domingo, agosto 28, 2011

Pensar e agir correctamente

Já deixou de ser surpresa ler notícias sobre a apreensão de drogas em território nacional. De drogas pesadas. Vindas das mais diversas partes do mundo. E com destinos nunca claramente definidos. Claramente conhecidos. A última, a última dessas notícias, ocupa toda a largura da primeira página do “Notícias” (edição de 31 de Agosto findo). O jornal depois de escrever que “Há mais detidos em Nampula”, titula: “Haxixe sob para duas toneladas”. No primeiro parágrafo da notícia, escreve: “Pelo menos duas toneladas de haxixe foram comercializadas no país no período que vai de Junho a esta parte a partir da cidade de Angoche, província de Nampula, o que aponta para uma subida da quantidade de droga relativamente às porções inicialmente anunciadas.”. Adianta o texto que “Em conexão com o caso, a PRM efectuou mais detenções, totalizando agora 11 indivíduos de um grupo de 12 presumíveis implicados no narcotráfico.”. A seguir, pode ler-se que “A droga havia sido descarregada de um navio que escalou a costa de Angoche entre os dias 3 e 4 de Junho último (...). Posteriormente, a carga teria sido transportada por duas embarcações até à ilha de Yatá, uma das nove que compõem o arquipélago de Angoche, numa operação supostamente dirigida por F. Atumane, tido como o cabecilha do grupo.”. A notícia dá, também, a conhecer que “O negócio de haxixe vinha decorrendo sem que as autoridades policiais se apercebessem, até que um dos 12 membros do grupo desviou 90 quilogramas do lote de duas toneladas que se encontravam enterradas num terreno baldio da ilha de Yatá.”. Esta fuga, este desvio da rota de comercialização da droga, terá constituído a pista para a actuação policial. Que, entre os vários suspeitos, aponta seis trabalhadores de uma empresa de pesca, um professor e o proprietário da referida empresa, entre outros. Elucida a notícia que “Do provável cabecilha do grupo sabe-se que o seu envolvimento no narcotráfico remonta há longa data, feito sempre a coberto de actividades ligadas ai ramo da pesca e turismo de praia nas ilhas adjacentes à cidade de Angoche. F. Atumane, que viu confiscadas duas embarcações e uma viatura usadas no transporte da droga para os potenciais compradores, questionado como conseguiu reunir em tão pouco tempo tanto dinheiro para adquirir os meios de transporte já referidos que são hoje parte do seu património, não soube responder.”. Resta-nos aguardar que a Polícia cumpra com o que prometeu. E que foi “investigar os contornos deste caso até às últimas consequências, pois, no seu entender, é chegada a hora de se esclarecer como é que navios permanecem ancorados em águas nacionais daquela região sem que a Administração Marítima, incluindo as unidades da Marinha de Guerra, tomem medidas tendentes a apurar o que estará a acontecer na área sob a sua jurisdição.”.

Uma questão parece inquestionável. Seria bom, seria excelente que depois de todas as diligências e de todas as investigações policiais podermos vir a ler na Imprensa os nomes dos implicados neste caso. Ora, por uma questão de lógica, se á tão fácil apresentar nomes completos e rostos de transportadores ou de comerciantes de “quatro” bolinhas de soruma, certamente nada impede que, aqui, o procedimento seja igual. Se assim não for, se assim não vier a acontecer corremos o risco de estar a cometer um erro. Grave. Que é o abrir espaço para que investigadores e polícias de países estrangeiros entrem em nossa casa. E nos venham apresentar os nomes dos traficantes nacionais. Ainda estamos a tempo de evitar mais uma situação de desprestígio nacional. Ainda temos tempo para pensar e agir correctamente.

domingo, agosto 21, 2011

Uma Justiça igual para todos

Foi a actual Avenida Julius Nyerere projectada para ter quatro faixas de rodagem. Desde o seu início até à actual Praça dos Combatentes, vulgo Xiquelene. Por motivos que não importa aqui aprofundar, foram apenas construídas duas. Ainda antes da independência. Mas, era visível que não faltava espaço, que estava reservado o espaço para a construção das outras duas. Inclusive, os postes de iluminação colocados na divisória central possuíam aquilo a que se pode chamar dois braços. Um com lâmpadas, do lado por onde se circulava. Outro sem lâmpadas, do lado da artéria ainda em projecto. Com o rodar dos tempos, este, este braço viria a ser retirado. Não se sabe porque artes nem a manso de quem. Mas que permitiu concluir que o projecto para a construção da segunda faixa da via tinha sido abandonado. Ideia que ganhava e que ganhou forma e que se consolidou, também, pelo facto de os terrenos públicos, ou camarários, destinados à construção terem vindo a ser progressivamente ocupados. Por privados. Por simples cidadãos nacionais. Ou, por instituições estrangeiras. Entretanto, as fortes chuvas caídas há anos em Maputo vieram interromper a circulação automóvel na única faixa de rodagem então existente. Devido à abertura de uma enorme cratera em determinada fase do percurso. O que viria a merecer a atenção de televisões internacionais. Que dali, que daquele local fizeram transmissões em directo. Para todo o mundo. Os anos foram passando céleres. As prioridades municipais foram sendo definidas e redefinidas. Até que, em anos recentes se começou a falar, com frequência, de novo, na reabilitação da artéria obstruída. Agora, o que nunca terá sido claro, o que nunca terá sido deixado claro é se os trabalhos a realizar diziam respeito apenas à reparação dos estragos causados pelas chuvas. Ou se consistiam, também, na concretização do projecto inicial. De um projecto que data de há cerca de meio século. Seja, na construção, também das outras duas faixas de rodagem. Embora pouco claro, pouco esclarecedor, parece ter surgido um dado novo. Caso não, caso estejamos perante um leitura errada do que é público, algo precisa ser revisto. Para que a concretização do projecto inicial daquela importante via rodoviária não passe de uma ilusão.


