domingo, junho 24, 2012

Assobiar para o ar já não dá

Há coisas que ninguém vê. Ou parece não ver. Ou faz por não ver. Mesmo quando acontecem à frente dos seus olhos. E das suas barrigas. Mesmo quando os escândalos já tomaram a forma de pequenos monstros. Feios e disformes. Mau cheirosos, até. E são visíveis a olho nu. Ou como se diz entre o povo, qualquer cego pode ver. Mas parece ser preciso que a granada, que a bomba lhes rebente nas mãos para acordarem. Para que os sacuda da letargia e os faça acordar. Do sono dos injustos. É que nesta questão da pública má gestão do INSS, ninguém parece estar a salvo. As culpas, se as houver e quando as haja, não podem ser assacadas a um ou a outro. São de todos. São de todos os que têm responsabilidades de gestão e de mando no Instituto. E que adormeceram. Que parece terem adormecido. Que só acordaram quando os escândalos já eram mais do que muitos. E prometiam arrasar tudo e todos à sua passagem. Foi então que os mais dorminhocos acordaram. E ainda estremunhados começaram a assobiar para o ar. Sem se darem ao trabalho de olhar para os seus umbigos e para as suas barrigas. Na sua edição da passada quinta-feira, sobre o “Caso INSS”, o jornal “Notícias” titula a toda a largura da sua primeira página que “Privados propõem revisão de normas”. E, abre a local com o seguinte texto: “A revisão do estatuto orgânico e demais legislação que regem o funcionamento do Instituto Nacional de Segurança Social (INSS) afigura-se urgente na medida em que constitui o melhor mecanismo para travar as artimanhas que acontecem na gestão da coisa pública naquela instituição, disse ontem Adelino Buque, porta-voz da Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA).”. Segundo o referido matutino, esta posição foi manifestada no contexto “das denúncias sobre alegada má gestão protagonizada pelo presidente do Conselho de Administração e pela directora-geral do INSS (...). “. A local acrescenta que o referido porta-voz explicou à Imprensa que depois de uma análise aprofundada ao caso INSS, a CTA concluiu que o PCA e a directora-geral do Instituto tem estado a pautar por uma gestão que tem como fim último delapidar as contribuições dos empregadores e trabalhadores”. Aqui chegados, estamos perante um dilema. Ou um paradoxo. E um paradoxo indefensável. Ilógico. Primeiro, somos colocados perante a necessidade de revisão da legislação existente. Depois, de má gestão. Como se, só por si, a alteração da legislação actual fosse suficiente ou capaz para resolver qualquer problema de má gestão. Ou como se uma gestão menos clara ou menos honesta fosse um simples problema de legislação. Não é. E não o é para infelicidade dos demagogos. Quer dizer, em última análise, não é actualizando ou reformulando a legislação actual que se pode moralizar ou modificar os métodos de trabalho dos actuais gestores. Ou de outros. Sejam eles quem possam vir a ser. Sejam eles quem sejam. O que parece claro é que o homem pode modificar a lei. O que parece menos claro é que a lei possa modificar o comportamento do homem. A curto prazo e dentro de um contexto real e temporal. Mais real, mais temporal, mais correcto, mais visível, é que há por aí gestores que dormem muito. E que acordem com as mãos sujas. Pior. Acordam a assobiar para o ar. Como processo para se distraírem. E tentarem distrair os outros. Acontece que os outros não estão a dormir. Dormem menos. Dormem apenas o suficiente para se manterem vivos, lúcidos, activos, intervenientes na gestão dos seus interesses. Pessoais e colectivos. Sempre e quando tal se mostre necessário. Por favor, meus senhores, passem a dormir menos. E fiquem a saber que estão ultrapassados nessa vossa tentativa canhestra de tentar manipular o comportamento dos cidadãos. Definitivamente, assobiar para o ar já não dá.

