domingo, dezembro 21, 2008

o discurso político de 2008 não terá qualquer significado em 2009

Desde há poucos dias, desde há poucas dezenas de horas, que estamos em 2009. Dizer que o ano que terminou não foi ano bom ou que foi um ano mau. Poderá não ser correcto, não corresponder a nada. De facto, persistiram guerras, fome, atrocidades, massacres. O preço do petróleo, que era previsto fixar-se nos cem dólares por barril, ultrapassou em muito este valor. Atingiu os cerca de 150. Depois, baixou e ficou pelos 50. Um valor demasiado baixo, uma valor fictício, tendo em conta as reservas conhecidas. Disponíveis. Em exploração. E, aqui, poderá perguntar-se se é ou não rentável explorar as reservas moçambicanas. Muito provavelmente sim. Ao aumento dos preços do petróleo, foi acrescentada a chamada crise financeira, dita mundial. Devido ao facto de muitos bancos terem entrado em processo de falência. Ou a serem intervencionados pelo pelos. Estados para que tal não acontecesse. Em acumulação, tivemos, também, a chamada crise de alimentos. Mais de um década de políticas agrícolas desastradas ou desastrosas, não poderiam ter produzido outros resultados. Era inevitável que essas políticas produzissem os resultados que produziram. E, aqui, os governos, principalmente os africanos, só podem queixar-se de si mesmos. Pelo facto de não terem assumido políticas outras, mais ousadas e mais consentâneas com as suas realidades. Ao invés de terem assumido políticas e imposições dos doadores. Ao invés de terem papagueado as políticas e os objectivos dos doadores. Que, como o tempo o haverá de demonstrar, não irão eliminar a pobreza. Muito pelo contrário. Irão perpetuar a pobreza. Moçambique é, hoje, disso exemplo. É um caso exemplar. Talvez, paradigmático.

Temos de convir que, talvez não seja fácil fazer balanço do quanto aconteceu em 2008. Melhor, mais fácil, será perspectivar o que desejamos que venha a acontecer em 2009. E, aí, poderemos todos conjugar esforços, unir forças. Primeiro, apoiando aqueles que, publicamente, já vieram manifestar a sua disposição para combater o crime organizado. Segundo, dando todo o apoio às políticas nacionalistas de desenvolvimento do distrito. Terceiro, denunciando todos aqueles, nacionais e estrangeiros, que tentam perpetuar a pobreza apoiando e pressionado a introdução de políticas contrários às realidades nacionais. Moçambicanas. E, aqui, atenção, temos de estar atentos para entender onde começa e onde acaba o discurso para satisfazer o doador. O onde se situa o discurso com sentido nacional. Nacionalista. O que poderá equivaler a dizer que o discurso político 2008 não terá qualquer significado em 2009.

domingo, dezembro 14, 2008

colocam em dúvida se vivemos num estado capturado

Muitas e muitas vezes, ganham direito a letra de Imprensa críticas a telenovelas. Sobretudo de origem brasileira. Mas, nós por cá, internamente, também temos as nossas novelas. Uma delas, conheceu novo capítulo. Novo episódio. Se é novela humorística, se é dramática, se é trágico – cómica, ainda ninguém se atreveu a classificá-la. Mesmo com esta falta, com esta falha, com esta ausência de clarificação e sem sabermos quando iremos assistir ao próximo episódio, ao próximo capítulo, podemos sugerir título para a farsa. Entre os vários e muitos possíveis, aqui ficam algumas ideias: “Anibalzinho feliz e de novo entre nós”, “Sempre igual entre pares”, “Vergonha nacional”. A escolha do título, como se oferece óbvio, fica ao critério de cada leitor. Desde já e com a advertência de que a sua escolha vale nada. É igual a nada. Ao que foi também noticiado, sete agentes da Polícia estão a ser investigados. Sobre como terá saído da cadeia o tal de Aníbal, e mais dois outros reclusos. Todos os três, agora, com direito à exposição das suas fotos em locais públicos. Quer dizer, agentes da Polícia deixaram-nos fugir. Agora, a Polícia pede-nos a nós, cidadãos honestos, pacíficos, pagadores de Impostos ao Estado, ajuda na sua captura. Não de um dos fugitivos. Dos três. Sem sequer explicar e mantendo como mistério o motivo pelo qual todos os três saíram da cadeia no mesmo momento e pelo mesmo processo. Também tem coincidência, no tempo, a detenção de três indiciados no assassinato de Siba-Siba Macuácua. Como coincidência no tempo tem, a liberdade, sob caução de dois dos acusados no chamado “Caso Manhenje”. Muito provavelmente, aquilo que parecem ser coincidências no tempo, serão nada mais do que isso. Serão, apenas coincidências. Mas, convenhamos, apenas assim.


Em “Há mais bicicletas – mas haverá desenvolvimento?”, Joseph Hanlon e Teresa Smart transportam-nos e fazem-nos recuar no tempo. Uma viagem que, sendo um recuo, é, também e essencialmente, um desafio para a compreensão do presente. Do nosso hoje. Escrevem os autores (pag. 235), depois de definirem o que entendem por “estados predadores” e “estados desenvolvimentistas”: Vemos que a Frelimo estava dividida em dois grupos, o “estado predador” e o “estado desenvolvimentista”, segundo estas duas abordagens. Alguns dentro da Frelimo tentaram bloquear a predação dos outros e fazer força por um capitalismo mais benigno, mais social-democrata, com um grau maior de intervenção. E, pouco adiante (pag. 237), acrescentam: Muitos do grupo predador cada vez mais pareciam convencidos de que lhe pertencia uma porção de tudo o que estivesse a acontecer. Era difícil para Moçambicanos ou estrangeiros montarem negócios sem que um membro da elite da Frelimo recebesse uma porção. Em licenças, autorizações e concessões de terra tinha de haver sempre subornos ou participação. Os moçambicanos começaram a “falar de cabritismo”. Já na página seguinte, depois de explicitarem o que consideram Corrupção Administrativa e Captura do Estado, escrevem os autores: Cabritismo pode envolver dois tipos de corrupção. Mas a captura do estado tornou-se cada vez mais evidente nos anos 90. Um aspecto fundamental da captura do Estado, segundo um estudo do Banco Mundial, é a “venda de decisões cíveis e criminais dos tribunais a interesses privados (e) má utilização dos fundos do Banco Central”, que aparecem cada vez mais. O sistema judicial tem sido mantido deliberadamente fraco, de modo a que casos contra a numenclatura sejam deixados no esquecimento. De facto, em concreto e salvo opinião contrária, quando um tal de Aníbal e seus comparsas de crime entra e sai da prisão, colocam em dúvida se vivemos num estado capturado.

domingo, dezembro 07, 2008

um direito de soberania

O Conselho de Ministro aprovou, esta semana, um decreto que fixa quotas para a contratação de trabalhadores estrangeiros. Mais precisamente, define a percentagem de trabalhadores estrangeiros permitida em função do número de efectivos totais. A medida, como é fácil de perceber, pretende desencorajar a contratação de estrangeiros e proteger o emprego de nacionais. A medida, em si, é bem vinda. A medida, em si, é correcta. Necessita é de ser aplicada com rigor. E, para atingir os efeitos pretendidos, não pode admitir excepções. Nem desvios de aplicação. É que na edição do mesmo dia do “Notícias” (03.12.08, pag. 27), o matutino escrevia: “Inspector do Trabalho Suspenso em Maputo”. Isto, devido ao seu mau comportamento. A local tinha como origem um comunicado do Ministério do Trabalho. De acordo com o qual o inspector em causa é apontado tanto por colegas como por diversas entidades empregadoras da província de Maputo, como estando a denegrir a imagem da instituição ao se envolver em muitos esquemas ilícitos nas inspecções laborais. Ora, perante este caso, perante esta situação, perante mais esta situação, o problema não está na lei. Não está na legislação existente ou que possa vir a ser aprovada. Por mais elaborada e por mais perfeita que o possa vir a ser. O problema está nos funcionários a quem é confiada a nobre missão de aplicar a Lei. E, sobre esta questão, ao que parece, estaremos todos claros.

