domingo, outubro 28, 2012

É bom evitar confusões

Este país é, ou parece ser, um país de traficantes. De várias e muitas nacionalidades. Moeda estrangeira, diamantes, pedras semi preciosas, ouro. Tudo serve para tentar ganhar dinheiro ilegalmente. Tudo se tenta importar e exportar ilegalmente. Assim também drogas das mais diversas e órgãos humanos. Órgãos de pessoas humanas previamente amputados. Curiosamente, quando é detido um ou uma moçambicana nas malhas da luta contra o crime, aqui ou lá fora, algures, tem nome e apelido. Tem morada e residência. Em alguns casos, e um deles bem recente, tem direito a foto nos jornais e a pedido de clemência oficial ao país onde foi detida. E onde enfrenta ou pode enfrentar a pena de morte. Quanto aos mandantes, quanto aos patrões dos e das traficantes, dos chamados “correios”, continuamos a saber nada. Sequer os nomes e as nacionalidades. Por certo, estão bem protegidos. Não pelo chamado segredo de justiça. Mas por interesses económicos. Que se entrelaçam como teia de aranha. Aí, coitada da mosca desprevenida. Incauta. Estúpida. Cai na teia da aranha e por muito esforço que faça para se safar, por muito que tente libertar-se, morre. Possa ou não parecer morte inglória, morre. Nas leis a que estamos submetidos, nas leis que regulam a nossa vida, também é mais ou menos assim. Nem sempre morre aquele que parecia justo devesse morrer. Morre, sempre, o mais fraco. É, um pouco, como na nossa Justiça. Há duas escalas de valores. Ou duas formas de aplicar a lei. Uma para o mais forte. Outra para o mais fraco. Nunca, ou raramente sabemos para que lado está, no seu pensamento, inclinada Minerva. Ou o prato da balança. Na sua edição da última quinta-feira, o jornal “Notícias”, na sua primeira página, em Breves, noticiava que “Alfândegas apreendem ouro”. E, fazendo-se eco de uma notícia da AIM, escrevia: As Alfândegas de Moçambique apreenderam no Aeroporto Internacional da Beira 13.366 quilos de ouro fundido, equivalentes a cerca de 700 mil dólares e que estavam na eminência de serem traficados por um cidadão libanês. Mais uma vez, estamos perante um caso de informação incompleta. É que esta notícia da insuspeita AIM diz pouco. Esclarece muito pouco. Não esclarece sobre a identidade do cidadão libanês detido. Como não informa donde provinha nem para onde ia o ouro. Qual o seu destino final. Ficamos, mais uma vez, sem saber, quem vendeu e a quem se destinava o ouro. Quem era o comprador final. Quem foi ou foram os vendedores, pode presumir-se. Quem ia comprar já não. Sem dúvida, as Alfândegas fizeram o seu trabalho, cumpriram com a sua missão que era a de apreender o que era ilegal. E de divulgar o acontecido. Porque a divulgação do facto, do acontecido, serve os seus interesses. De resto e em última análise, a informação serve sempre os interesses de quem a liberta. De quem a divulga. Neste, como em muitos outros casos, faltou a investigação jornalística. Uma falha que, pelos mais variados e díspares objectivos, pode não ser irracional nem ocasional. É neste contexto que não quero deixar de reproduzir, de dar a conhecer, uma mensagem que circula por correio electrónico. Com o título Portugal no seu melhor, está a ser divulgada uma frase do poeta popular português António Aleixo, que creio já falecido. Diz o testo que Há tantos burros mandando em homens de inteligência, que às vezes fico pensando, se a burrice não será uma ciência. Isto, como se pode verificar, referia-se ao Portugal de há muitos anos atrás. Nada tem a ver com Moçambique. É bom evitar confusões.

