segunda-feira, setembro 26, 2005

Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo de Setembro 25, 2005


antes e depois

Luís David


Fica o alerta

O aumento rápido, acelerado, do parque automóvel nacional tem, naturalmente, reflexos na circulação. Muito claramente, na cidade de Maputo. Primeiro, devido à falta de espaços de estacionamento em muitas zonas. Segundo, devido a congestionamentos e engarrafamentos. Em determinadas artérias e a certas horas. Situação agravada, situação que tem como factor agravante o facto de a maioria dos sinais luminosos reguladores do trânsito estarem avariados. O que origina, em última análise, um número elevado de acidentes. Um número exagerado de acidentes, que bem podiam ser evitados. Que não se encontra justificação para que aconteçam. Mas, voltemos ao princípio, voltemos à questão do congestionamento em diversas artérias e a determinadas horas. A situação, o caos a que chegou o trânsito, parece justificar um estudo sério. Com vista a encontrar alternativas e soluções. Digamos, mesmo, a situação exige soluções rápidas e urgentes. Uma das quais, poderá, eventualmente, ser o estabelecimento de vias de sentido único. Durante todo o dia, com carácter permanente. Ou, em alternativa, com sentido único, em determinados períodos do dia. Consoante o sentido do maior fluxo de trânsito. Naturalmente, como se disse, qualquer solução exige estudos adequados. E, qualquer solução passa, também, por uma maior colaboração e uma mais efectiva presença da Polícia de Trânsito onde era suposto dever estar presente. Mas, raramente está. Por último, poderá ser necessário estudar, poderá ser necessário analisar, se as dezenas de viaturas de instrução que circulam pela cidade constituem são ou não factor agravante do actual caos. Se sim, se a conclusão for sim, há que limitar a sua circulação a determinadas artérias e em determinadas horas do dia.


Nesta questão do acelerado e rápido crescimento do parque automóvel nacional, parece importante não perder de vista um outro aspecto. O de ser o resultado de uma política governamental. De uma política que permite a importação, aparentemente, sem qualquer tipo de controlo de qualidade, de viaturas usadas e recondicionadas. Uma política que, temos de o reconhecer, veio facilitar a muitos moçambicanos, talvez milhares, ter acesso a transporte próprio. Mas, uma política é como uma moeda. Tem duas faces. Tem verso e tem anverso. Tem vantagens e tem desvantagens. Daí, talvez por ter mais desvantagens do que vantagens, ter sido proibida a importação deste género de viaturas em alguns países da SADC. Aperceberam-se, alguns, estarem a ser transformados em parques de sucata. Estarem a permitir negócio de sucateiros. Chorudos negócios de sucateiros, ambulantes e errantes. Com todos os perigos. Os perigos e os custos económicos que isso representa. No caso concreto de Moçambique, a descontrolada importação de viaturas usadas parece apresentar vários perigos. Um, será a crise das empresas que importam viaturas novas, às quais garantem assistência. Outro, não menos importante, o envelhecimento prematuro do parque automóvel nacional. O que representa, sem dúvida, elevados custos para o país e para o cidadão. Não custa prever, não custa aceitar, que a maior parte das muitas centenas das reluzentes viaturas que hoje por aí circulam, enfrentam o destino de ficar , definitivamente, parqueadas dentro de poucos anos. O que parece ser um caso para reflexão. Fica o alerta.
Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo de Setembro 18, 2005