Nesta mesma semana (“Magazine”, 03.12.08), ficámos todos a saber que dois cidadãos paquistaneses foram detidos, em Moçambique, com mais de 2.3 milhões de dólares, libras e euros. Na fronteira de Machipanda. Acrescentemos, para melhor entendimento dos factos, quando iam a sair de Moçambique. Quando iam a sair com todo esse dinheiro. Logo, não eram investidores. Que, por aqui, tanto são reclamados. E, publicamente, acarinhados. Acrescente-se que se trata, também, de um dos primeiros casos em que os detidos têm nome. E em que a notícia é fértil em detalhes. Mas em que, como é comum neste tipo de notícias, os detidos nada sabem. Dizem não ser eles os donos do dinheiro. Dizem terem sido, apenas, contratados para transportar o dinheiro. Como dizem não conhecer o nomes dos donos do dinheiro. Comum a outros casos, é facto de terem tentado subornar os agentes que os detiveram. Ao bom estilo da mafia e da camorra napolitana. Digamos, acrescentemos. Não menos surpreendente é a libertação de uma moçambicana, que também tem nome e morada, acusada do tráfico de estrangeiros. No total, eram 18 entre cidadãos de nacionalidade paquistanesa e indiana. Que não se sabe ao que vinham. Nem ao que iam. Ou que ninguém quer revelar com pormenor. Provavelmente, para evitar mortes mais do que certas. Mas que são inevitáveis. Que sempre aconteceram. Quando se entra em jogos políticos e quando e onde quem está no poder tem poder nenhum. Em tese, colocam-se duas questões pertinentes. É, em primeiro, a questão de saber se quem pensa que manda, manda. A segunda, é a questão de se quem manda, efectivamente, manda. Na prática, nem sempre quem pensa que manda, efectivamente, manda. Na prática e na realidade, muitas das vezes, o poder é simples ilusão. E, se assim, ter a ilusão do poder é não ter poder. O poder só é poder quando quem tem poder de exercer o poder sabe exercer o poder. O poder é, em última análise, um direito de soberania.

domingo, novembro 30, 2008

um presente envenenado

Muito provavelmente, a este tempo, já terão sido divulgados os resultados finais das eleições autárquicas. Que, podem ter acrescido, que podem ter acrescentado pouco ou nada aos resultados parciais. Que poderão trazer novidade nenhuma em relação ao que vinha sendo conhecido. E, o que era conhecido atribuía a presidência de 42 dos 43 municípios à FRELIMO. As perdas da RENAMO, neste capítulo, parecem motivar algum descontentamento interno. Daí que quadros desta formação política tenham vindo a público defender a realização de um congresso extraordinário. De facto, a este nível de governação, a RENAMO perdeu terreno e perdeu espaço. Governa, hoje, em menos locais. Para se ser claro e objectivo, governa em nenhum local. Não governa nenhum município do país. Aparentemente, estamos perante um fenómeno que contraria a lógica. Porque a lógica seria consolidar posições antigas e conquistar novas. Assim não aconteceu. Mas, certamente, haverá outros aspectos a não perder de vista. Quando e principalmente, no seu íntimo, Afonso Dhlakama, já possa ter assumido que tem um mínimo de possibilidades de vir a ser Presidente da República. Talvez possibilidades nenhumas.

Vista a questão por prisma diferente, fica, neste momento, por saber quem irá ou quem poderá partilhar a vitória pessoal de Daviz Simango na Beira. E, muito claramente, se a vitória de Simango pode significar, em termos de futuro, uma derrota da RENAMO ou uma derrota da FRELIMO. A RENAMO, como a conhecemos hoje e conhecendo a sua génese, parece facilmente integrável. É facilmente dominável pela FRELIMO. Ou por uma certa FRELIMO. Será uma questão de negociação. De estatuto a conceder ao seu líder. Que já percebeu, que já entendeu, que tem hipótese nenhuma de chegar, em tempo algum, a Presidente da República. Por isso, resta-lhe a possibilidade de continuar a negociar para manter o estatuto de líder da oposição. O que já não será mau. E, ao que parece, não irá para além das suas ambições. A vitória de Simango na cidade da Beira, não é, em si, um processo simples. A sua governação vai exigir alianças. Pode vir a motivar a criação de novas formações políticas. Do que parece existirem poucas dúvidas. Por certo, os derrotados Namburete, em Maputo, e Samo Gumo, na Matola, serão potenciais aliados do vencedor na cidade da Beira. Às próximas presidenciais. Se assim, estamos perante um presente envenenado.

domingo, novembro 16, 2008

que a morte de Makeba inspire Saviano para novos combates

Miriam Makeba morreu aos 76 anos. Morreu perto de Nápoles, na Itália. Morreu de crise cardíaca e após ter cantado. Em missão das Nações Unidas e para chamar a atenção do mundo para uma questão aparentemente simples. A da necessidade de um muito maior empenho no combate ao crime organizado e ao tráfico de drogas. Ao crime organizado que, naquela região, tem como expoente máximo a Camorra. Ou, se se preferir morreu no decorrer de um concerto em homenagem a Roberto Saviano, autor de “Gomorra”. Que, hoje, vive “oculto e sob protecção policial”. Após a edição deste seu primeiro livro, que já vendeu mais de um milhão de exemplares em Itália. Um livro sobre o qual o “The Guardian” escreveu: “(...), de vez em quando, é preciso parar e relembrar que se trata da vida de uma grande cidade, numa nação rica, na Europa Ocidental; em membro fundador da UE; um país cujos negócios se interligam – perigosamente, sugere Saviano – com os nossos.

Roberto Saviano nasceu em 1979 em Nápoles, onde vivia a trabalhava até que, em Setembro de 2006, o êxito do livro, que cita nomes e lugares, o obrigou a viver oculto e sob protecção policial permanente. “Gomorra”, foi editado em língua portuguesa, com data de Janeiro de 2008, pelas Edições Asa II. Trata-se de um trabalho de jornalismo de investigação. Ou, se assim se preferir, de uma viagem ao mundo dos negócios e do crime da Camorra. Onde impera o “trabalho infantil”, tema que irá merecer abordem em próxima edição. Dizer que, após mencionar o número de mortos, ano por ano, desde 1979 até 2005, Roberto Saviano escreve: Três mil e seiscentos mortos desde que nasci. A camorra matou mais do que a máfia siciliana, mais do que ‘ndrangheta’, mais do que a máfia russa, mais do que as famílias albanesas, mais do que a soma dos mortos feitos pela ETA em Espanha e pelo IRA na Irlanda, mais do que as Brigadas Vermelhas, do que os NAR e mais do que todas as vítimas do Estado ocorridas em Itália. A camorra matou mais do que todos. E, logo a seguir, para que não percamos de vista o local a que se refere, acrescenta: Aqui é o coração da Europa. Aqui se forja a maior parte da economia da nação. Quais são as suas estratégias de acção, pouco importa. O que é necessário é que a carne para canhão permaneça atolada nas periferias, rebentada nos emaranhados de cimento e lixo, nas fábricas clandestinas e nos armazéns de coca. E que ninguém faça sinal, que tudo pareça uma guerra de bandos, uma guerra de maltrapilhos. Já na página seguinte (147), o autor de “Gomorra” escreve: A matança de Secondigliano atrai a atenção que faltava pelas dinâmicas da camorra há vinte anos. No norte de Nápoles a guerra mata em pouco tempo, respeita os critérios jornalísticos da crónica, em pouco mais de um mês acumula dezenas e dezenas de vítimas. Parece feita de propósito para dar um morto a cada enviado. O sucesso para todos. Foi, sem dúvida, para chamar a atenção do mundo sobre como se desenvolve o crime organizado naquela região de Itália que Makeba aceitou participar num concerto em Nápoles. Dizer que morreu como sempre soube viver, é nada. Dizer que morreu a lutar contra injustiças sociais, é pouco. Mas, talvez seja justo considerar imperativo que a morte de Makeba inspire Saviano para novos combates.

domingo, novembro 09, 2008

não passavam de farinha do mesmo saco

A campanha eleitoral para as Autárquicas do próximo dia 19, está em marcha. Os concorrentes à presidência dos 43 municípios já se fizeram à rua. Isto é, iniciaram as suas campanhas de propaganda eleitoral. Pelos discursos ouvidos nos dois primeiros dias, não existe matéria para qualquer tipo de avaliação. Para fazer uma avaliação. Para que se possa dizer onde e se há só promessas realizáveis. Ou se, pela inversa, também há promessas eleitorais que os candidatos sabem, de antemão, não poder nunca vir a cumprir. De registar, de salientar, o facto de o primeiro dia de campanha ter sido calmo. Pese o facto de uns poucos incidentes, isolados e localizados, entre simpatizantes de partidos concorrentes adversários. Neste contexto, resta desejar que este tipo de incidentes tenham sido os primeiros e os únicos. Que não se repitam. Que não tenham sequência e que tenham sido, apenas, precedente. De resto, a violência, o confronto físico não levam a local nenhum. Não podem resolver problema nenhum. E, se há ou quando houver violação da Lei, existe apenas uma solução. Só existe uma solução legal e civilizada. A do recurso às autoridades competentes.