domingo, outubro 21, 2012

Lógica do dumba nengue

A discussão pela Assembleia Municipal da Cidade de Maputo do aumento do preço dos transportes urbanos já trouxe à luz do dia alguns aspectos importantes. E, terá confirmado outros. O primeiro é que os gestores municipais estão, continuam, convencidos, convictos, que a área pode gerar lucros. No mínimo que é um negócio sustentável. Em que as receitas podem cobrir as despesas. Segundo o jornal “Notícias”, edição de 25 do corrente (página 3), sob o título “Nova tarifa poderá ser aprovada hoje”, depois de abordar a questão dos aumentos, escreve: Com a actual tarifa, a empresa municipal gera uma receita mensal estimada em 18 milhões de meticais para um nível de despesas aproximado de 26 milhões de meticais. A implementação da nova tabela possibilitará uma colecta de receitas mensal de cerca de 26 milhões de meticais, para gastos mensais de 29 milhões de meticais, reduzindo, deste modo, o défice de oito para três milhões de meticais, segundo a explicação dada durante a apresentação da proposta. Mais acrescenta a local que As autoridades municipais defendem que a medida vai mudar para melhor a situação da companhia, porque actualmente a empresa municipal tem 250 autocarros, mas apenas 110 circulam por causa dos elevados custos operacionais. Assim sendo, caso a nova tabela seja a aprovada, o número de carreiras que circulam diariamente irá aumentar, servindo mais utentes. À hora a que escrevo, ignoro, por completo, se as novas tarifas terão ou não sido aprovadas. Espero que não. Se sim, a própria Assembleia Municipal poderá ter dado um tiro no pé. O que, de todo em todo seria, desagradável. Nada dignificante. Como se pode verificar pelo acima escrito, e em repetição do dito em testos anteriores, o Conselho Municipal da Cidade de Maputo continua a acreditar que os transportes urbanos, públicos e privados, podem ser rentáveis. Mas não. A realidade demonstra que não. Trata-se de um serviço social que deve e tem de ser subsidiado pelo Estado. Pensar o contrário, agir de forma contrária é teimosia. É persistir no erro. Verdade seja dita, nada disto paga imposto. Valha-nos isso, pelo menos. Mas, é também e muito principalmente tentar subverter as leis da economia. O que já é bem mais grave. Dizer também, que a gestão dos Transportes Públicos Urbanos peca por falta de visão. E de visão empresarial numa realidade concreta. Depois de terem dito e repetido, de terem tentado fazer acreditar ao público que o seu problema era de falta de viaturas, ficámos a saber que afinal não é. Isto porque das 250 viaturas que possuem, apenas 110 circulam por causa dos elevados custos operacionais. Perguntemo-nos e perguntemos e estes gestores e ao próprio Conselho Municipal se só descobriram o montante dos ditos custos operacionais depois de terem importado as viaturas. Certamente que não. Mas, por hipótese, admitamos que sim. Se sim e se assim, qual a lógica de estes mesmos senhores gestores terem vindo a público manifestar a sua pseudo preocupação em encontrar meios financeiros para importarem mais 600 viaturas. Por forma a resolveram definitivamente o problema do transporte dos citadinos. Convenhamos que são muitas centenas de autocarros. Demasiadas. Não para a vontade nem para o desejo. Mas para o dinheiro que temos. Que sendo pouco e conseguido com muitos sacrifícios, deve ser gerido com critérios de austeridade. O contrário, não passa da lógica do dumba nengue.

domingo, outubro 14, 2012

Resta saber se irão ter tempo

Anuncia-se para breve um aumento do preço dos “chapas” na capital do país. Um aumento na ordem dos 40 por cento. O que em termos monetários parece insignificante. Mas que em termos percentuais é deveras significativo. E vai representar um substancial agravamento do custo de vida. Para os cidadãos e para os agregados familiares. No seu conjunto. Na sua edição do passado dia 17 (página 3), o jornal “Notícias” titula que Proposta de nova tarifa na Assembleia Municipal. E, logo a seguir, esclarece que A proposta de alteração da actual tarifa do transporte semicolectivo de passageiros (chapa) será apresentada próxima semana à Assembleia Municipal de Maputo (AM) para discussão e posterior aprovação. Pela forma como o texto está escrito, a aprovação é, à partida, um dado adquirido, um facto consumado. Quanto aos valores dos aumentos, lemos que A proposta do Conselho Municipal prevê o aumento gradual do preço do “chapa”, começando com um acréscimo na ordem dos 40 por cento em relação às actuais tarifas de 5 e 7.50 meticais. Assim sendo (...) a actual tarifa de 5 meticais passaria a custar 7 meticais e a de 7.50 meticais passaria para 9 meticais. Dizer, desde já, que os novos valores propostos não correspondem a um aumento de 40 por cento. Terá havido, por certo, um erro de cálculo. Que seria, de todo, importante corrigir. Ou esclarecer. E, esclarecer como é que um aumento de 40 por cento sobre 7.50 meticais resulta em 9 meticais. De facto, a matemática, as regras de cálculo também já não são iguais para todos. Estão condicionadas a variantes e a variáveis, de acordo com a vontade e o desejo de quem manda. De quem se assume como poder. Na tentativa de fazer aceitar de forma pacífica os aumentos propostos, o texto do “Notícias” informa que A proposta foi apresentada em várias reuniões populares e nessa ocasião colhemos diversas propostas no sentido de melhorarmos o serviço para que o aumento das tarifas não seja mal acolhido (...). Será que aqui se inclui o afastamento, definitivo, mesmo e se necessário coercivo, dos “chapas”de caixa aberta? Que transportam seres humanos em piores condições do que transporta gado. Claro que não. Pura ilusão. Pura tentativa de manipular a vontade e os sentimentos populares para tentar justificar a aceitação dos aumentos. Pacificamente. Mas cuidado. Mexer no bolso do cidadão quando ele já tem tão pouco, é sempre um risco. Esperemos que seja um risco calculado. Previsto. Ao longo dos anos, de muitos anos, a discussão, entre nós, sobre o preço dos transportes públicos urbanos parece ter assentado em premissas falsas. E parece continuar a ser assim. É que em cidade nenhuma do mundo, os transportes públicos urbanos são rentáveis. Permitem obter lucros. Aqui, pretende-se tentar demonstrar o contrário. Pretende tentar demonstrar-se que podem dar lucros. Que podem funcionar sem subsídios do Estado. Ou do governo municipal. Vai daí, o CMCM demite-se de prestar ao cidadão os serviços a que ele tem direito. Importa dezenas, centenas de viaturas que, depois, avariam. Por má gestão. Por incompetência. E tenta transmitir-nos a ideia de que a culpa é dos privados. Certamente que não é. Pelo menos na sua totalidade. A verdade é que os “chapas” de caixa aberta voltaram a invadir a cidade. Não pagam licenças, não pagam taxas, não pagam impostos. Para eles, a cidade de Maputo é uma selva. Onde impera a lei do mais forte. E eles, são os mais fortes. Até ver. Até que, com seriedade, se procure uma solução definitivamente para o problema. Até aqui o que vimos, aquilo a que assistimos, é que todos tentam saltar fora do barco. Quando o barco ameaça afundar-se. Resta saber se irão ter tempo.