Recentemente, o Conselho Municipal da Cidade de Maputo fez publicar um aviso sobre esta matéria no jornal “Notícias” (edição de 16 do corrente, página 16). O referido texto municipal começa por informar que “No âmbito da Reabilitação da Av. Julius Nyerere, o Conselho Municipal de Maputo informa aos munícipes e as instituições públicas e privadas que vai decorrer nos próximos meses, obras de Reabilitação da Secção da Avenida Julius Nyerere entre a Praça do Destacamento Feminino e a Praça dos Combatentes.” Depois de afirmar que se irão registar restrições no tráfego rodoviário e de apontar a necessidade de prestar atenção à sinalização que venha a ser erguida, o referido aviso conclui: “Paralelamente, solicitamos a V. Exa. que removam voluntariamente todas as infra-estruturas erguidas ao longo da reserva da estrada no prazo máximo de trinta (30) dias de modo a permitir que os trabalhos sejam executados. (...)”. Perante este texto, aumenta, cresce a dúvida. É que não fica claro se apenas vai ser reabilitado o troço das duas faixas, destruídas pelas chuvas, ou se vai ser concluído todo o projecto inicial. O que surge claro, o que é claro, o que é facto, o que é verdade é que qualquer vendedor informal é obrigado abandonar uns tantos metros do passeio que ocupa com os seus produtos. Sob a ameaça de armas de fogo. No imediato. Enquanto estes senhores que ocupam a reserva da estrada, como se afirma no aviso, merecem o tratamento de “V. Exa.”. E lhes é concedido um prazo de 30 dias para desocuparem os espaços que ocuparam. E que ocupam. Ilegalmente. Mas conscientemente. Ao longo de anos. É tempo de acabar com este modelo de Justiça para os pobres e de Justiça para os ricos. A Justiça para ser Justiça deve ser igual para todos. É preciso defender uma Justiça igual para todos.

domingo, agosto 14, 2011

Evitar que polícias virem ladrões

Há muito tempo que não assistia a cena semelhante. Protagonizada por agentes da Polícia Municipal. A última que presenciei aconteceu faz meses. Foi perto da Padaria Lafões. Ali, num ápice, modestas a pacatas vendedeiras de legumes e de hortícolas viram os seus produtos apreendidos. Ou, usando linguagem mais adequada, roubados. Retirados de cima do passeio e atirados para cima de uma viatura policial de caixa aberta. Que rapidamente se pôs em movimento e se afastou do local. Sem qualquer explicação, sem nenhuma troca de palavras. Agora, o mesmo tipo de actuação repetiu-se na Avenida 24 de Julho. Frente às instalações do Instituto Comercial. Eram cerca de 16.30 horas do penúltimo sábado. A vítima, desta vez, foi um vendedor de calçado. Um também pacato vendedor que tinha a sua mercadoria exposta no passeio. Aqui, mais uma vez, mercadoria tem o significado de ganha-pão. Também não foram necessárias palavras nem justificações. Menos ainda documento sobre a mercadoria apreendida e onde poderia ser reclamada. Houve apenas um apontar de duas armas de fogo na direcção do amedrontado e atónico vendedor. Enquanto outras quatro mãos limpavam o passeio. Atirando apressadamente os artigos expostos para a caixa da viatura. Que rapidamente se pôs em movimento e desapareceu. Deixando incrédulos tanto o vendedor como quantos assistiam ao que se estava a passar. Pela forma e pela rapidez como tudo se passou. Que mais parecia um assalto à mão armada. Em plena luz do dia e numa das mais movimentadas artérias da capital. Do que uma acção policial, que se pretende legal e em defesa do bem-estar da sociedade.


