domingo, agosto 29, 2010

Ainda uma riqueza adiada

Em finais dos anos 60, princípios dos anos 70, era corrente a afirmação e a convicção da existência de petróleo em Moçambique. Principalmente depois de extinto o incêndio no furo de prospecção de gás em Pande. Por peritos norte-americanos. Dizia quem sabia, ou pretendia saber mais, que onde há gás também há petróleo. Sequer é segredo que, em certas zonas da província de Inhambane, as populações retiram da superfície do solo um líquido escuro e viscoso. Que aproveitam e com que alimentam candeeiros tradicionais. Para a iluminação doméstica. Já em época mais recente, já depois da independência nacional, voltaram a correr informações sobre a existência de petróleo na Bacia do Rovuma. Muito provavelmente de um e do outro lado da fronteira com a Tanzânia. Aliás, o assunto, o tema petróleo prece ter sido ponto de agenda de reunião da comissão mista entre os dois países. Se sim, se não, fica a dúvida. E permanece o segredo por parte de quem possa saber. Um segredo e um silêncio que atravessaram algumas décadas. Até que.



Nunca se terá falado nem escrito tanto sobre a existência de petróleo em Moçambique como no tempo presente. Assim como da descoberta de novas reservas de gás. Digamos, concluamos que ainda bem. Partilhemos, porém, os cuidados e as cautelas com quem divulgou a descoberta de petróleo na Bacia do Rovuma. Sobretudo, no que se refere ao seu valor comercial. Actualmente. É que, o petróleo, não sendo um recurso renovável, parece ser um recurso inesgotável. Existe a maior ou menor profundidade, quer em terra, quer no fundo do mar. Quer dizer, o custo de exploração do petróleo depende de vários factores. Que os governos, que nenhum governo domina ou controla. Por si próprio. O volume das reservas de petróleo e a profundidade a que se encontram é segredo. Que as multinacionais guardam para si. E é um segredo bem guardado. Que em momento alguém revela. A quem quer que seja. Para que, com base nesse segredo e no monopólio do conhecimento, só explorem o petróleo numa determinada região quando já não seja rentável em outra. Quando o negócio possa ser menos lucrativo aqui do que ali. De resto, tenhamos isso presente, o petróleo desde que se foi tornando mais escasso e, logo, mais caro, também se tornou em fonte de novos conflitos. Nacionais, internos, e internacionais. Pode ser que sim, como pode ser que não. Pode muito bem acontecer que, em Moçambique, seja, ainda uma riqueza adiada.

domingo, agosto 22, 2010

A corda parte sempre pelo lado mais fraco

Em termos de custo de vida, de aumento de preços, estamos a atravessar um período difícil. Complicado. Também controverso. Aparentemente, de aumentos descontrolados. Ou incontroláveis. É que o consumidor passou, de um dia para a outro, a pagar mais por tudo quanto consome. Pela mesma quantidade daquilo que consumia na véspera, na semana ou no mês anterior. Estamos a falar da água, da energia eléctrica, dos combustíveis, de tudo quando constitui alimentação. Da farinha à batata, do arroz à couve, do óleo ao tomate, do peixe à carne. Seja de frango, da vaca, de cabrito ou de porco. E por aí mediante. A lista não é, nem pretende ser exaustiva. Por isso, o fica por saber é que novos aumentos virão a seguir. Facto concreto, é que dados acompanhados de declarações oficiais são tranquilizadores. Por demais tranquilizadores. Assustadoramente tranquilizadores. Tranquilizantes. Que se confundem, por vezes, com analgésicos ou com anestesias. A questão é que esses dados parecem não estar em conformidade com o real. Parecem referentes a um outro país. Que não o nosso. Digamos que a barriga do cidadão comum, deveria ser vista como melhor barómetro do que os dados estatísticos. Que, sendo verdadeiros, valem o que valem. Isto é, tanto podem valer muito como coisa nenhuma. Depende de quem os lê e interpreta. Depois, os trabalhadores no activo tiveram, recentemente, os seus salários actualizados numa base percentual. Os reformados da Segurança Social, não. Mais simplesmente, não viram as suas reformas actualizadas. Nem em muito nem em pouco. Foi em nada. O que leva a admitir que algo de estranho se passa pelas bandas do INSS. De onde o que chega é um total silêncio e a mais completa falta de informação. Pública. O que permite admitir que o segredo é a alma do negócio.