Já no interior da RENAMO, surgem discursos diferentes. Bem diferenciados. Discursos, aparentemente, antagónicos. O que também não admira. Por não ser a primeira vez que tal acontece. De um lado, está o discurso belicoso e incitando à violência primária. Ameaçador. Do outro lado, ouve-se um discurso conciliatório, pacifista, legalista. Um discurso que, no mínimo, aponta para a aceitação do veredicto final do Tribunal Administrativo. Isto, depois de a Comissão Nacional de Eleições ter confirmado a exclusão de três candidatos deste partido. À presidências de outros tantos municípios. Devido à apresentação de documentação irregular. Ameaçar boicotar as eleições caso os referidos candidatos sejam, definitivamente, excluídos, não leva a lado nenhum. Revela, isso sim, uma total falta de cultura política. E um elevado défice democrático. A menos que estejamos perante uma nova estratégia eleitoral. Ou uma farsa. Com o objectivo de criar, única e exclusivamente, factos políticos. Em que possa haver uma divisão de tarefas. Segundo a qual, a um cabe a tarefa de desempenhar o papel de mau. Para o outro, fica a tarefa de desempenhar o papel de bom. Se assim, o método não contem qualquer inovação. Não constitui novidade. Possa não ter sido inventado pela polícia política colonial, foi por ela muito utilizada nos interrogatórios dos presos políticos. Uma vezes, eram interrogados pelo polícia mau. Noutras ocasiões, pelo polícia bom. Na verdade e em definitivo, não passavam de farinha do mesmo saco.

domingo, novembro 02, 2008

que se pronunciem os donos da verdade

Quando as águas do Nilo saem do leito do rio e inundam as margens, não há motivo para alarmes. Significa que as terras marginais, as terras adjacentes, ficam, naturalmente, fertilizadas. Significa época ou ano de cultura fértil. Abundante. Os homens não podem, não têm meios nem técnica nem poderes para evitar que as águas do Nilo saiam do seu leito normal. Habitual. Mas, em termos agrícolas, em termos de agricultura indígena, sabem como tirar o máximo de benefícios, o máximo de rendimento nas terras cobertas por muitas toneladas de lama. A lama, transportada para as margens pelas águas da inundação, é como que um benefício dos céus. Nós, por cá, parece não termos, fenómenos semelhantes. Nem cultura assim. Nós por cá, temos queimadas. Tema de muita falácia em tempos recentes. Modernamente, chamam de queimadas descontroladas às queimadas feitas pelos nativos. Pelos indígenas. Muito provavelmente, trata-se de um termo sugerido por uma qualquer ONG. Para não dizer imposto. Quer-se dizer, um eufemismo. Ora, digamos, com toda a propriedade, as queimadas, em si mesmas, não são um mal. E, constituem um factor importante na fertilização dos solos. As queimadas não começaram a ser feitas em Moçambique. Nem começaram a ser feitas ontem. Nem há dez, cinquenta ou cem anos. As queimadas começaram a ser feitas em épocas remotas. Remontam ao tempo em que o homem aprendeu a fazer fogo. Aqui, estamos a falar em termos de milénios. As nossas queimadas, nacionais, moçambicanas, não são descontroladas desde ontem nem desde de anteontem. Sempre foram descontroladas. Porque, se quisermos ser sérios e honestos, não há processo de controlar uma queimada a partir do momento em que é lançado fogo na mata. O que está a acontecer, parece simples. Elementar. As queimadas ditas descontroladas começaram a afectar interesses estrangeiros instalados. Interesses do capitalismo selvagem. Que nada têm a ver com a defesa da natureza. E, muito menos, das populações locais.


Dois incêndios no edifício do Ministério da Agricultura e um em serviços dependentes do Ministério das Finanças, em curto espaço de tempo, justificam alguma reflexão. Deveria. E uma reflexão séria e honesta. Mais do que uma reflexão, uma investigação. Que vá para além do que é óbvio e por todos sabido. Da esfarrapada desculpa da falta de meios para combater o fogo. A questão de fundo, nos casos em apreço, não é se existiam ou não existiam meios para combater o fogo. A questão de fundo não está em saber se os edifícios têm ou não escadas exteriores. Todos sabemos que não têm. E, não têm, aqui, como o não têm em nenhum outro país do mundo. Por tal não ser obrigatório. Em nenhum país se obriga a existência de uma escada interior e outra exterior. Sempre e quando exista um elevador. De resto, se o edifício não tinha condições de segurança para albergar um departamento do Estado, deveria ter sido recusado para tal fim. Mas, todas estas questões não passam de questões periféricas. Secundárias. Em definitivo, o que está em questão é saber se estamos perante simples acidentes, perante incidentes ou perante actos de sabotagem. Se sim ou se não, que se pronunciem os donos da verdade.

domingo, outubro 26, 2008

somos a favor da Revolução Verde

Há, hoje, ao que parece, muitas definições para Revolução Verde. No saber, no conhecer e na simplicidade de Lina Magaia, Revolução Verde é produzir para comer. Guebuza não precisa de dizer como se faz a Revolução Verde. Ela faz-se produzindo (Magazine, 22 do corrente). Para mim, guardo uma visão, talvez, mais académica. Menos prática. Mais teórica. Passa por querer saber como se pode e se deve fazer esse produzir para comer. E se produzir para comer é uma primeira ambição, um primeiro objectivo, se se deve ficar por aí. Se não é necessário produzir para além das necessidades imediatas, básicas, primárias. Se não é preciso produzir excedentes. Se não é preciso produzir para o mercado. E, se para se produzir para o mercado, se torna imperioso ou não que esse mercado exista. Ora, se não existe, tem de ser criado. Logo, em paralelo com o aumento da produção e da produtividade, com a criação de excedentes, não podem ser ignorados os meios e os mecanismos que permitam a troca. O funcionamento do mercado. Mas, convenhamos, a Revolução Verde não é um processo mecânico nem mecanicista. Não se limita à mera produção de produtos agrícolas. Passa pela sua transformação. Passa pela produção animal. Pela abertura e melhoramento das vias de circulação. Pelos meios de circulação. Pela expansão dos meios de comunicação para os centros urbanos rurais. Como o telefone, a rádio, a televisão. Exige, sem dúvida e por último, uma forte intervenção do Estado. Aos mais diversos níveis. A começar pela tentativa de quebrar resistências à mudança. A começar pela tentativa de alteração de hábitos e de costumes, que se verifiquem como entraves ao processo. Que é global.


Nesta semana que terminou, Maputo acolheu mais uma reunião da Via Campesina. Ao que parece a primeira em África. Esta organização foi criada em 1992. Trata-se de um movimento autónomo, pluralista, mas com ligações políticas e económicas. A avaliar pelos pronunciamentos públicos feitos na capital moçambicana, é contra a Revolução Verde. Reprova a Revolução Verde. Ao que parece e pelo que se ouviu, de forma absoluta e radical. Fundamentalista. O que não poderá conduzir a nada de bom nem de positivo. Aconselha o saber feito de experiência que se deve ser mais ponderado. Mais pragmático. Ora, que se seja contra uma revolução verde feita à base de sementes geneticamente modificadas, todos somos. Porque, para além de outras questões, deixa o camponês dependente de novas sementes em cada sementeira. Ou seja, dependente de multinacionais para quem a fome dos camponeses é o objectivo do seu negócio. Mas, atenção. Uma coisa é ser-se contra uma revolução verde feita à base de sementes geneticamente modificadas. Outra, é ser-se contra a Revolução Verde. Nós por cá, nós em Moçambique, somos a favor da Revolução Verde.

domingo, outubro 19, 2008

somos potenciais alvos dos criminosos

Com certa regularidade, a Polícia vem a público informar o que foi a actividade criminosa em determinado período de tempo. Ou num certo espaço geográfico. Quase, ou sempre, vem prestar essa informação em determinado ou certo dia da semana. Sempre à mesma hora e no mesmo local. Como acontece com as missas dominicais. A que os crentes assistem, um pouco por todo o país. Ou a que se obrigam a assistir. Porque querem e a isso os move a sua crença. Já em termos de informação policial, em termos de informação sobre a segurança a ordem públicas, as coisas deveriam ser diferentes. Deveríamos saber mais, muito mais do que aquilo que nos é dado saber. E, em tempo útil. Enquanto não, continuaremos a saber do assalto aqui, do roubo além, depois, muito depois de consumados. Em momento algum, que a memória recorde, terá havido notícia da antecipação da actividade policial. E que terá vindo a público dizer isso mesmo e aconselhar os cidadãos sobre a forma de se protegerem. De se precaverem de assaltantes e de ladrões. Fornecendo, inclusive, números de telefones para chamadas de emergência. Numa acção diária e concertada. Repetida. Através de jornais, de rádios, de televisões. Que é, que devia ser assim, ninguém o ignora. Se não é feito assim, talvez seja porque outros e diferentes interesses se levantam. Porque outras e mais altas vozes se fazem ouvir. Ou escutar. Ou são ouvidas.


Parece haver alguns tipos de crime em relação aos quais a Polícia está a evitar reportar. Divulgar dados, números e contornos. A chamar a atenção. A alertar o cidadão para que este se possa precaver e evitar ser vítima de bandos criminosos. Repito, de bandos de criminosos. Que estão e continuam a actuar, impunemente, na capital do país. Trata-se de casos que, não tendo sido divulgados publicamente, foram reportados à Polícia. Que aconteceram. E, acontecerem á relativamente bastante tempo, como estão a acontecer no presente. Como estão a repetir-se no presente. São os casos de indivíduos que, em certas zonas da cidade, se atiram contra viaturas em movimento. E que simulam terem sido atropelados. A partir daí, choram e clamam por socorro. Simulam fracturas múltiplas. Umas vezes nas pernas. Outras nos braços. Outros, contusões no tórax. Querem ser, todos eles, transportados até ao hospital na viatura que dizem os ter atropelado. Mas, não sós. Na companhia de amigo pedestre que, entretanto, chega local. Ou de amigo que, por “acaso” passava na sua viatura. Quando descoberto no Hospital, se aí consegue chegar, o vigarista ensaia a fuga. A Policia sabe que está a acontecer assim. Sabe e tem provas de vários casos protagonizados pelo mesmo indivíduo no espaço de poucos dias. Em diferentes pontos de Maputo. Sabe que um mesmo indivíduo simulou ter sido atropelado num espaço de poucos dias. Terá registos das ocorrências. Se fez alguma coisa para o neutralizar, será segredo policial. Como sempre acontece. Que fez coisa nenhuma para evitar possíveis novas vítimas, fez. Quer dizer, não fez. Mas, para além de não ter feito, como habitualmente não faz, ou faz mal, evitou alertar o cidadão para os novos processos utilizados pelos criminosos. Daqui resulta, em último, que todos nós somos potenciais alvos dos criminosos.