No rescaldo da operação desencadeada por estes “destemidos” e “bravos” agentes policiais, não faltaram comentários. De vendedores de cigarros, de jornais ou de recargas de telemóvel que, habitualmente, estão posicionados no passeio da faixa contrária. Ou de ocasionais transeuntes. Naturalmente, o que se ouviu foram comentários nada abonatórios, tanto em relação aos agentes da acção, como aos seus responsáveis directos. De quem dependem e quem autoriza ou é suposto autorizar, este género de actuação. Esta forma simples e fácil, aparentemente fácil, de apontar armas ao cidadão. Que não foi apanhado a roubar e que se presume não ser ladrão. Sobre o conteúdo desses comentários, manda o decoro e o respeito que seja evitado a sua reprodução pública. Até porque iam muito para além da actuação dos gestores municipais. Importa, porém reter alguns aspectos que bem podem evitar a repetição de acções do género. O primeiro, é que houve um excesso de força. Que houve um aparato militar e intimidatório desnecessário. Contra um vendedor isolado e indefeso. O segundo, é que este tipo de operações policiais só devia ser permitido mediante a emissão de um documento dos artigos apreendidos. Como isso não está a acontecer, pode admitir-se, é legítimo admitir-se, que estes agentes são polícias descomandados. Que estão a agir à margem das orientações e do controlo do seu comando. Que estão a agir em proveito próprio, em proveito pessoal. Mas que, de forma premeditada ou inconsciente, estão a adubar terreno fértil à agitação social. Parece não ser pedir muito pedir a abertura de um inquérito à actuação da Polícia Municipal. Que utiliza viaturas, combustível, armas e fardas pagas com o dinheiro dos nossos impostos. Para se saber se há ou não abusos de poder e excessos de zelo. Mas, e sobretudo, evitar que polícias virem ladrões.

domingo, agosto 07, 2011

Justiça será feita



Desde há bastante tempo que o negócio da madeira vem merecendo atenção informativa. Que ganhou honra de destaque. Desde o abate das árvores até à sua exportação em bruto. Em toros. É facto que um toro de madeira não se transporta escondido num bolso das calças. Desde o ponto de abate da árvore até ao porto de embarque. De saída do país. Mas, bem entendido, a realidade não confina a um todo. Aponta para centenas, para milhares de todos. De madeira rara e preciosa. Por isso cara. E que, por isso mesmo, pelo seu elevado valor, poderá ter dado origem a um novo tipo de crime. Um novo tipo de crime que se configura a crime organizado. Logo, sem rostos e sem nomes. Recorde-se que, em outras latitudes, a partir de determinado momento, se passou a definir o negócio ilegal de diamantes como “diamantes de sangue”. Salvo as devidas proporções e os diferentes contextos e realidades, o negócio das madeiras em Moçambique já caminha no sentido das “madeiras de sangue”. Estamos todos recordados que, ainda recentemente, vários fiscais das florestas foram barbaramente assassinados. Por ou quando tentaram impedir a circulação de camiões que transportavam madeira cortada ilegalmente. E, foram assassinados, atropelados mortal e intencionalmente por camionistas. Cujos nomes permanecem no anonimato. Assim como os nomes dos seus patrões. Para o anonimato ou para o esquecimento poderão, também, ter sido atirados os nomes dos assassinados funcionários do Estado. Pelo simples facto de, estando a ser honestos e cumpridores dos seus deveres pagaram com as suas vidas a ousadia de tentarem combater o crime organizado. E para que dos atrevidos mortos nada reste, nem memória nem nomes, aí está o silêncio. Ao que se saiba, sequer o Estado veio dizer, publicamente, ter decidido atribuir qualquer pensão de sobrevivência aos familiares dos assassinados. Que morreram em da defesa da economia nacional. É facto que os tempos mudam. E que, hoje, cada vez menos há espaço para os defensores dos interesses nacionais.



Nas devidas proporções, talvez nem tanto, os negócios das madeiras está para Moçambique como os negócios das drogas está para muitos países da chamada América Latina. Atentemos na nossa realidade. Em Julho passado, as autoridades nacionais retiveram mais de 500 contentores com madeira. No porto de Nacala e quando estavam prestes a sair do país. Ilegalmente e em três navios. Depois das primeiras investigações, a Autoridade Tributária veio a público informar (jornal “Notícias” de 11 do corrente, página 5), que “Foi formalizada a apreensão de 501 dos 561 contentores de madeira retidos no Porto de Nacala, desde 8 de Julho último, por tentativas de exportação ilegal daquele recurso para a China”. Depois de tecer algumas considerações e explicações, a local informa que “O relatório ontem apresentado é o preliminar, não apresentando nomes, nem o que terá concorrido para que as falcatruas só fossem descobertas fracas a uma denúncia anónima instantes antes dos três navios zarparem de Nacala.”. Por fim, informa que “Rosário Fernandes, presidente da AT, garantiu que os dados finais só serão divulgados no fim de todo o processo, incluindo o julgamento dos responsáveis do caso.” Ainda bem. De resto é, a todos os títulos, louvável o procedimento da AT ao longo de todo o processo. Resta acreditar que justiça será feita.