Decidiu, recentemente, o Ministério da Educação, proibir o pagamento de propinas em dólares. Em todas as instituições de ensino. Sejam públicas ou privadas. Segundo a explicação dada (“Notícias” de 19n do corrente), a medida visa manter um ambiente de estabilidade das propinas praticadas nas instituições de ensino e assegurar uma relação harmoniosa entre as instituições de ensino e o público utente. Acrescenta o matutino que Várias instituições de ensino têm vindo a adoptar a prática indicar as taxas dos serviços que prestam em moeda estrangeira, ainda que, na maior parte dos casos, os serviços venham a ser facturados e pagos em meticais. Ainda segundo o Ministério da Educação, esta prática (...) onera ilegitimamente o custo de vida dos cidadãos utentes desses serviços, que têm os seus rendimentos expressos em moeda nacional, e é potenciadora de focos de desarmonia e tensão social, constituindo conduta ilegal. Saudemos, desde já, a medida e a decisão. Acreditemos ser mais do que pedrada no charco. E deixemos a dúvida se o coaxar das rãs não irá conduzir à busca de artifícios legais, de “buracos”na legislação, para que tudo continue como estava. Ou seja, que sempre que aconteça alteração na cotação entre o dólar e o metical, as facturações em meticais sejam alteradas. Sempre no sentido da subida. Há exemplos, reais e actuais, de que assim acontece. Esperemos para ver. Na certeza de que a corda parte sempre pelo lado mais fraco.

domingo, agosto 15, 2010

Uma questão de força e de tempo

Volto à questão do contentor, colocado no passeio da Avenida 24 de Julho. Aqui abordada em edição anterior. Para dizer, para adiantar que imperou o bom senso. Ainda bem. É que o dito cujo já foi retirado. Terá sido removido para outro local. Provavelmente, menos condigno. Afinal, ao que parece não era negócio de um qualquer privado, Mas, sim, de uma entidade pública. De um ministério. Com a finalidade de promover e vender produtos nacionais. Iniciativa a todos os títulos louvável. Muito embora o local escolhido nem tanto. Não se tratava, por conseguinte, de um contentor qualquer. Semelhante ou igual a tantos outros colocados por tudo o que seja esquina ou passeio. Espaço livre. Digamos, tratava-se de um contentor VIP. Tanto assim, que depois de transferido para novo pouso, mereceu honras de inauguração pomposa. Com a presença de membro do Governo. A nível ministerial. Com a abertura de garrafas de champanhe. Que ainda não é produto nacional. E, por fim, com direito a notícia que ocupou largo e exagerado tempo no principal noticiário da televisão pública nacional. Aonde estamos, onde chegámos, parece claro. A questão, a dúvida que se coloca é de saber para onde vamos e onde queremos chegar.



Semana a semana, a quase novela INAV ganha novos contornos. E, cada episódio revela-nos surpresas. Interessantes. Que tanto podem dar para rir como para chorar. Agora, já se diz estar Em vista novo regulamento relativo à inspecção de viaturas (“Notícias”de 12 do corrente). Quer isto dizer, de forma simplificada, que o actual não serve. Já não serve. Por ter ficado ultrapassado. Mesmo antes de as inspecções terem sido levadas à prática a nível nacional. Ou por ser, por se tratar de uma aberração. Ou do produto de mentalidades arrogantes. Que vivem uma realidade que não a nacional e recusam conselhos avisados. No sentido de pararem para pensar. E pensar como pensam os homens. Afinal, únicos seres pensantes. Voltando à local, é surpreendente ficar a saber-se que o regulamento ora em perspectiva deverá reflectir um certo relaxamento no tratamento do tipo de deficiências. Quem assim o afirma, não é gago. Nem se socorre de meias palavras. É responsável numa instituição nacional. Ao mais alto nível. Mas que, sem qualquer margem para dúvida, há muito atingiu o Princípio de Peter. Digamos, a terminar, que nesta “Terra Sonâmbula” se mostra bem mais fácil remover um pesado contentor do que frágil e leve incompetente. A prova, a prova real está à vista. São esses barcos parados. Por falta de dinheiro para pagar as passagens por parte dos utilizadores a quem se destinavam. A quem supostamente se destinavam. Os incompetentes são como lapas. Estão ligados às rochas, estão presos às rochas. Por vezes, na maioria das vezes, é preciso utilizar força e tempo para retirar uma lapa da rocha. Trata-se, afinal, de uma questão de força e de tempo.

domingo, agosto 08, 2010

Contestar é um direito soberano

Todos sabemos que há afirmações que não devem ser feitas em público. Publicamente. Sobretudo através de rádios, de televisões, de jornais. Sobretudo e quando essas afirmações não possuem consistência. Não tenham sido devidamente ponderadas. Não passem de vontade ou de desejo pessoais. Sem um mínimo de possibilidades de serem executadas, de serem lavadas à prática. Outro tanto, por serem ilegítimas ou simplesmente absurdas. Quando tal acontece, resta saber e querer recuar. Resta ter de dar o dito por não dito. Resta ter de engolir o que se chama de sapos vivos. E, infelizmente, cá entre nós há quem esteja sempre preparado, sempre disponível para engolir sapos vivos. O que, não raras vezes, tem efeitos colaterais. Causa, mesmo dificuldades e prejuízos a terceiros. Origina situações de mal-estar e de agitação. Em última hipótese, há afirmações e declarações públicas que devem ser, abertamente, denunciadas e repudiadas. Por serem ilegitimas, quando não ilegais. Logo, que todos temos o direito de não cumprir. No plano pessoal, nenhum cidadão é obrigado a cumprir o que viole a Constituição ou a sua consciência.


