domingo, junho 19, 2011

Travar a ignorância dos incompetentes



Vemos e assistimos a situações que nos permitem concluir que vivemos numa sociedade de medo. De muitos medos. Medos pessoais e individuais. Medos, muito provavelmente, resultantes da falta de coragem para transmitir e reportar o que vimos e assistimos. Aquilo a que a assistimos e presenciamos. De tal forma, de tal modo que em diferentes ocasiões e perante diferentes situações usamos termos, palavras, expressões para dizer nada. Para não dizer nada. Ou, melhor, para dizer que nada queremos dizer. Que preferimos nada dizer. Ou que mesmo dizendo, nada dizemos, nada dissemos. Nada queríamos dizer. O que queremos, é dizer sem ter dito. Sem ter afirmado. Quem disse, quem afirmou, foram outros. Ou recorrendo a gíria popular, “afastar o rabo da seringa”. O recurso a palavras sem sentido no contexto em que são empregues parece estar na moda. Parece estar a fazer escola. Uma má escola. Mas, a ganhar espaço e direito de soberania. Em termos de informação, de comunicação. É assim que, por exemplo, ladrões, vigaristas e todos os seus outros aparentados, passou a ser “suposto”. E, logo, as vítimas, as vítimas desta cangalhada deixou de ser vítima de roubo, de violência física ou sexual, de assassinato. Por alguém. Que se pôs em fuga. E que não foi identificada. Por esta lógica, pela lógica desta inversão de valores, surge um risco. O primeiro risco é o de amanhã, de no futuro, todos termos passado a supostas vítimas de roubo, de violação ou de assassinato. Em defesa da protecção e do bom nome do criminoso. Digamos que esta inversão de valores começa a criar alguma preocupação. E muitos receios.


A palavra “suposto” tem pouco ou nada a ver com o contexto em que tem vindo a ser empregue. A consulta a um qualquer dicionário de língua portuguesa assim o prova. Poderá não passar de uma capa, de uma cobertura para quem não tendo conhecimentos, capacidades ou vontade para investigar e relatar factos públicos se procura esconder. Tenta fugir da sua própria sombra. O que se apresenta como impossível. A sombra do homem, a sombra projectada pelo homem, sempre foi, é, e será determinada pelo Sol. Pela posição do Sol. Voltando à questão da má utilização do termo “suposto”, deixemos apenas um exemplo. Entre muitos e quotidianos. Titulava na sua edição de 16 do corrente, jornal “Notícias” (página 3) “Mortos num assalto à entrada de um banco”. E, em seguida, acrescentava, “Polícia afirma ter detido os supostos assassinos”. Lendo a local, por aí e diante, na procura de detalhes sobre os supostos assassinos, encontramos nada. O que se pode ler, isso sim, é que “Entretanto, ao fim de tarde de ontem, Arnaldo Chefo, porta-voz da Polícia da República de Moçambique, disse à nossa Reportagem que o grupo dos malfeitores foi neutralizado e que estavam em curso investigações com vista ao esclarecimento cabal do caso. Porém, escusou-se a dar detalhes.”. Pelo que se pode ler, na versão policial sobre o acontecido, não existe a expressão “suposto”. Do que se fala, cio sim, é de “grupo de malfeitores”. O que contraria, frontalmente, a postura e a lógica jornalística. Na sua generalidade. Na sua quase totalidade. E que a fazer carreira, a vir a constituir-se em escola poderá permitir, a quem o desejar, vir a público falar e escrever sobre um “suposto Moçambique”. Sabemos haver quem tenha ousadia para isso. E para ir muito mais além. É preciso, em tempo útil, travar a ignorância dos incompetentes.