A que deram o nome de “Magalhães”. Talvez, por motivos que não vem aqui ao caso aprofundar, seja mais correcto dizer alcunha. De qualquer forma e para todos os efeitos, Magalhães passou, assim, a ser nome de computador. Ao que parece, barato e bastante acessível às crianças. Que foi especialmente construído a pensar nas crianças. Daí, o facto de, em pouco tempo, já cerca de 200 mil crianças portuguesas estarem a “navegar” no ou com o ”Magalhães”. Sem terem de enfrentar os mares e os perigos que o navegador teve de saber vencer. Que venceu. Ora, generosos como são, como sempre foram, quiseram portugueses fazer beneficiar da sua inovação crianças moçambicanas. Em número de mil. Vai daí, e sem terem tido necessidade de se deslocaram por mar, como sempre o fez Magalhães, vieram pelo ar. Foi por este meio e por via de empresa lusa, com interesses económicos em Moçambique, que aqui arribaram os primeiros portáteis “Magalhães”. E, como parece ser de bom tom, com direito a pomposa cerimónia pública. Cordial. Amistosa. Cá. Talvez não tão exuberante como a dispensada pelos habitantes de Inhambane aos primeiros navegantes portugueses que ali aportaram. E que lhes terá merecido o “elogioso” epíteto de “terra da boa gente”. Ora, voltando à referida cerimónia do tempo actual, terá sido não mais do que a justificação de que o justificativo para uma ampla cobertura jornalística da oferta. Do gesto que se pretendia magnânimo. De resto, esta é uma forma de conseguir fazer publicidade a baixo custo. Muitas das vezes, sem qualquer custo. Mas que já não consegue passar desapercebida. Por haver cada vez mais pessoas atentes a estes gestos de generosidade.


Naturalmente, à data da oferta aos moçambicanos, pensavam os ofertantes estar a entregar coisa de qualidade. Coisa boa, coisa perfeita. Mas não. A perfeição não existe. O que existe é apenas o possível. E, o possível, em termos de “Magalhães” situa-se pouco acima da mediocridade. Quem o revela, quem o diz, e ao dizer pode estar a estragar uma festa já acontecida, é o jornal português “Expresso”. Que detectou, nas instruções dos jogos do portátil, mais de 80 erros. Entre frases mal construídas, expressões absurdas e frases que simplesmente não existem. É Portugal pátria dos dois Magalhães – do navegador e do computador. Como é dos principais defensores de um acordo ortográfico que virá a ter, provavelmente, utilidade nenhuma. Seja como vier a ser, o navegador Magalhães não merece os atropelos à língua portuguesa com que os seus descendentes o estão a homenagear. Cinco séculos depois da sua morte. Como se pode verificar, e este é o exemplo mais recente, os portugueses têm muita dificuldade em escrever correctamente e em expressar-se na sua língua materna. Logo, não têm direito nem legitimidade para impor normas linguísticas a quem quer que seja. Primeiro, aprendam. Tenham a humildade de saber aprender. Com quem sabe mais. Ou, simplesmente, com quem sabe. Perante este cenário, triste, resta senão lamentar a triste sorte das mil crianças moçambicanas a quem foram oferecidos os portáteis “Magalhães”. Coitadas das mil crianças moçambicanas.

domingo, março 08, 2009

desvio de fundos públicos

Com demasiada frequência, a sociedade moçambicana é abalada pelo revelar de contradições entre diferentes esferas da administração pública. De que resulta, em última instância, o desabono de algumas delas. E, disso, desse desabono ou com esse desabono, ninguém ganha nada. Pelo contrário. Todos perdemos. Vejamos um exemplo. O mais recente mas, certamente, não o único. Se estamos recordados, quando assumiu a pasta do Interior, o actual Ministro mandou fazer uma auditoria às contas de período anterior. Os resultados foram, por si próprio, entregues à Procuradoria Geral da República. Ao que se pode concluir, foi na sequência desse trabalho que o anterior Ministro e alguns dos seus colaboradores viriam ser detidos. Acusados de algumas dezenas de crimes por desvio de fundos públicos. Do desvio de avultadas somas em dinheiro do Estado. Depois, foi dito que não. Que não eram tantos os crimes nem tanto o dinheiro desviado. Sabe-se, agora, conforme o despacho de pronúncia, que o grupo de detidos terá desviado apenas 500 mil meticais. E que terá praticado apenas e um único crime. Mas, pode não ser exactamente assim. E, quem não concorda que seja assim é o Ministério Público. Como é óbvio, o Ministério Público não gostou desta aparente brincadeira. Não terá gostado desta aparente tentativa de atestado de incompetência que lhe estavam a tentar passar. Vai daí, ferido nos seus pergaminhos, fez o que lhe competia. Ou seja, recorreu para instância competente sobre o dito despacho de pronúncia. O assunto pode vir a transformar-se em filme. Talvez em novela. Então, esperamos pelas próximas semanas. Não sem deixarmos de comentar que, à luz dos factos tornados públicos, o despacho de pronúncia parece ter enfermado de alguma ligeireza. Ou que forte motivo, não conhecido publicamente, terá justificado a redução de cerca de cinco dezenas de acusações a uma única. Aguardemos para ver o que virá em seguida.