domingo, outubro 12, 2008

Assim haja vontade

A corrupção não é fenómeno típico nacional. Moçambicano. Existe por aí. Existe pelo mundo fora. Embora revestido ou vestido com as mais diversas e diferentes roupagens. As mais diversas formas de camuflagem. A corrupção, pode ser comparada a uma hidra. Está e vive onde há dinheiro. Começa onde há dinheiro. Acaba quando acaba o dinheiro. Mas, como dinheiro nunca acaba, apenas muda de mãos ou de local, ensaia transformação. O que se passa no sector das estradas, pode ser apenas um caso. Talvez exemplar. Como parece ter confirmado a 7ª Reunião Anual da Associação dos Fundos de Manutenção de Estradas em África. Esta semana realizada em Maputo. E, no decorrer da qual terá havido consenso entre os participantes que a corrupção nos concursos públicos para obras de manutenção de estradas constitui uma séria ameaça para as economias de muitos países africanos por conduzir ao descaminhos de elevadas somas do erário público. (Notícias de 8 do corrente). E, a local adianta que uma das propostas apresentadas vai no sentido de os países africanos simplificarem os procedimentos que regem a gestão dos concursos públicos, o que pode ser alcançado através da redução do número de pessoas envolvidas tanto na negociação como na celebração dos contratos. Acreditamos e aceitamos que a proposta tenha sido elaborada por sábios. Só que os tais procedimentos, muitas das vezes, são impostos pelos doadores. E, havemos, também, de reflectir que entre os doadores não há sempre nem só homens puros, Honestos, Também os há com as suas fraquezas. Com os seus fracos pelo dinheiro. Quer dizer, menos sérios, menos honestos. Talvez, até e em última análise, desonestos. Corruptos.


Em termos de corrupção e de desvios de dinheiro do Estado, continuamos sem motivos para alegria nenhuma. Muito pelo contrário. Primeiro, foram as detenções relacionadas com o chamado “Caso dos 220 milhões do MINT”. Até ao presente sem grande evolução. Depois, agora, muito se escreve sobre a forma de gestão da empresa Aeroportos de Moçambique. A serem verdadeiros os dados e os números divulgados, estamos perante um escândalo. Mais um. Envolvendo, neste caso, figuras que se consideravam de reputadas. Acima de qualquer suspeita. Figuras a que alguns chamam de colunáveis. Possa acontecer, por hipótese, que paguem para o ser. Ou o parecer ser. Mas, isso, até pouco importa. Serão questões menores. A questão de fundo, é muito outra. É a de saber o destino a ser dado aos bens que possam ter adquirido com o dinheiro que constitui motivo de detenção. É a questão de saber se, acaso condenados e depois de cumprida a pena, continuam na posse e beneficiar dos bens adquiridos com dinheiro obtido de forma ilegal. Ou se, pelo contrário, quando comprovado o desvio de fundos, esses bens revertem para o Estado. De resto, já é tempo de se investigarem muitos sinais exteriores de riqueza. Capacidade para tanto parece existir. Assim haja vontade.

domingo, outubro 05, 2008

não podemos viver na ambiguidade

O país que somos, parece viver sob a lógica da contradição. Ou sob o síndroma da contradição. Talvez nem seja o país. Não o é. Com toda a certeza. Será apenas uma parte do país. Uma parte pequena. Talvez ínfima. Digamos que a elite. Mas, muito provavelmente, nem ela. Nem toda ela. Que seja, então, apenas uma parte dela. E, uma parte da parte que lê e escreve para jornais. Que se pode fazer ouvir nos audiovisuais. O que leva a ter de colocar a questão se. E, se, como. Ou seja, se essa minoria, se esses tantos poucos, possui capacidade para exercer influência, para influenciar os outros. Para influir na maneira de pensar dos outros. Não só na maneira de pensar. Também na maneira de agir e de se comportarem. Trata-se de um exercício difícil de resolver. De solucionar. O que não significa que não possa ser resolvido. Ou que não tenha solução. Em teoria, nada é impossível. Em teoria não há impossíveis. Da mesma forma que havemos de reconhecer que quanto sabemos e conhecemos, resulta de descobertas. Não de invenções. De descobertas do existente e, até então, por descobrir. Amanhã, depois, poderá ser diferente. Até ao presente, até ontem, foi assim. Foi convencionado que devia ser assim.

Temos o raro condão, talvez o mérito de desejar, de pedir, hoje, o que recusamos amanhã. Possa até nem ser mérito. Possa ser demérito. Hoje, clamamos pelo combate à corrupção. Dizemos que queremos saber quem se apropriou de bens alheios. De bens e de dinheiro do Estado. Em proveito próprio. Amanhã, quando nos apresentam nomes, dizemos não. E, se facto são esses os supostos, deixem-nos em liberdade. Parece ser o que está a acontecer. Parece ser o que se está a passar perante a detenção de uma dezena de funcionários do Estado. Não de um estado qualquer. Do nosso Estado. Que parece estar a provocar alguma intranquilidade. Algum receio, algum medo. Não questionamos. Parece que se perdeu a capacidade de raciocínio. Ninguém pergunta, ainda ninguém perguntou, quantos postos de saúde ou quantas salas de aulas podiam ter sido construídos com o dinheiro desviado. Quantas motas e quantos carros, quantos sistemas de comunicações ou quantos pares de fardamento poderiam ter sido adquiridos com o dinheiro desviado. Até prova em contrário, parece ter havido desvio de dinheiro do Ministério do Interior. Quem desviou ou quem não desviou, é outra questão. De concreto, sem possibilidade para desmentido, é ter havido desvio de fundos do Estado. Perante esta realidade, coloca-se uma segunda. Que é a de não se acreditar na Justiça quando não tenta fazer Justiça. E de não se acreditar na Justiça quando tenta fazer Justiça. Estamos, sem dúvida, perante uma contradição. Que não é aparente e pode ser resultante de conflitos de interesses. Ou de acções programadas de desinformação. O que parece claro e concreto, é que não podemos viver na ambiguidade.

domingo, setembro 21, 2008

a lógica do poder do soberano

Em edições da semana passada, pelo menos dois semanários dedicaram largos espaços ao tráfico. De pessoas e de drogas. Trata-se, como se sabe, de negócios milionários. Que datam de há muitos anos. Que têm raízes no tempo. E, da forma que questionam o que questionam, os semanários também podiam questionar mais. Podiam questionar, por exemplo, sobre o negócio do urânio enriquecido. Como podiam, também e noutra eventualidade, interrogar sobre a venda de motores de aviões e de helicópteros soviéticos. E, isto, apenas para sublinhar que o nosso país pode ser uma plataforma, uma placa giratória de negócios ilegais muito mais ampla do que aquilo que parece ser. Em relação aos dois textos dos dois semanários, uma coisa parece clara. Ambos apresentam dados, números, nomes de traficados e de possíveis traficantes. Ambos constituem um libelo acusatório. Pior. Ambos os textos, ambos os trabalhos jornalísticos, ao que se lê, terão sido elaborados, pelo menos em parte, com base em informações fornecidas pela investigação policial. Com base em dados fornecidos por quem o dever de investigar. E, de prevenir e de punir o crime organizado. Através de um trabalho profundo.


Possa ou não parecer repetitivo, é importante voltar a reflectir. Os negócios de seres humanos e de drogas podem colocar em questão a segurança do Estado. E, isto é apenas uma repetição do escrito em anterior. Por muito que possa parecer maldade, talvez seja apenas desconhecimento. A questão, a verdadeira questão, a questão de fundo, é que o Estado não está a fazer nada para se defender. Para se proteger das investidas das mafias do crime organizado. O nosso Estado parece estar a ficar cada dia mais frágil. Por vontade própria. Ou por vontades pessoais de alguns dos seus agentes. Para depois, por fim, nos virem dizer que de nada sabiam. Só que as coisas não são assim. Nunca foram assim. Possivelmente, nunca virão a ser assim. A segurança do Estado não é uma questão de nacionalidade. Nem de cueca. A segurança do Estado não assenta, unicamente, na Lei. O conceito ultrapassa a Lei. Vai para depois de Lei. Em termos práticos, necessita de legitimidade. Assenta na necessidade de uma lógica que possa dar legitimidade à Lei. E, essa lógica, só pode ser a lógica do poder do soberano.

