segunda-feira, setembro 26, 2005

Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo de Setembro 18, 2005

antes e depois

Luís David


também em inglês nos entendemos


Está Moçambique situado numa região em que os países fronteiriços foram colonizados por ingleses. Logo, situado, enquadrado, num espaço geográfico em que é dominante a língua inglesa. Ora, tendo sido Portugal metropolitano, durante décadas, pouco mais do que uma colónia económica britânica, Moçambique viria, por este e por outros motivos, a cair, também na órbita do domínio inglês. De tal forma que, principalmente no sul, tinha curso legal a libra inglesa. Da mesma forma que, durante largo período de tempo existiram jornais bilingues. Foram editados jornais em língua portuguesa e em língua inglesa. Não consta nos registos históricos que a administração colonial, local ou metropolitana, alguma vez se tenha oposto à situação. Ou que tenha ensaiado alguma medida para a alterar. Porém, decorridos anos, mais precisamente algumas décadas, aconteceu, era já Moçambique país. E, o que aconteceu foi começar a escutar-se uma alarmada vozearia, desalegrada e insatisfeita, manifestamente, pelo facto de Moçambique estar a preparar-se para eleger, para optar, pela língua inglesa, preterindo a portuguesa. Isto ocorreu por ocasião e na sequência da adesão de Moçambique à Comunidade Britânica. Era, foi, como se viu e como se comprovou, um alarme falso. Foi, como o tempo nos demonstrou, um rebate e um debate falso. Em que as vozes alarmadas e alarmistas de lá encontraram eco e calmosa tranquilidade em vozes aconselhadas mais sensatas do lado de cá. Pareceu assim, definitivamente, o assunto definitivamente encerrado. Para bem de todas as almas e dos justos pensadores de ambas as cotas oceânicas.


Temos de reconhecer, por ser esta a realidade, que foi a independência das antigas colónias portuguesas o factor determinante para que a língua portuguesa tivesse sido adoptada por várias organizações internacionais. De que todos esses países são, hoje, membros de pleno direito. Ora, tal facto, o facto de a língua portuguesa ser, hoje, cada vez mais utilizada em organismos internacionais, em nada fez diminuir a influência da língua inglesa. Digamos, mesmo e sem receio, que a língua inglesa é, hoje, se não a única, pelo menos a primeira língua de comunicação universal. Quer estejamos a tratar de comércio ou de economia, de artes ou de literatura, de ciência ou de tecnologia. De tal forma que, são muitos os termos os termos que, até hoje, não tiveram tradução noutras línguas. Que são utilizados e entendidos, por todos, no original, no inglês. Ignoro, por completo, se foi por estes ou por outros diferentes motivos o recente posicionamento do primeiro-ministro de Portugal. Disse José Sócrates, às televisões do seu país, por ocasião da abertura do ano lectivo, no passado dia 12 do corrente mês, que um país onde não se fale inglês não pode ser competitivo. Convenhamos que é uma posição lúcida. E que pode representar uma viragem na forma de Portugal se relacionar com o mundo. Ora, recuando algumas décadas no tempo, pode colocar-se a dúvida se o medo e os medos então manifestados, de Moçambique poder vir a substituir a língua portuguesa pela inglesa eram receios sinceros. Ou se, pelo contrário, não passaram de casos isolados de xenofobia ou de mal disfarçadas manobras neocoloniais. Seja o que tenha sido, parece ter ficado desfeito o mito da língua. Da língua portuguesa. E, a partir deste momento, podemos dizer também em inglês nos entendemos.