Vamos a factos. Ainda está fresca na memória de todos nós, essa história, mal contada, da obrigatoriedade do uso de coletes reflectores e de triângulos com determinadas características. Por parte dos condutores. Uma história que ninguém tem coragem nem para desmentir nem para confirmar. Sobre o folhetim, sobre a rocambolesca novela, apresentaram-nos um capítulo. Agora, de novo, sobre a inspecção de viaturas. Titulou o jornal “Notícias” (edição de 30 de Julho passado), que Autoridades descartam prorrogação do prazo. Como fundamento para a decisão, o matutino cita um dirigente do INAV, a dizer que O que se viu é que a maioria dos automobilistas, por inércia, acabou deixando tudo para o fim. Naturalmente que sim. Mesmo quando se aceite que a inércia é o princípio do movimento. E que, também, é por inércia que aceitamos ter dirigentes que se permitem fazer este tipo de afirmações arrogantes. Passando ao dia seguinte, o mesmo diário titulada a toda a largura da sua primeira página: Fiscalização adiada. E, justifica: Uma das razões que forçaram as autoridades a recuarem da sua decisão de pôr em marcha a fiscalização tem a ver com a existência de províncias que ainda não têm instalações destes serviços de exame. Como os não tinham na véspera. Nem irão ter nos próximos meses. É do autor da afirmação arrogante do dia anterior, o gesto de benevolência que se traduz na seguinte frase: Demos a possibilidade de só se iniciar com o processo de fiscalização depois de instalados os centros de inspecção em todo o país. Ora, salvo melhor opinião, a afirmação Demos a possibilidade, significa que há pessoas que tem o poder para aplicar ou não aplicar a Lei. Que a aplicam quando querem e lhes apetece. E que não a aplicam quando não lhes apetece. Quando dessa aplicação nada possa resultar de bom. Para si. Seja, que a governação da coisa pública está a ser feita em função dos interesses mesquinhos e umbilicais de alguns. O mesmo será dizer, do quero, posso o mando. Nesta realidade, perante esta mediocridade camuflada em sabedoria, todos temos o direito à contestação. E, a exigir mudanças. Contestar é um direito soberano.

domingo, agosto 01, 2010

Evitar cair numa armadilha

A ideia de fazer convergir, de fazer aglutinar povos então dominados por Portugal em uma organização, não é nova. Terá sido elaborada pelo brasileiro Gilberto Freire. Que se terá deslocado, expressamente, a Portugal para a apresentar a Salazar. O então já velho ditador terá pensado tratar-se de uma modernidade. De algo demasiado progressista para a época. Logo, se não esqueceu, fez por fazer esquecer a proposta. O que, efectivamente, aconteceu. Volvidos anos, já no tempo de Marcelo Caetano, António de Spínola surge a recuperar e apadrinhar a ideia. Com nova roupagem. Como se pode avaliar pela leitura de “Portugal e o Futuro”. Isto, já em finais do Império. Quando era previsível e inevitável o desmoronar do Império. As ideias federalistas, o federalismo defendido pelo general do monóculo não passou de um nado morto. Por fim, anos depois das independências dos territórios ocupados por Portugal, surgiu a CPLP – Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Que tanto pode ter a ver com tudo o que lhe foi anterior, como pode ter a ver com nada. De verdade, surge, de quando em vez, quem insinua que o “Rei vai nu”.



Cimeiras, reuniões de especialistas, reuniões temáticas, jogos desportivos, não faltam. Multiplicam, como agora se diz, os eventos. Que fazem deslocar, que fazem movimentar, dezenas ou centenas de participantes. De vários pontos, de vários países, para um e único. Para o ponto. Para o local encontro, do evento. Há quem goste e quem não goste deste acontecer. Há quem defenda e há quem defina todos estes aconteceres com puras inutilidades. Por exemplo, o académico português Vasco Graça Moura, em entrevista à Agência “LUSA” que o Jornal “Notícias” reproduziu (edição de 27 de Julho), afirma que a CPLP é uma espécie de organização fantasma “que não serve para rigorosamente nada a não ser ocupar gente desocupada. Diz, depois, que o Instituto Internacional da Língua Portuguesa não está em funcionamento porque nenhum dos países da CPLP lhe dá dinheiro para o fazer. Para o escritor português, o IILP é uma entidade fantasma criada dentro de outra entidade fantasma. Critico do Acordo Ortográfico - e era aqui que queríamos chegar – Graça Moura tece dura crítica ao seu Governo. Devido à ausência de uma política da língua. E, afirma que o Acordo Ortográfico é um atentado criminoso contra a língua portuguesa tal como se fala em Portugal, Angola, Moçambique, na Guiné-Bissau, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe. Vai mais longe ao dizer que É um atentado que tenta desfigurar completamente a língua e é absolutamente irresponsável da parte de quem negociou e da parte de quem o aprovou. Não aborda, como não lhe interessa nem lhe compete, a questão dos custos financeiros resultantes da assinatura do Acordo. O que deve ser considerado como questão de não menor importância. Nós por cá, por estas bandas do Índico, ainda estamos a tempo de ouvir as vozes sábias e aconselhadoras. Ainda temos tempo para evitar cair no abismo. O bom senso aconselha que se evite dar um passo em falso. Um passo que pode ser fatal. Isto é evitar cair numa armadilha.