domingo, setembro 14, 2008

um negócio ilegal

Temos e vivemos num país que tem tendência para esquecer. Para o esquecimento. Óbvio é, que país não tem aqui o significado de espaço geográfico. Nem de território. Vai para além destas duas e de possíveis outras mais definições. País, aqui, são gentes, pessoas, homens e mulheres. Que ocupam e habitam esse território. Esse espaço geográfico. Moçambique, portanto. Ora, quando se diz que são os homens e as mulheres, não significa que estejamos perante um dado absoluto. Que sejam todos os homens e todas as mulheres. Não. Serão apenas uma parte do todo. Uma parte de todos os homens e de todas as mulheres. Mas, o que parece importante, é tratar-se da parte do todo que não devia esquecer. Que parece ter por dever não esquecer. Mas que por motivos não conhecidos, não esclarecidos, tende em tentar conduzir-nos para ou ao esquecimento. A tentar apagar das nossas memórias individuais o que devia ser motivo de investigação e de esclarecimento. Público. Cabal e convincente. Como já deve ter sido entendido, estamos a falar de casos recentes. Oficiais e públicos. Primeiro, dos jovens trazidos do norte para o sul do país. Transportados em condições desumanas. Para estudarem, cá no Sul. Depois, das jovens que uma tal de Diana fez transportar desde a Praia da Costa do Sol até à África do Sul. Onde terão sido internadas em bordéis. Por último, mas não necessariamente por fim, também nos foi dado a conhecer a situação de cerca de duas dezenas de jovens moçambicanos. Que viviam numa vivenda da cidade de Maputo. A expensas de cidadãos turcos. Que residiam ilegalmente em Moçambique. Que haviam entrado ilegalmente no país. Com naturais e indispensáveis cumplicidades locais. Ora, são todos estes casos recentes. Mas não esquecidos. E que, por questões de ética e de moral, importa não esquecer. Mas, também e sobretudo de soberania. E, de segurança do Estado.

Mais recentemente, foi noticiado que “Cinco menores terão sido raptados para a RAS” e que “Uma sexta criança conseguiu escapar de um mini-bus que as transportava” (Notícias de 10 do corrente). Neste, como em caso anterior, a denúncia dos raptos parte de uma das vítimas. Que terá conseguido escapar aos raptores. Segundo a versão da Polícia. Ao que parece, ao que se sabe, em nenhum dos casos terá havido investigação jornalística. Nem investigação independente. Para investigar este novo fenómeno. Que bem pode ter algo a ver a realização do Mundial de Futebol de 2010 na África do Sul. E que bem pode vir a transformar Moçambique num reservatório de prostitutas. Hoje, são suficientemente conhecidos os métodos e os processos pelos quais dezenas de crianças e de jovens oriundas de vários países, da América Latina, da Europa e de África entram em Espanha. Sobretudo raptadas na Nigéria e com recurso à feitiçaria, para as manter submissas. Recurso primeiro e último das mafias. O rapto de menores, de crianças, para os mais diversos fins, é, hoje um fenómeno universal. Um fenómeno que não pode ser tratado de forma ingénua. Por detrás do rapto de um criança, está sempre escondido um negócio, E, um negócio ilegal.

domingo, setembro 07, 2008

Pensar e decidir diferente é direito fundamental

Desde há muitas décadas, que Moçambique se firmou como importante produtor de tabaco. De diferentes variedade. E, para além de produtor de tabaco, fabricante de cigarros. Com fábricas pertencentes a diferentes grupos económicos. Cada um disputando o crescente mercado interno e os mercados externos, com as suas diferentes marcas. Algumas das quais o tempo viria a tornar afamadas. Para além das fronteiras nacionais. Depois, terá sido o ocaso, como que um período de hibernação. O tempo, os tempos terão ditado uma nova ordem. Que ditado desde a falência, à morte, à resistência e ao ressurgimentos de plantações e de fábricas. A novos processos e a novas formas de produção de tabaco para o mercado interno e para a exportação. Com significativo peso, com não menor impacto social. No que respeita à criação de postos de trabalho e na melhoria das condições sociais e de vida de significativos segmentos da população. De uma população que se dedica à produção do tabaco e à sua transformação. Seja para o abastecimento da indústria nacional de produção de cigarros seja para a exportação. Hoje, como desde sempre o foi, em Moçambique, a produção de tabaco é uma cultura de rendimento. Uma cultura legal. Acarinhada e apadrinhada ao mais alto nível da governação.

O suplemento à última edição do “Magazine”, dá a conhecer vários aspectos da produção de tabaco em Moçambique. Da produção e exportação de tabaco por uma empresa sediada em Moçambique. Mais precisamente em Tete. E, os dados estão todos lá. São públicos. Vão desde os números de produção total de 1997 a 2008, que aumentaram mais de dez vezes. Como mostram os parciais e o total de trabalhadores que se beneficia da produção e da actividade transformadora do tabaco. Directa ou indirectamente. Não obstante esta realidade, para além desta realidade, que é a de uma cultura de rendimento que deveria ser incentivada, parece termos voltado a parar no tempo. A parar no tempo para defender interesses estrangeirados. Interesses que em nada têm a ver com a melhoria de vida do camponês, do agricultor moçambicano. Nem do cidadão, no geral. Desde aí, desde este servilismo, desde este vergar da espinha dorsal, foi menos de um passo. Nem chegou sequer a ser meio passo. E, um passo na direcção da falta de respeito e da violação dos direitos dos fumadores. Fumar, é um direito dos fumadores. Com a condição única de não importunarem e de não incomodarem quem não é fumador. Para tanto, deve o Estado regulamentar Lei que decidiu aprovar. Mas, até ao momento, assim não procedeu. O Estado, como pessoa de bem, como assim se pretende, não tem o direito de proceder por forma a como pretende proceder. Ou, como procede. Fumar, tomar café, tomar chá, beber refrigerantes, comer bolos, são, no essencial, direito dos cidadãos. Sejam ou não, todos eles, consumos que provocam hábito e habituação. Logo, vício. E, são. São todos eles produtos que provocam o vício do consumo. Com maior ou menor perigo para a saúde do cidadão. Ora, neste contexto, punir e penalizar, única e exclusivamente o fumador, é uma atitude extrema. Uma atitude de extremosa direita. O país real, o país que vota, o país que irá votar não se conforma nestes limites. De extrema e da extremosa direita. Que parece querer ter o direito de pensar e de decidir pelos outros. Por nós outros. Nesta como em variadas outras questões. Pensar e decidir diferente é direito fundamental.

domingo, agosto 24, 2008

um escândalo nacional

Trata-se de um fenómeno universal. Como o da fome. Aquilo que as crianças aprendem, nos primeiros anos de vida, em casa, com a família, esquecem. Quando entram na escola. A escola, quando a criança aí chega, providencia-lhe como que uma lavagem ao cérebro. Tenta apagar o que ela sabe. E, não dá continuidade ao seu saber e ao seu saber fazer. Não incentiva as suas tendências. Não procura valorizar nem investigar o que a criança tem de diferente. Nem de melhor. E, incentivar a diferença. Valorar e valorizar a diferença. Não. O que a escola tenta fazer, o que a escola faz com exemplar mestria, é mediocrizar. Mediocrizar o diferente, mediocrizar o génio. Fazer baixar o génio ao nível do sofrível. Quando não ao nível do medíocre. Por isso ou para isso, servem os planos e programas de ensino objectivamente medíocres. Neste campo, Moçambique pode não ser apontado como pioneiro. Mas, é exemplo. De resto, ao que se diz, latim e português arcaico a ninguém aproveitam. Como se diz que a criança, o estudante moçambicano é forçado a decorar matérias de valor nenhum e de utilidade nenhuma. Na sua vida prática. Por isso, assim parece, os resultados estão à vista. Acresce, que não se incentivam vocações nem o gosto pelo trabalho. Por uma profissão ou por uma carreira. Criam-se e alimentam-se, isso sim, mentalidades distorcidas. Daí, o síndroma do diploma. Pelo chamado canudo. Que as universidades, principalmente as públicas, têm o dever de ser as primeiras a combater.

Com “Resultados péssimos”, o “Notícias” de 15 do corrente titulava a sua principal local, referindo-se aos exames extraordinários. E, acrescentava que “Dos 44.525 avaliados da 12ª classe, apenas 21 por cento foi aprovado. Ao que parece, aqui, não estamos perante um desastre ou uma calamidade natural. Estamos, isso sim, perante um escândalo. E um escândalo, só, e só, nacional. Porque é escândalo nacional que, desses mais de 44 mil estudantes adolescentes e adultos, apenas pouco mais de nove mil tenham obtido notas para passar de ano. Quer dizer, de forma clara, os nossos impostos, os impostos que pagamos ao Estado, estão a ser mal geridos. Estão a ser geridos de forma manifestamente incompetente. E, perante a realidade dos números, importa tirar uma conclusão. De entre várias e muitas hipóteses possíveis. A primeira, é de que os estudantes não estudam. Que vão à escola apenas por ir à escola. A segunda, é a de que os programas de estudo não estão adequados à realidade nacional. A terceira, é a de que os professores não estão capacitados para ensinar as matérias que devem ensinar. Objectivamente, sejam quais possam ser as causas de um tão elevado número de reprovações, estamos perante um escândalo. E, este é um escândalo nacional.

domingo, agosto 17, 2008

os nossos interesses são os interesses do camponês moçambicano

Desde há muito anos que se fala na perda de parte da produção agrícola pelos camponeses. Quer dizer, os camponeses produzem. E, produzem para além das suas necessidades alimentares. Para além das suas necessidades alimentares básicas imediatas. Mas, depois, não possuem nem meios nem conhecimentos para conservar por longos períodos o excesso da sua produção. Seja ela qual seja. Assim como não conseguem fazer chegar esses seus excedentes agrícolas a outras e diferentes zonas do país. Seja devido à ausência ou ao mau estado das vias de circulação. Seja por motivo da falta de meios de transporte. Seja, ainda, que para além de uns e de outros, o preço do mercado é baixo. O preço no mercado de destino não compensa, não paga, não suporta os custos da produção. Por este e, provavelmente, por outros motivos, em algumas regiões do país há produção em excesso. E, que se estraga. Em outras, poderá haver fome. Há mortes devido à fome, em certas regiões do país. O que indicia estarmos perante um processo distorcido. Se assim, produzir mais, aumentar a produção é igual a perder mais dinheiro. Em termos de matemática, a lógica do camponês é inatacável. Por estes e, provavelmente por outros motivos, em algumas regiões do país a produção agrícola pode reduzir. Estamos, ao que parece, perante realidades antagónicas. O mercado, como todos o sabemos, não é perfeito. Logo, cabe ao Estado assumir o papel de regulador. Cabe ao Estado, seja através da garantia do preço de compra ao camponês, seja através de subsídios ou de isenções possíveis, tornar o preços dos produtos agrícolas competitivos e que compensem o esforço do camponês nacional.


