domingo, agosto 12, 2007

É obrigatório que isso não venha a acontecer

Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo de Agosto 12, 2007

antes e depois

Luís David


Gostava de poder ter vivido no tempo em que se diz que os animais falavam. Haverão de ter sido tempos maravilhosos para viver. Tempos de diálogo. Tempos de compreensão. Tempos de entendimento e, também, de desentendimento. Mas, tempos em que todos falavam. Pelo menos, tempos em que todos podiam falar. Agora, no hoje, neste tempo nosso, neste tempo de nós, no tempo actual, tudo parece meio diferente. Já só falem os homens. Os animais, esses, é verdade, continuam com o direito de poder pensar. Mas, já não podem falar. Foi-lhes retirado o direito de falar. Compreende-se porquê e porquê assim. É que constitui um grande risco, nos bons tempos que correm, permitir que os animais falem. Que os animais continuem a falar. Constitui um grande risco dar a palavra aqueles que pensam. Assim, pensaram os senhores do mando, é preferível tirar a palavra aos que pensam. Aos animais e aos sábios. Também aos doutos e aos sages. Silenciados uns, calados outros, impedidos de expressarem e seu conhecimento mais alguns e a sua experiência outros, ficou aberto o campo para o avançar da ignorância e da incompetência. Também da intolerância, da maledicência e da maldade. Mas pior, o pior de tudo, é tentar colocar a ambição pessoal acima dos interesses colectivos. Sociais. Nacionais. Pergunte-se, então, se Estaline terá sido pior ou melhor do que Hitler. A resposta, pode ser irrelevante. Ambos estão situados entre os maiores criminosos dos tempos modernos. A história assim o regista, de forma com poucas possibilidades de desmentido.


Ontem, quinta-feira, cerca das 20 horas, a calma, em muitas residências da zona alta de Maputo, foi interrompida por tiroteio. Soube, mais tarde, que dois polícias haviam sido barbaramente assassinados e um terceiro ferido. Por bandidos armados. Na noite anterior, na cidade da Beira, dois camiões, que rebocaram tanques com combustível, foram incendiados. Mais antes, dias antes, um polícia, desses alcunhados de municipais, que dizem ter disparado inadvertidamente a sua arma, feriu cinco pessoas. Que nada tinham a ver com nada. Que eram simples transeuntes. E que tiveram, simplesmente, o azar de estar no local e no momento errado. Onde, por mero acaso ou não, estava, também, um polícia errado. Ao que se diz, como sempre, para retirar esses inconvenientes vendedores de esquina. Esses pés descalços que ocupam espaços que, em outras áreas da cidade, são concedidos a bancos e a restantes de luxo. Mais inquérito menos inquérito, o que se sabe, até hoje, é nada. Aqui, entre nós, os inquéritos são simples falácia. De resto, também assim aconteceu, também assim sempre o foram, nos tempos de Hitler e de Estaline. O problema do pobre em Moçambique é, simplesmente o de ser pobre. E daí, o de ter de esperar até Dezembro, para ver eliminada a criminalidade. Até lá, até esse Dezembro próximo, muita gente empenhada no combate ao crime poderá vir a perder a vida. É obrigatório que isso não venha a acontecer.