antes e depois

Luís David


também em inglês nos entendemos


Está Moçambique situado numa região em que os países fronteiriços foram colonizados por ingleses. Logo, situado, enquadrado, num espaço geográfico em que é dominante a língua inglesa. Ora, tendo sido Portugal metropolitano, durante décadas, pouco mais do que uma colónia económica britânica, Moçambique viria, por este e por outros motivos, a cair, também na órbita do domínio inglês. De tal forma que, principalmente no sul, tinha curso legal a libra inglesa. Da mesma forma que, durante largo período de tempo existiram jornais bilingues. Foram editados jornais em língua portuguesa e em língua inglesa. Não consta nos registos históricos que a administração colonial, local ou metropolitana, alguma vez se tenha oposto à situação. Ou que tenha ensaiado alguma medida para a alterar. Porém, decorridos anos, mais precisamente algumas décadas, aconteceu, era já Moçambique país. E, o que aconteceu foi começar a escutar-se uma alarmada vozearia, desalegrada e insatisfeita, manifestamente, pelo facto de Moçambique estar a preparar-se para eleger, para optar, pela língua inglesa, preterindo a portuguesa. Isto ocorreu por ocasião e na sequência da adesão de Moçambique à Comunidade Britânica. Era, foi, como se viu e como se comprovou, um alarme falso. Foi, como o tempo nos demonstrou, um rebate e um debate falso. Em que as vozes alarmadas e alarmistas de lá encontraram eco e calmosa tranquilidade em vozes aconselhadas mais sensatas do lado de cá. Pareceu assim, definitivamente, o assunto definitivamente encerrado. Para bem de todas as almas e dos justos pensadores de ambas as cotas oceânicas.


Temos de reconhecer, por ser esta a realidade, que foi a independência das antigas colónias portuguesas o factor determinante para que a língua portuguesa tivesse sido adoptada por várias organizações internacionais. De que todos esses países são, hoje, membros de pleno direito. Ora, tal facto, o facto de a língua portuguesa ser, hoje, cada vez mais utilizada em organismos internacionais, em nada fez diminuir a influência da língua inglesa. Digamos, mesmo e sem receio, que a língua inglesa é, hoje, se não a única, pelo menos a primeira língua de comunicação universal. Quer estejamos a tratar de comércio ou de economia, de artes ou de literatura, de ciência ou de tecnologia. De tal forma que, são muitos os termos os termos que, até hoje, não tiveram tradução noutras línguas. Que são utilizados e entendidos, por todos, no original, no inglês. Ignoro, por completo, se foi por estes ou por outros diferentes motivos o recente posicionamento do primeiro-ministro de Portugal. Disse José Sócrates, às televisões do seu país, por ocasião da abertura do ano lectivo, no passado dia 12 do corrente mês, que um país onde não se fale inglês não pode ser competitivo. Convenhamos que é uma posição lúcida. E que pode representar uma viragem na forma de Portugal se relacionar com o mundo. Ora, recuando algumas décadas no tempo, pode colocar-se a dúvida se o medo e os medos então manifestados, de Moçambique poder vir a substituir a língua portuguesa pela inglesa eram receios sinceros. Ou se, pelo contrário, não passaram de casos isolados de xenofobia ou de mal disfarçadas manobras neocoloniais. Seja o que tenha sido, parece ter ficado desfeito o mito da língua. Da língua portuguesa. E, a partir deste momento, podemos dizer também em inglês nos entendemos.

sábado, setembro 17, 2005

Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo de Setembro 11, 2005

antes e depois

Luís David


aproveitar a oportunidade


Vivemos numa época, numa era, em que a economia e a civilização assentam num recurso natural. Chamado petróleo. Um recurso chamado petróleo que sendo, em princípio e teoricamente, inesgotável, não é renovável. Um recurso cujas reservas mundiais são apenas conhecidas por bem poucos. Mas, também, um recurso cujo aumento do preço de venda no mercado internacional, bem pode fazer derivar a sua exploração para zonas alternativas das tradicionais. Tradicionalmente fornecedoras do produto a baixo custo. Hoje, como desde há décadas, o controlo das zonas de produção de petróleo, das suas rotas e reservas, constituem factores de guerras. Quer acreditemos ou não. Acrescentemos, para melhor nos situarmos, que no início de 2004, os dois países com maiores reservas petrolíferas do mundo – o Iraque e a Arábia Saudita – viram-se atormentados pela violência islâmica. Quem assim escreve é Michael Scheuer, em “Orgulho Imperial: Porque está o Ocidente a perder a guerra contra o terrorismo”. Um livro cuja primeira edição foi publicado sob o pseudónimo de “Anónimo”. Por o autor estar ainda a trabalhar para a CIA. Um livro, sem sombra de dúvida, extremamente crítico sobre a forma como os Estados Unidos e o Ocidente estão a fazer a guerra contra o terrorismo. Em última análise, um livro polémico.


