domingo, abril 04, 2004

Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo
3 de Abril 2004

antes e depois

Luís David

no melhor pano cai a nódoa



Por ocasião ou a propósito da recente visita do Primeiro-Ministro de Portugal a Moçambique, alguém sugeriu, alguém escreveu sobre a possibilidades e a utilidades de serem enviados professores para o nosso país. Dos muitos que lá não conseguem colocação. Ao abrigo de um acordo de cooperação. Pagos por Portugal. Mas, professores de língua portuguesa. O que até parece uma boa ideia, o que se afigura como sugestão útil. Afinal, assim deveria ser, melhor do que ninguém são os portugueses que sabem a sua língua. Ou deveriam saber e dominar. Para a poderem ensinar. Como mais ninguém. Acontece, porém, como por todos é sabido, que a língua portuguesa é uma língua traiçoeira. Para não dizer traidora. É uma língua cheia de subtilezas, de rasteiras, de matreirices. É uma língua, que não cede com facilidade os seus pergaminhos ao querer de certos doutores. Por muito competentes, por muito sábios que o sejam nas mais variadas esferas do conhecimento. É uma língua, enfim, que não se deixa dominar por interesses outros que não sejam os seus. Os do bem falar e os do bem escrever.


Ministros do Gabinete do Primeiro-Ministro de Portugal, assessores e outro pessoal qualificado multiplicaram esforços para assinar acordos e protocolos. O tempo era pouco, o tempo urgia. Em todos, ou quase todos, esses documentos a assinar por ambas as partes, aparecia uma palavra, um termo, por muitos desconhecido. Um termo que ninguém, em Moçambique conhecia. O termo assumpção. E, a provar que a referida palavra “povoou” os textos dos documentos oficiais está a local do jornal “Savana” (pag. 3) desta semana. Na verdade, na realidade, o referido termo não consta na maioria dos principais Dicionários da Língua Portuguesa editados, em Portugal, no último meio século. Existem, entre outros, assumir, assumpto (assumido) e assunção (acção de assumir). Mas, assunção sem p e com n no lugar do m. Assim, assumpção não passa de neologismo, barato e ridículo. De termo inventado, à última hora, para baralhar e confundir quem, de facto, em África, sabe e domina a língua portuguesa. Mas, também podemos aceitar que não. Que não passa de um erro. Que não passa de ignorância. Até porque, como todos sabemos, no melhor pano cai a nódoa.