A perda de excedentes agrícolas nacionais, situa-se em números alarmantes. Segundo o jornal “Notícias” (13 de Agosto corrente), o país perde, anualmente, um milhão de toneladas de comida. Produzida internamente. Com muito esforço. E, por certo, muito sacrifício. Esta quantidade de comida perdida representa cerca de 40 por cento da produção total do país. E do trabalho e do esforço de cerca de 3,7 milhões de camponeses. Trata-se, como se pode verificar, de números impressionantes. Talvez, até, chocantes. Mas que sendo verdadeiros, e tudo indica que sim, nos transportam para outra realidade. Ou, se assim se preferir, para uma outra dimensão da realidade nacional. A de que o problema de Moçambique não é um problema de produção. Que o problema da eliminação da fome não assenta, unicamente, no aumento da produção agrícola. Tem outros vectores, não menos importantes. O primeiro, passa por eliminar o conceito negativo de combate à pobreza. E criar e alimentar o conceito positivo de criação de riqueza. É que todos queremos ser ricos. Pelo menos queremos, hoje, viver melhor do que vivíamos ontem. Através do trabalho honesto. O segundo, é o que de parece esgotada toda a falácia que por aí se houve em nome do camponês. Que é tempo de deixar de se falar em nome do camponês. Para dar a palavra ao camponês. Em substituição do tempo de palavra que se dá, em salas com ar condicionado, a representantes de OGN´s. A que, como todos sabemos, o camponês não tem acesso. Nem, ao que se saiba, alguma vez manifestou interesse em ter. Este dualismo, esta dualidade, implica, obrigatoriamente, uma decisão. Que pode ser dolosa para quem tem o poder e o dever de decidir. Para decidir se opta pela continuação de projectos dispersos ou pela execução de um plano nacional. Que convenha aos interesses nacionais. Tenhamos que ao discurso de ocasião, se sobrepõem os interesses nacionais de longo prazo. Aqui residem os interesses do camponês nacional. E, os nossos interesses. Porque, os nossos interesses são os interesses do camponês moçambicano.

domingo, agosto 10, 2008

A “revolução verde” implica a participação do camponês

Por vezes, por dias, em certas ocasiões, parece difícil escrever. Se escrever significa dizer coisas novas, diferentes, originais. Então, se não há, se não existe essa disposição, se não há essa capacidade, resta recorrer a quem sabe mais. A quem viveu, estudou e investigou. Mais. É o caso do repórter polaco Ryszard Kapuscinki, falecido no início de Janeiro de 2007. Do muito que escreveu, principalmente sobre África, conheci, li agora “Os Cínicos Não Servem Para Este Ofício – Conversas Sobre o Bom Jornalismo”. A primeira edição em língua portuguesa tem a chancela do Relógio D´Água, e é datada de Fevereiro de 2008. O curioso, talvez o mais curioso, é que tratando de um livro sobre jornalismo, também é um livro sobre África. Sobre os problemas de África. Ou de como o jornalismo, sobretudo o mau jornalismo, deforma a visão dos problemas reais de África. Ou, para ser mais claro e concreto, dos pobres de África. Ainda estamos na introdução ao livro a já Maria Nadotti escreve, em termos de dúvida. Talvez de provocação: Quem acredita na objectividade da informação, quando o único relato possível é “pessoal e provisório” (pag. 18)


Em resposta a uma questão que lhe foi colocada, o repórter responde (pag. 74): A meu ver, o desaparecimento do mundo camponês do globo é um dos grandes paradoxos do mundo contemporâneo porque produzimos uma quantidade de alimentos cada vez menor para uma população em contínuo crescimento. A eliminação do mundo camponês é um fenómeno sócio-económico à escala mundial, consiste num acto suicida global. O meu campo é África e posso dizer que se trata de um processo tipicamente suicida a que a humanidade por vezes se abandona: o continente que tem cada vez menos alimentos e cada vez mais habitantes está a eliminar a classe camponesa e está a fazei-lo muito rapidamente. Com efeito, uma grande parte da humanidade vive das ajudas, e com estas ajudas que estamos a enviar para o Ruanda e para outros países, estamos a criar uma situação trágica: uma classe parasita de refugiados à escala mundial, que são afastados das suas aldeias, dos seus campos, do seu gado, colocados nos campos de refugiados e alimentados pelas organizações mundiais – muitas delas são completamente corruptas – onde vai parar o nosso dinheiro e os nossos impostos. E, mais adiante: Estamos a criar, através deste louco mecanismo das chamadas organizações humanitárias, um problema enorme para a humanidade, eliminando a classe camponesa e tornando a classe camponesa cada vez mais dependente da burocracia das chamadas organizações humanitárias. Talvez seja útil acrescentar que durante os últimos 5.000 ou 7.000 anos de história escrita vivemos uma única história, que criámos e na qual participámos. Mas desde o desenvolvimento dos meios de comunicação, na segunda metade do século XX, estamos a viver duas histórias diferentes: a verdadeira e aquela criada pelos meios de comunicação. O paradoxo, o drama, o perigo residem no facto de que conhecemos cada vez mais a história criada pelos meios de comunicação e não a verdadeira. Por isso, o nosso conhecimento não se refere à história real, antes à história criada pelos meios de comunicação. O que, concluamos, sendo verdade é mau. É péssimo. Quando estamos, como estamos, como se terá percebido que estamos, a elaborar sobre a “revolução verde”, parece importante deixar claro dois aspectos: O primeiro, é que a “revolução verde” nunca poderá ter sucesso através da simples repetição do discurso do Presidente da República. Primeiro, pelos governadores provinciais. Depois, pelos administradores. E, por aí em diante. A “revolução verde” não se faz, nunca haverá de ter sucesso, através da repetição mecânica do discurso do chefe. Não se faz, nunca poderá ser feita, em nome do camponês. A “revolução verde” implica a participação do camponês.

domingo, agosto 03, 2008

os erros políticos podem ter custos eleitorais

Os números são impressionantes. Para não dizer preocupante. E foram revelados ao Presidente da República. Durante a sua recente visita a Tete. Só nos primeiros meses de 2008, terão sido detectados cerca de 1.500 migrantes ilegais. Na província. Provenientes de onze países de África e da Ásia. Extrapolando os dados, mas sem especular. Muitas mais centenas de ilegais devem ter entrado no país por outras fronteiras. De outras províncias. Muitas outras centenas de ilegais podem estar a viver em Moçambique. Convindo que os motivos para essa vinda, para esse atravessar clandestino das nossas fronteiras, não foram motivos de ordem política, impõe-se uma reflexão. Séria a profunda. Realista. Não política. Por forma a saber e a saber-se se estes ilegais constituem ou não elemento destabilizador da sociedade moçambicana. A nível social. Mas, também, económico. Sabemos, por ser público, que muitos dos ilegais se entregam à exploração de ouro, de pedras preciosas, de diamantes, de madeira. E ao seu contrabando. Não punir, não sancionar quem nos rouba, quando se conhece o ladrão, é perigoso. É abdicar do Poder. É abdicar do Poder do Estado. E, em alguns momentos, o Estado parece estar a abdicar do seu Poder. Parece manifestar o receio de ser e de ter de ser Estado. Ora, o poder do Estado emana, sempre e em última análise, do Soberano. Quem manda no Governo, quem coloca e mantém o Governo é o Soberano.