É bem verdade que petróleo, para muitos de nós, significa pouco mais do que o combustível que faz andar a nossa viatura. E que, quando sobe de preço, faz aumentar o preço de tudo – ou de quase tudo – o que consumimos, em espiral. Mas, para além do custo financeiro, o petróleo tem um custo político. Se considerarmos que tem vindo a ser fixado politicamente, e não segundo as regras do mercado. Para este factor nos chama a atenção o autor do livro quando, logo no prefácio, escreve: O petróleo do Golfo Pérsico e a falta de um desenvolvimento sério de energias alternativas por parte dos Estados Unidos são o âmago da questão bin Laden. A troco de petróleo barato e facilmente acessível, Washington e o Ocidente têm sustentado as tiranias muçulmanas que bin Laden e outros islamistas tentam destruir. Não pode haver outra razão para apoiar a Arábia Saudita, um regime que desde a sua fundação tem alimentado deliberadamente uma ideologia islâmica cujos objectivos – ao contrário dos de bin Laden – apenas poderão ser atingidos pela aniquilação de todos os não muçulmanos. Esta guerra poderá prolongar-se para além das vidas dos nossos filhos, e vir a ser principalmente travada em solo americano. Parece necessário esclarecer que o livro foi escrito depois dos ataques de 11 de Setembro de 2201. E que procura ser um alerta para a possibilidade de futuras acções semelhantes. Como já foram registadas. Significativa, no contexto do preço actual do barril de petróleo e dos acontecimentos
Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo de Setembro 4, 2005

Luís David


a lei é igual para todos

É gratificador. É, sem dúvida, gratificador saber que casos de ilegalidades, denunciados publicamente, aqui denunciados, mereceram a devida atenção. Por parte de quem tem poder para investigar. E que foram devidamente corrigidas. O que nem sempre acontece. Referimo-nos, no caso concreto, aos negócios de venda de terrenos por parte de uma imobiliária. É que, perante a denúncia da negociata, perante tamanho escândalo público, entendeu o Conselho Municipal de Maputo revogar todas as concessões de terrenos dentro do território municipal cujos concessionários estão a aliená-los através da imobiliária em questão. Assim como decidiu anular todas as licenças de construção já emitidas para os terrenos vendidos pela mesma imobiliária Algarve. Mas, vai mais longe. Sugere ao Ministério da Indústria e Comércio que cancele o alvará da Algarve, por prática de negócio anticonstitucional e por violação da Lei de Terras e seu Regulamento. Sem nos alongarmos demasiado sobre o assunto, seria, de todo, interessante podermos saber quem são os proprietários dessa tal Algarve. E se cometeram ou não crime passível de prisão. Trata-se de simples curiosidade.


Muito provavelmente, esta questão de venda de terrenos por uma dita imobiliária pode não ser caso único. O problema pode, muito bem, ser mais vasto e mais complexo. E, questão de fundo, parece importante saber se há espaço de negócio para o número crescente de empresas que operam nesta área. Que anunciam os seus serviços publicamente, que operam num espaço de negócio legal, bem entendido. Porque, para além destas, que se dão a conhecer através de anúncios na Imprensa, podem existir outras. São aquelas para as quais o escritório é o café. Qualquer café. E que operam através do telefone móvel. Seu único gasto para conseguir comissões. Sem muito trabalho. O que pode levar a ter de questionar se o Estado tem conhecimento deste negócio informal. Que aproveita, fundamentalmente, a estrangeiros. Mais, se o fisco lhes cobra alguns impostos. De facto, uma coisa é ser Moçambique um país aberto ao investimento estrangeiro. Outra, bem diversa e bem diferente, é dar acolhimento a quem nada investe e só fomenta negociatas e negócios ilegais. Cumprir a legislação em vigor no país não pode ser só obrigação para os moçambicanos. Tem de ser para moçambicanos e para estrangeiros. E, felizmente, começam a surgir alguns sinais, positivos, de que a lei é igual para todos.