domingo, outubro 07, 2012

Um Estado frágil

Vivemos num Estado fraco. Frágil. Ou que é fragilizado. Permanentemente. Ou que está a ser criminalizado. Dirigido e comandado por agentes corruptos. Que tentam e, aparentemente, conseguem impor as suas normas e as suas regras de funcionamento desse mesmo Estado. Por forma a este impedido ou deixar de cumprir as suas funções. Entre as quais as de legislar de cumprir e fazer cumprir as leis que aprova e de cobrar taxas, multas, impostos. E, muito por aí em diante. Ora, um Estado quando ou se não cobra o que é devido por lei, corre o risco de deixar de existir, de desaparecer como Estado. É um risco não de todo imaginário. Neste campo, neste aspecto de impedir cobranças de multas, taxas impostos, há casos paradigmáticos. Que parecem em crescendo, em constante aumento de número. Abordando o que está a acontecer com as transgressões ao Regulamento de Transportes de Carga, titula o jornal “Notícias”, na sua edição do passado dia 2, a toda a largura da primeira página: Milhões d meticais sonegados ao Estado. A primeira questão que surge, a primeira pergunta que deve ser colocada é como tal é possível. A resposta é dada pelo matutino, logo a seguir: A Polícia de Trânsito emitiu avisos de multa num valor superior a 2,5 milhões de meticais só nos primeiros seis meses deste ano por transgressões ao Regulamento de Transporte Rodoviário de Carga registadas na EN2 e na EN4. Entretanto, grande parte desse valor não chega aos cofres do Estado devido a fragilidades no mecanismo de cobrança por parte da Polícia. Para quem pretenda perceber o que é isto de fragilidades, o jornal esclarece: Segundo dados apurados recentemente pelo “Notícias”, a maior parte das multas acaba por ser anulada em esquemas de corrupção envolvendo transportadores prevaricadores, em conluio com alguns agentes da autoridade. Afinal, trata-se questão simples. Aparentemente. Fragilidades, significa aqui e neste contexto corrupção. Pode ser um eufemismo. Mas, concordemos, é bem mais bonito, bem mais suave, bem mais elegante dizer que determinado agente policial ou determinado transportador é frágil do que é corrupto. De resto, ninguém será punido por lei pelo simples facto de ser frágil. Se é que ainda possam existir dúvidas sobre o que estamos a escrever, o matutino de Maputo elucida: Sobre a não cobrança das multas aplicadas aos prevaricadores, o “Notícias” apurou que alguns transportadores são cobertos por indivíduos considerados “poderosos” que com recurso até ao telefone celular, ligam aos agentes da Polícia em serviço e ordenam a libertação imediata da viatura aprendida e a anulação da multa. Afinal, vivemos num mundo pequeno, num país pequeno, numa cidade pequena. Em que nos conhecemos todos uns aos outros. Em que conhecemos todos os nomes uns dos outros. Em que se conhece e em que conhecemos, em que alguns conhecem, quem não cumpre as suas obrigações para com o Estado. Mas, mais uma vez e como acontece sempre, quanto a nomes, nada. Não se trata, certamente, de uma questão de fragilidade. Trata-se, muito antes, de uma questão de medo. O que parece lógico. Um medo que é o resultado lógico e a consequência de se viver em um Estado frágil.