É frequente ouvir-se falar sobre crime organizado, sobre tráficos de armas, de drogas, e de influências, sobre lavagem de dinheiro, sobre enriquecimento ilícito. Há falta de provas, estaremos perante boatos ou de tentativas de agitação. Estaremos perante acusações não fundamentadas. De acusações que carecem de prova. Mas, também pode não ser exactamente assim. Um sinal positivo, surgiu há poucos dias. Por ocasião da abertura do Ano Judicial. Segundo a Imprensa local, o Procurador Geral da República terá dito estar preocupado com o enriquecimento ilícito. Resultante da prática de várias actividades ilegais. Entre as quais o desvio de fundos públicos. Ora, da leitura do presente texto, parece resultar haver diferentes interpretações sobre a matéria. Sobre o que se deve entender como desvio de fundos públicos. E, a não existir um pensamento comum sobre o assunto vamos continuar na mesma. Ou seja, uns a investigar, a apresentar provas e a incriminar, outros a tentar discriminar. Talvez, como sugestão, realizar, à luz da legislação em vigor na República, mais um seminário. Um seminário para que todos possamos ficar claros sobre o significado de desvio de fundos públicos.

domingo, março 01, 2009

caminhos perigosos

Ele há coisas, ela há afirmações, que parecem verdades. Mas que não o são. Sequer podem ser classificadas como meias – verdades. São puras mentiras. Na melhor das hipóteses, serão especulações. Jornalísticas em alguns casos. Políticas em outras ocasiões. Digamos, mesmo, que há quem se entregue ao exercício, diáfano e afanoso, de manipulação para tentar transformar os seus desejos em realidade. Em verdade. Sem desprimor para os verdadeiros e respeitados artistas, há por aí quem esteja a tentar iniciar-se nas artes circenses. Com destaque para o malabarismo, o equilibrismo e a magia. A mágica, para os que assim o desejarem. O que vimos, até ao momento, foram fracos espectáculos. Espectáculos de fraca qualidade. Talvez porque, digamos, estaremos perante aprendizes. De aprendizes ou de charlatães, que pensam poder contar com a ignorância, a ingenuidade e a infantilidade da plateia. Se assim não. Há muito teriam saído de cena.


Na sua última edição (25.02.09), o “Magazine” escreve em título (pag. 09), que “Pondeca não foi corrido”. E, atribui a afirmação a Fernando Mazanga, porta voz da Renamo. Pondeca era, para quem o não saiba, até há pouco tempo, delegado político da RENAMO da cidade de Maputo. Acrescenta a local do mesmo semanário, que “Pondeca teve uma ‘reunião muito digna’ com o Secretário-geral da Renamo Ossufo Momade no qual (sic) foi lhe dada a informação de que iria cessar funções”. Acrescenta a local que “Segundo o porta-voz Pondeca continua a ser muito útil ao partido com a aproximação das eleições gerais porque ‘como sabe, o Conselho de Estado onde ele é membro deve ser consultado pelo PR sobre a data das eleições e ele está lá com muito peso”. Logo a seguir, a notícia acrescenta: “Mazanga também disse que uma vez que o seu líder Afonso Dhlakama decidiu fixar residência em Nampula para estar perto das bases que sofrem, será Pondeca quase o seu representante permanente no Conselho de Estado”. Vamos por partes, como convém. Para se perceber onde começa e onde acaba a tentativa de manipulação da opinião pública. A primeira questão, é a de que Pondeca não tem, nem mais nem menos peso do que os restantes membros do Conselho de Estado. É igual a todos os outros. Sejam eles gordos, magros ou magriços. Como todos os outros são iguais a si. A segunda questão, o desmascarar da segunda falácia, reside em dizer que Pondeca, enquanto membro do Conselho de Estado, ao falar, está a expressar a sua opinião. Pessoal. Só, e só. Seja a sua opinião coincidente, ou não, com a de outros membros do seu partido. Em momento ou em circunstância alguma ele pode ser delegado ou representante de outro. De outro membro do Conselho de Estado. Quando se tenta manipular a informação a este nível, podemos estar a enveredar por caminhos perigosos.