domingo, junho 17, 2012

Eles comem tudo e não deixam nada

O Instituto Nacional de Segurança Social (INSS), parece continuar a navegar num mar de escândalos. Financeiros. Ao que parece, ao que tudo indica, o INSS é um oásis de despesismo. Num terreno, num território de pobreza absoluta. Mas também de negócios menos claros. Para não ter de dizer negócios escuros. Onde já de nada valem os chamados concursos públicos. De tal forma que a Ministra do Trabalho se viu na necessidade de reunir com os concorrentes de um concurso gráfico “para lhes pedir desculpas pela anulação do concurso (jornal “O Pais”, edição de 14 do corrente, página 2). Segundo o mesmo matutino editado em Maputo, “Hoje (quinta-feira), Helena Taipo reúne com o Conselho de Administração e com a direcção-geral para perceber os contornos destas negociatas dadas a conhecer, em exclusivo, pelo nosso jornal”. Esperamos e desejamos que tenha sido uma reunião conclusiva. É que essas “negociatas” vão muito para além da aquisição de material gráfico. Segundo é público, começaram com a aquisição de uma casa para o PCA do INSS e vão agora na “(...) reabilitação da casa da sua directora-geral”, que custou aos reformados deste país mais de sete milhões de meticais. Ou seja, o “mesmo que o Governo dá a cada um dos 129 distritos do país para promover a produção de comida e criação de emprego”. Resumindo as contas “(...) no início deste ano, o INSS estava a pagar pouco mais 28 milhões de meticais por uma casa do PCA; 7,6 milhões pela reabilitação da casa da sua directora-geral; 25 milhões pelo concurso de material gráfico.”. Como se pode verificar, trata-se de muito dinheiro. E, de uma forma indesmentível, de um caso de gestão danosa. Esperamos, com alguma ansiedade, para ver como irá ser feita a moralização do Estado nesta área. E se irá, ou não, haver punições. Matéria para isso parece não faltar. O dinheiro gasto, ou mandado gastar em benefício próprio destes senhores e destas senhoras, não é dinheiro do Estado. É dinheiro dos contribuintes para a Segurança Social. Ao longo de décadas. Ao longo de uma vida de trabalho. É dinheiro nosso, dos reformados. Que confiámos em que o INSS seria uma instituição séria. E que saberia rentabilizar os nossos descontos, através de uma correcta aplicação do capital, para nos garantir uma actualização das nossas reformas. Mas não é isso que está a acontecer. Em termos de actualização de reformas, nada é claro. Tudo não passa de jogadas de bastidores, de jogadas feitas por debaixo da mesa. A questão pode e deve ser colocada de forma clara e simples: Pelo que estamos a assistir, há dinheiro para pagar injustificadas mordomias a gestores que nada querem ver para além do seu umbigo. Mas, não há dinheiro para actualizar reformas ao nível da inflação oficial do ano anterior. Para nós, reformados, ficam, todos os anos meia dúzia de quinhentas furadas. E tal não acontece, comprovadamente, por falta de dinheiro. Acontece por má gestão e por corrupção. Reconheçamos que, à Ministra do Trabalho cabe, neste processo, um papel delicado. O de saber varrer a casa que lhe foi dada a habitar. Desde que esteja convencida que os votos dos corruptos e dos ladrões que coabitam com sigo não são suficientes para ganhar as próximas eleições. Única forma de garantir a sua permanência no poder. Até lá, esperamos para ver. E, concedendo o benefício da dúvida, em termos de meditação, parafraseamos o poeta quando diz que eles comem tudo, eles comem tudo e não deixam nada.

domingo, junho 10, 2012

Retirar a chucha ao bebé

A situação dos transportes públicos na cidade de Maputo continua a ser de crise. Parece longe de solução definitiva. Apesar da aquisição de dezenas de viaturas nos últimos tempos. Seja de 150 autocarros a gás e de 70 a diesel, só em 2010. A procura de transporte excede, continua a exceder, largamente a oferta. Daí o surgimento, talvez melhor o ressurgimento das carrinhas de caixa aberta. Que não oferecem um mínimo de comunidade nem de segurança aos passageiros. Esta realidade, que parece teimar em não desaparecer, leva os gestores municipais a apontarem para a necessidade de aquisição de 600 novas viaturas. Daí, o estarem à procura do respectivo financiamento. Digamos, comentemos desde já, que se trata de um número de viaturas que parece demasiado elevado para a nossa realidade interna. Caseira. A menos que algo nos esteja a escapar em ternos de análise. Ou que estejamos, como alternativa, perante um processo de mal disfarçada má gestão. Tanto no processo de aquisição dos referidos autocarros como na gestão da frota. Em si mesma. Na sua última edição, este semanário dedicou largo espaço à problemática dos transportes colectivos na cidade de Maputo. Sobre as á referidas viaturas adquiridas em 2010, escreve que “Destes meios disponíveis apenas metade é que está em funcionamento devido aos elevados custos de manutenção e a falta de peças sobressalentes para os existentes”. O mesmo semanário escreve que “Pelo que tudo indica os meios de transporte mais difíceis, tanto em termos de manutenção, como abastecimento, são os que usam gás”. E cita um responsável municipal pela área dos transportes a dizer que “Há dias que não fazemos uso de autocarros a gás, pois este tipo de combustível é distribuído por uma única empresa e torna-se difícil ficar mais de 30 minutos na fila para abastecer apenas um autocarro. Neste momento precisamos de um dia inteiro para aprovisionar os 150 autocarros.” Espantados com esta realidade, é o mínimo que podemos estar. Todos nós que, através dos nossos impostos e das nossas contribuições fiscais, havemos de pagar o custo das viaturas. Perguntemos, então, coisa simples e primária: Aquando da aquisição das viaturas movidas a gás a situação era diferente da actual? Se não, o que impediu os TPM de terem criado condições para as abastecer nas suas instalações e durante a noite? Mais, em que circunstâncias e por quem foi autorizada esta importação? Sabendo-se, então, como já se sabia, que este tipo de viaturas não tinha mínimas condições para circularem normalmente e com a desejada regularidade. Ora, se essas viaturas não circulam por falta de condições de abastecimento, que fazer delas? Ou que fazer com elas? Pode também, e deve, perguntar-se de que tipo são essas mais 600 viaturas que se pretende importar. São mais viaturas destinadas a ficarem paradas com base em infantis desculpas ou são, na realidade, viaturas com condições para fazer face às reais necessidades das populações. Para poderem funcionar todos os dias, quer esteja a chover quer esteja a fazer calor. Comecemos por desejar que haja concursos públicos claros e transparentes. E, também, que seja clarificado o processo das aquisições anteriores que motivaram a realidade da crise actual. Para ficarmos, todos, a saber se se tratou apenas de mera incompetência. Em paralelo, parece não ser descabido avançar com a ideia de uma auditoria forense aos TPM. E uma investigação pelo Gabinete Central de Combate à Corrupção. Como precaução, como medida cautelar, parece bom aconselhar a que se comece por retirar a chucha ao bebé.