Na cidade de Maputo, cidade capital do país, capital da República, a violência criminosa parece ter adquirido novos contornos. Parece ter atingido novos patamares. Mais elevados e mais sofisticados patamares. Perante a passividade policial. Perante uma preocupante passividade policial. Perante a inércia policial. Ao que se sabe, ao que é público, estamos, hoje, perante crimes selectivos. Estaremos perante raptos para extorquir dinheiro. Estamos perante raptos de pessoas supostas de ter poder económico ou político. Estamos perante aquilo a que, em qualquer parte do mundo, se chama de terrorismo urbano. E estamos, também, na realidade, perante polícias que para combater esta nova forma de crime têm ideias poucas. Mais exactamente, ideias nenhumas. E que sequer nos dizem, que sequer nos aconselham, por não saberem ou por não quererem dizer, que cuidados devemos tomar. Quando andamos a pé. Quando estamos a conduzir uma viatura. Que cuidados devemos tomar para não sermos alvos dos bandos criminosos. A quem devemos telefonar. A quem devemos pedir ajuda. E, como. O crime organizado tem, hoje, ao seu dispor todos os novos meios de comunicação. As polícias poderão ter nem tanto. Mas, ao que parece, fizeram opções erradas. Traçaram objectivos errados. Estão muito preocupadas com o combate ao vendedor de esquina, ao vendedor do informal, e negligenciaram o apetrechamento para o combate ao crime organizado. O que pode ter sido um erro político. E os erros políticos podem ter custos eleitorais.

domingo, julho 27, 2008

Fica a dúvida se nem sempre o que parece é

É facto que nem sempre o que parece é. Que não é suficiente parecer para ser. Que pode parecer e não e não ser. E que pode ser sem parecer. . Ou ser e não parecer. Assim, ser e parecer, serão questões distintas. E, sem serem opostas também não serão afins. Confluentes ou coincidentes. Apenas distintas. Talvez, até, independentes. A questão que se coloca, a questão que fica por saber, é se o muito parecer pode indiciar ser. Se a repetição constante do parece, pode indiciar o é. O que é. Se o tanto parecer, indicia camuflagem e máscara. E subterfúgio do é. Neste caso, nesta preposição, o é antecede o parece. O é, é. Tem existência própria. Existe. Antes, depois e para além de. Ao contrário, o parece será a visão subjectiva do é. Subjectiva e à posteriori. Sem se aceitar que existe um é, não será possível afirmar que nem sempre o que parece é. Ou, que não é. Independentemente de parecer ou de não parecer, o é não permite alternativas. Não há alternativas ao é. Ou é, ou não é.


Ele há inquéritos e há inquéritos. Há investigações e há investigações. Que podem, muito bem, ser todos magistralmente conduzidos. E, tecnicamente exemplarmente realizados. Honestos e intocáveis nos planos da ética e da moral. Mas cujas conclusões, em alguns casos, nos trazem muitas dúvidas e deixam certeza nenhuma. Que não nos trazem nenhuma tranquilidade. Estamos a falar sobre casos concretos. Sobre casos reais e concretos. E recentes. Primeiro, do caso dos jovens que vinham do norte para o sul do país. A pretexto de virem estudar. Transportados num camião. Sem um mínimo de condições. Ou em condições desumanas. Depois, foi o grupo dos outros tantos jovens. Que viviam no Bairro do Triunfo, cidade de Maputo. Que o Tribunal comprovou terem sido maltratados por dois cidadãos turcos. A viverem ilegalmente em Moçambique. Agora, por fim ou por agora, há o caso dos oito cidadão indianos a trabalharem ilegalmente no país. Suspensos pelo Ministério do Trabalho (Notícias de 22.07.08.). Coincidência ou não, factor comum a todos os três casos, é o de se tratar sempre de homens. Coincidência ou não, é o facto de aos três casos aparecer associado o nome da Associação Muçulmana de Moçambique. Com uma participação pouco clara e, nunca devidamente esclarecida. Nem desmentida. Fica a dúvida se nem sempre o que parece é.

domingo, julho 20, 2008

A violência institucional só adia a resolução dos problemas sociais

Tem vindo a ficar claro, ao longo dos últimos anos. Um pouco por todo o país, principalmente em alguns dos maiores centros urbanos, existe uma grande antipatia pelos vendedores informais. Em especial, pelos chamados vendedores de esquina. A nível da cidade de Maputo, essa antipatia é visceral. É fanática. É mórbida. Nunca terá sido colocada em questão a origem dos produtos e artigos em venda. Ao que parece, pouco importa se se trata de produtos e artigos roubados. Ou não. O problema, ao que parece, pelo que se pode ver, está no espaço ocupado na venda. E pelos vendedores. Em abono da verdade, já assistimos, em diferentes artérias de Maputo, a cenas chocantes. Repugnantes. Nojentas. Em que agentes da chamada Polícia Municipal se limitam a retirar produtos dos passeios para cima de viaturas em que se fazem transportar. Sem passarem recibo os produtos apreendidos. Sem qualquer explicação, verbal que seja, para a sua atitude. Para, depois, arrancarem a alta velocidade. Para, depois, arrancarem a alta velocidade. Perante o olhar surpreso, perante o desespero dos vendedores. Normalmente vendedoras. Algumas com crianças pequenas nas costas. Perante, repita-se, a impotência perante a ilegalidade e a injustiça. A prepotência.

Maputo é, hoje, uma cidade que alberga, muito provavelmente, mais de dois milhões de seres humanos. Muitos, vivendo na pobreza. No limite da pobreza. Sem emprego e sem trabalho. Sendo que emprego é, hoje, um bem cada vez mais raro. E, trabalho nem sempre é fácil conseguir. Face ao dilema que se lhes coloca de como sobreviver, a solução mais fácil, mais imediata, mais ao seu alcance para sobreviver, é a de comerciar. Comprar aqui por dez, pedir quinze ali, vender por onze ou doze mais além. Se assim, teve sucesso, registou lucro. Em termos de lógica, quantas mais operações simples, digamos simplórias, o vendedor realizar, maior o seu lucro diário. E, menor será o sofrimento da fome. Há muitos países, um pouco por todo o mundo, com os mesmos problemas de desemprego que o nosso enfrenta. Aí, foram criadas condições para vender nos passeios e em muitos outros locais públicos. O recurso e o apoio à utilização de bancas tipo “harmónio” ou tipo “tesoura”, teve sucesso. Falamos de bancas leves e flexíveis que os vendedores levam consigo, ao fim de cada dia, juntamente com os artigos não vendidos. Perante uma realidade mundial de falta de emprego, tem havido uma preocupação de evitar convulsões sociais. Entre nós, parece continuar a haver alguma dificuldade em compreender os fenómenos sociais. E, assim, que se continue a recorrer à repressão e à violência. Exemplo acabado dessa falta de compreensão e de entendimento, é o posicionamento do comandante da Polícia Municipal da Cidade de Maputo. Que segundo o jornal “Notícias” (edição de 10 de Julho) vai introduzir o uso da unidade canina, uma das unidades auxiliares para fazer face aos vendedores ambulantes (...). Parece oportuno deixar claro, que problemas de fome e de pobreza não se resolvem através da repressão nem da violência. Seja a violência humana, seja a violência policial ou canina. A violência não resolve os problemas sociais. A violência institucional só adia a resolução dos problemas sociais.

domingo, julho 13, 2008

Uma língua de combate e uma língua de ruptura

Tem vindo a alimentar alguma polémica. Digamos que esquentados monólogos, cá entre nós, o futuro Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. Hei de afirmar que, desde o início, desde o princípio da discussão sempre fui contra o dito. Ou, o maldito cujo. Este posicionamento manifestei, passam muitos anos, pessoalmente, a Luís Filipe Pereira. Primeiro negociador, primeiro negociante, moçambicano, do desditoso. Ou, do malditoso. Aquando, depois do seu regresso, logo após haver retornado da pátria do “Tira Dentes”. Onde, algures, tiveram lugar as primeiras conversações. Ou, talvez e por melhor dizer, as primárias negociações para unificar a ortografia da língua que todos nós falamos. E, escrevemos. Uns bem, outros mal. Outros, nem bem nem mal. Talvez a maioria. Dizer aqui, sem receio de desmentido, que uma língua pode ser língua de unidade nacional. No interior de um país. Onde está em processo a construção de uma nação. Mas que uma língua não é, nunca foi e, por hipótese, alguma vez haverá de ser instrumento de unidade entre países separados pela geografia. Distante no espaço, dispersos pelos continentes. Por tudo quanto é continente.


