domingo, maio 06, 2012

Acreditar e crer no infinito

Há algumas semanas atrás, iniciei esta minha crónica da seguinte forma: “O chamado “dossier Cahora Bassa” parece ter sido encerrado. Finalmente. Embora os contornos possam não ser muito claros. Pelo menos publicamente. Quem cedeu e em que áreas, só o tempo o dirá. (...)”. E o tempo passado desde esse então, ainda não muito, já nos trouxe alguma novidade. Na sua edição electrónica do dia 28 do passado mês, o jornal português “Expresso” titula: “Privatização da REN é ilegal, diz Jorge Seguro Sanches”. Depois de remeter o acesso ao texto integral para a sua edição impressa, o semanário escreve: “O dirigente socialista Jorge Seguro Sanches afirma que a privatização da REN foi feita ‘em violação da lei’. Ao permitir que a mesma empresa detenha mais de 10% do capital da empresa, o Governo violou os decretos-lei 29 e 30/2006 sustenta o membro do Secretariado Nacional do PS, num artigo publicado nesta edição impressa do Expresso”. De recordar que esta REN é uma empresa ligada ao acordo final sobre Cahora Bassa. E, com interesses adquiridos e a adquirir em Moçambique sobre o ramo da sua actividade. A energia. Aqui, a situação já parece bem mais clara. Vejamos. Ao escrever, sobre a linha de energia Tete-Maputo, o “Notícias” (edição de 1 do corrente) titulou a toda a largura da sua primeira página: “Parceiros concertam para criar consórcio”. Depois de informar sobre questões técnicas, custos do projecto e hipóteses do seu financiamento, a local acrescenta: “Com efeito, os contactos estão a ser feitos com a Electrobras, REN e Eskom, empresas de electricidade do Brasil, Portugal e África do Sul, respectivamente, as quais manifestaram o interesse de participar na execução daquele importante empreendimento para a melhoria da qualidade de energia em Moçambique e nalguns países da África Austral.” Convenhamos que esta questão da “melhoria da qualidade de energia” tem o seu toque de demagogia. Ou de piedosa caridade. Que é, como quem diz, pobreza a quanto obrigas. Uma pobreza que não deve ser entendida como ignorância. Mas, antes, pode coexistir com verticalidade. Esperemos que sim. Pouco importa elaborar, menos ainda especular, sobre esta REN. Donde vem e para onde vai. Ou pretende ir. E ir às custas de quem. A questão que deve ser colocada parece ser bem mais complexa. Talvez, até, juridicamente. A questão que, obrigatoriamente, deve ser colocada é no sentido de se perceber, de ver para além de alguma nublosa. Por exemplo, se essa REN que, misteriosamente, adquiriu direitos sobre a posse e o capital de Cahora Bassa, é a mesma. Se é sempre a mesma. Nas diferentes vertentes em que por aí agora surge. Seja a de já ter sido privatizada em Portugal ou a da participação na construção da mais extensa linha de transporte energia a construir em Moçambique. Como sempre, os dados públicos sobre a matéria, são escassos. E, tanto podem indiciar o início do regresso das caravelas como um “cambalacho”. Esperemos que não. Esperemos que sejam apenas suposições erradas. Ou maus agoiros. O tempo o dirá. E, até que nos diga sim ou não, até que confirme se sim ou se não, permanece a dúvida. Fica a dúvida. Mas uma dúvida metódica. Não uma dúvida camaleónica e que seja, apenas, álibi. Ou forma de ganhar tempo. Até porque o tempo passado, o tempo ido não se poder recuperar. Da mesma forma que a verdade não se conforma nem se submete ao rodar do tempo. A verdade não é independente do tempo nem do espaço. O mesmo poderá significar que a verdade não existe. Em si própria, em si mesma. Que é, apenas, um processo. Infinito. Para tanto, é preciso acreditar e crer no infinito.