domingo, junho 03, 2012

Vidas humanas a que alguns parecem atribuir valor nenhum

Os números são preocupantes. Mais. São alarmantes. Aludimos aos números de mortos provocados por acidentes de viação. Em todo o território nacional. Em cada semana, em cada mês, em cada ano. Sob o título “Excesso de velocidade na origem dos sinistros”, o “Notícias” (edição de 30 de Maio, página 5) escreve: “Apesar do esforço que a Polícia tem e empreender com vista a reduzir as mortes por sinistros no país, o excesso de velocidade e a condução em estado de embriagues continuam a ser as causas dos acidentes no país”. E, justifica: “Só na semana passada, pelo menos 34 pessoas morreram e outras 84 contraíram ferimentos como resultado de 59 acidentes de viação registados nas estradas de todo o país.”. Segundo informador policial, “os atropelamentos lideram os casos registados com 40, seguido de choques entre carros despiste, ambos com oito, o choque carro - moto com quatro casos e 2 embates contra obstáculos fixos”. Ficámos, também a saber que no que “Tange às medidas de educação pública e combate aos acidentes de viação a Polícia fiscalizou pelo menos 20 mil viaturas que culminou com a apreensão de mais de uma centena por diversas irregularidades, para além da imposição de multas e detenções”. Para além de todas as atenuantes que se possam apresentar, os números falam por si. E, se são verdadeiros – e acreditamos que sim – merecem breve comentário. No sentido de se tentar alterar as realidades que nos transmitem. Vejamos. Como parece, e se o que parece é, o número de vidas que se perdem em acidentes rodoviários não podem deixar indiferente o cidadão comum. E consciente das suas responsabilidades como tal. Como cidadão consciente, repita-se. Daí, o direito a interrogar para tentar perceber o que se está a passar na realidade. Para perceber o motivo pelo qual o elevado número de mortos nas estradas do país é uma constante. Não baixa. Em cada semana que passa, mês após mês. Pesem e tenha-se em atenção os esforços que possam estar a ser feitos para inverter a situação, pelas diferentes autoridades competentes, os resultados parecem ser nulos ou de nenhum efeito. Se existem, não são visíveis. Tanto em termos de inversão de números como de práticas operativas. O que pode indiciar que algo está errado. Que aquilo que se pensa ser correcto não o será tanto. Pelo que se apresenta como necessário e como urgente corrigir métodos de actuação. De concreto, o que parece poder afirmar-se sem margem para erro é que estamos perante uma calamidade nacional. Que o número de mortes nas estradas nacionais não está a diminuir como é desejável que aconteça. A realidade actual parece aconselhar a necessidade de ser desenvolvida uma ampla campanha de educação e de sensibilização dos automobilistas, a nível de todo o país. Se necessário, e certamente que também, de repressão. Agora, pelo que estamos a assistir e a verificar, é que as chamadas autoridades competentes não estão capacitadas e não são competentes para desencadear uma operação de tamanha envergadura. E de a manter em prática pelo tempo necessário para que os resultados sejam visíveis. Quando assim e por o número de mortes das estradas ser um problema nacional, parece útil pensar diferente. E sugerir que o Primeiro-Ministro ou, em última instância, o próprio Presidente da República, venham a público assumir, pessoalmente, a direcção desse combate. Desse combate que é necessário desencadear e dirigir para reduzir o número de mortes, inglórias, nas estradas nacionais. Até porque, ao contrário do que tem vindo a ser propalado, essas mortes são mais do que números. De meras estatísticas. São vidas humanas a que alguns parecem atribuir valor nenhum.