sexta-feira, janeiro 12, 2007

Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo de Dezembro 3, 2006



antes e depois

Luís David


Esta é a nossa realidade


O país associou-se e assinalou, na última sexta-feira, o Dia Mundial de Luta contra o SIDA. Para além das cerimónias oficiais, para além daquilo a que se pode chamar de actos públicos, um aspecto merece ser referido. Trata-se do envolvimentos de rádios e de televisões nesta jornada de esclarecimento, de sensibilização e de luta. Na sua mensagem divulgada por ocasião da data, o Presidente da República dedica especial atenção ao estigma e à discriminação. Sem dúvida, dois factores que podem fazer retardar a detecção da doença e, por conseguinte, o início do tratamento. Outro aspecto focado na mensagem, é o de a pandemia constituir um sério obstáculo à implementação da agenda nacional de luta contra a pobreza. Naturalmente, parte significativa do investimento em capital humano corre o risco de ser perder. Quer dizer, o esforço financeiro feito para a formação do professor, do médico, do enfermeiro, do polícia e de técnicos de múltiplas outras áreas corre o risco de ser uma perda. Por não resultar, por não permitir no contributo que se esperava desse esforço, desse investimento. Mas, também podemos ver o problema por prisma inverso. Isto é, a pobreza é, em si própria, em si mesma, um factor limitador do combate eficaz ao SIDA. Primeiro, porque sendo o doente, na maioria dos casos, pobre, só terá acesso aos medicamentos se o Estado suportar o seu custo. Segundo, nos casos em que o Estado suporta o custo dos medicamentos, o doente pode não ter, ainda assim, condições financeiras para custear uma alimentação de qualidade. Condição para que o tratamento tenha o necessário sucesso.


Ao proceder ao lançamento da semana alusiva do Dia Mundial de Luta Contra o Sida, a Primeira - Ministra anunciou que todos os distritos do país estarão capacitados para efectuar o tratamento anti-retroviral até ao primeiro trimestre do próximo ano. Sem dúvida, uma boa notícia. E, uma notícia que comprova o empenho do governo no combate à doença. Mas, mais disse na mesma ocasião. Disse que, até ao momento, 38 mil pessoas estão a beneficiar de tratamento anti-retroviral. Número significativo, sem dúvida, mas longe de beneficiar os 250 mil necessitados de tratamento. Ora, a questão que se pode e deve colocar é se se é viável ou não a instalação de uma fábrica de anti-retrovirais em Moçambique. Ou num outro país da região. E para produzir medicamentos para os países da região. Recordamos, estamos recordados, que o Brasil chegou a admitir a hipótese de instalar uma fábrica para a produção de anti-retrovirais em Moçambique. Depois, o assunto parece ter caído no esquecimento. Terá sido, muito provavelmente, uma promessa de ocasião, uma promessa política. De resto, em termos de economia de mercado, em termos de lógica de mercado, ninguém constrói uma fábrica em terra onde não haja mercado para a sua produção. Isto é, onde não haja dinheiro para comprar os produtos que fabrica. Mesmo quando possamos afirmar que somos todos irmãos. Que somos todos filhos de escravos. Esta é uma realidade. Esta é a nossa realidade.