Em termos de presente, terei de dizer, com toda a humildade, que mudei de ideia. De ideias. De opinião. Depois de ter lido na última edição do “Magazine” o texto com o título “Este combate não é nosso”, concordei. E, disse de mim para mim, possivelmente lavrando em erro, que se o combate não é nosso estaremos perante um vitória sem adversário. Porque, ao que se sabe, não houve reunião ou seminário, restrito ou alargado, sobre o dito, talvez maldito, Acordo. Para discutir, abertamente, as diferentes vertentes do famigerado Acordo. O que têm de positivo. O que têm de negativo. Provavelmente, serão até nenhumas. Muito provavelmente, e é aqui que parece residir o ridículo de toda a questão, a partir de determinada data os computadores deixarão de nos fornecer dois correctores de textos. Deixará de haver sistemas de correcção para português do Brasil e para o português de Portugal. Haverá, apenas um versão. O que para quem escreve, para quem apenas escreve, tem inconveniente nenhum. Mas, convenhamos, nivelar por baixo, é nivelar pelo medíocre. O Acordo, em si, nem é bom nem é mau. É pior. Não contém genes de unidade nem de unicidade. E aponta para a necessidade de uma ruptura, definitiva, da linguística e da linguagem dos povos de países que pretendem afirmar-se. Que pretendem construir nações. No contexto das lutas contra a opressão colonial, a língua portuguesa foi definida como língua de combate e de unidade nacional. Assim deve continuar a ser. Para além dos acordos espúrios que por aí se anunciam, a língua portuguesa deve continuar a ser língua de combate. Uma língua de combate e a língua de ruptura.

domingo, julho 06, 2008

haveremos de continuar a saber quem roubou vaca, cabrito, galinha ou pato

Dois processos de julgamento, que vinham decorrendo em tribunais da cidade de Maputo, chegaram ao fim. Com desfechos diferentes. No chamado “caso dos turcos”, os dois réus foram condenados. A um ano de prisão, cada. Por ter sido provado que haviam maltratado 17 jovens moçambicanos. Durante vários meses. À condenação, foi ajuntada uma indemnização. Monetária. O pagamento de uma indemnização a cada um dos molestados. Das vítimas. O pagamento de um valor pouco mais do que simbólico. Digamos, um valor irrisório. Quando, recordamos que tem diz ter vindo para ajudar afinal se entregou a hábitos e práticas que em nada têm a ver com ajuda. Muito menos ajuda humanitária. Ao tempo em que se escreve este texto, está por saber, ficam em aberto outras questões. Por exemplo, se os turcos irão ou não ser sujeitos a segundo julgamento. Por permanência ilegal em Moçambique. Assim como os motivos que levaram duas entidades, aparentemente, legais a terem solicitado os vistos de entrada dos turcos em Moçambique. É óbvio, neste campo não estamos perante matéria de Justiça. Ainda e neste momento. Mas perante a hipótese, a não excluir, de um caso de segurança do Estado. E segurança do Estado no sentido mais lato. Os já vários casos, públicos, de jovens moçambicanos recrutados para aprenderem o islão, aconselha a uma investigação profunda. Mais ampla. Profissional. Para se evitarem surpresas. E, para que ninguém, nunca mais, possa vir dizer que não sabia, Que não foi alertado.


O outro processo chegado ao fim, foi o do chamado “caso Albano Silva”. Aqui, a absolvição de todos os acusados foi o corolário lógico do que foi vindo a público. Como relato do que se estava a passar em sede de julgamento. Pese o facto de, a partir de determinada altura, ter sido posta a circular a versão sobre a possibilidade de os acusados poderem vir a ser condenados a pesadas penas. Uma versão sem sentido, sem lógica, não sustentável. Hoje, perante e depois do veredicto do juiz da causa, algo parece estar a ruir. Ou deveria estar a ruir. Muito embora, sendo que para ruir seja necessário existir. Primeiro. O que não existe não pode ruir. Logo, por fim, nada irá ruir. Porque não existe. É assim, parece ser assim, que, em termos de lógica, os ladrões de galinhas e de patos devem continuar a acautelar-se. A menos que não. Pode não. Caso estejamos a lavrar em erro. O que até seria bom. Seria que nos haveriam de vir dizer coisas outras e bem contrárias. Mais sérias. Que nos viriam dizer sobre a revisão ou a reabertura de processos anteriores. Mas conexos. A questão, está em saber se a alguém levanta, ou não, dúvidas o desfecho dos há muito julgados, e tentativamente empurrados para o esquecimento, “caso BCM” e “caso Carlos Cardoso”. E, como alternativa ou por oposição, a quem incomoda uma investigação séria e independente sobre a morte de Siba-Siba Macuácua. No nosso país, continua complexo separar os autores dos roubos, dos desfalque, do crime de colarinho branco, do comércio ilegal de drogas, do negócio de armas, do tráfico de influências. Dizer, afinal, quem é quem. Enquanto assim, e com o devido e merecido destaque informativo, haveremos de continuar a saber quem roubou vaca, cabrito, galinha ou pato.

domingo, junho 29, 2008

Temos o direito de exigir mais e melhor trabalho

Um pouco por todo o país, presidentes de Conselhos Municipais têm vindo a público fazer balanço do seu desempenho. Dizer o que fizeram. Dizer o que não conseguiram fazer. Isto, a pouco meses do final do mandato para que foram eleitos. Sobre Maputo, sem que o tenha sido dito, podemos dizer ter sido feito muito. Mas que muito há por fazer. Pode dizer ter sido feito e estar em curso trabalho de vulto em termos de reparação de vias de circulação, de saneamento, de fornecimento de água, de iluminação pública. Como pode dizer-se estarem longe de obter sucesso os esforços desenvolvidos para uma adequada e eficaz recolha do lixo, na disciplina na circulação do trânsito automóvel, principalmente no que diz respeito aos semi-colectivos e no enquadramento dos chamados vendedores de esquina. Mas, existem, também, aquilo a que poderíamos chamar de manchas negras. Uma, é a da destruição ou do desaparecimento do cadastro dos terrenos municipais. Outra, a actuação, tantas vezes desastrada ou desastrosa, da polícia municipal. Nas mais diversas situações. Mas e na generalidade contra cidadãos indefesos. Agora e por fim, o aparente uso excessivo e de força desnecessária para destruir uma construção no Bairro da Coop. Neste caso, admitindo que a actuação municipal possa ter sido legal, fica a dúvida se foi legítima. Se não, ou e se não, pode colocar-se a dúvida se em vez da solução do problema não estaremos perante a causa, ou as causas do problema. Dos muitos problemas por resolver.

Na sua última e recente visita à cidade de Maputo, em chamada presidência aberta, o Presidente da República ter-se-á apercebido de alguns conflitos. De conflitos entre governantes e governados. Muito provavelmente, muito possivelmente, de conflitos de interesses. Económicos, pois não. Daí o ter dado prazo aos senhores do Conselho Municipal para se sentarem à mesma mesa com os informais. E resolveram as divergências. Ao que parece, solução de consenso foi encontrada. Quanto à polícia municipal, actua em função dos poderes que lhe foram concedidos. Que tanto podem ser muitos como nenhum. Ninguém sabe. Também ninguém quer saber. Muito menos clarificar publicamente o âmbito da sua competência e da sua acção. Constitui o exemplo acabado do eu quero, posso e mando. Logo, da prepotência e da ilegalidade. Por fim, dizer que sobre a demolição do Splash, não há nada a dizer. Por mera questão de lógica. Pode, isso sim, comentar-se. Que foi desnecessário um tal aparato de força perante questão assim tão menor. Não fez sentido nem tem qualquer justificação. Não estamos, de certeza, no país de Mugabe em aparente desespero de causa. Mas estamos em ano de eleições em Moçambique. E, esta demonstrada falta de estratégia política pode ter reflexo nas urnas. Não foi para este tipo de espectáculo nem para esta demonstração de força gratuita e objectivamente desproporcionada que elegemos os actuais gestores da cidade de Maputo. Temos o direito de exigir mais e melhor trabalho.

domingo, junho 22, 2008

quem violou o código secreto e porque motivo

No mesmo dia, provavelmente quase à mesma hora, deveriam ter-se iniciado dois julgamentos em que Moçambique, como Estado, é parte interessada. Porque envolvem moçambicanos. Um dos julgamentos, deveria ter tido lugar em Tribunal de Pretória. O outro, em Tribunal de Maputo. Em ambos os casos, estão envolvidos jovens moçambicanos. No primeiro, raparigas. No segundo, rapazes. Em ambas as situações, haverá menores. Ou, se assim se preferir, a utilização de menores em práticas ilícitas. Ilegais. Aconteceu, porém, ambos os julgamentos terem sido adiados. Pelo mesmo motivo. Por motivos iguais. Seja que foi, falta de tradutores. Na África do Sul, terá sido a falta de tradutor de inglês para português o motivo, a razão do adiamento. Em Moçambique, em Maputo, o motivo, a razão do adiamento terá sido a falta de tradutor de português para turco. Não se duvida que, em ambos os caos, os Tribunais tenham agido em pleno respeito pela Lei. De cada um dos países, Mas, também podemos admitir a hipótese de se estar em presença de artifícios legais para adiar os julgamentos. Para fazer retardar os processos. Para tentar ganhar tempo. Com objectivos que só a alguns interessam. Mas, que não custa especular sobre quais possam ser. Contudo, só o devir, só o depois o dirá.


O caso dos cidadão turcos detidos em Maputo, parece ter chocado a opinião pública nacional. Talvez menos pelos turcos e mais pelos moçambicanos apresentados como vítimas. Mas além disso, para além do possível choque, deveria também alertar as autoridades. Para uma realidade que se repete. Para uma realidade que começa a repetir-se. Que começa a ser repetitiva. A partir ou com começo em Cabo Delgado. É neste contexto que a falta de tradutor para o início dos cidadão turcos parece pormenor. Apenas pormenor e irrelevante. Importante, isso sim, afigura-se a questão de conhecer os verdadeiros objectivos da vinda e fixação dos turcos em Moçambique. Ao que se diz, inicialmente quatro. Um, terá morrido. Outro, terá ido. Logo, ficaram dois. Importante, repita-se, será esclarecer como vieram e como chegaram. Como e com que documentos entraram no país. De quem é a casa onde viviam e quem lha alugou. Quanto e a quem pagavam o arrendamento. Quem pagava imposto ao Estado sobre o aluguer. Donde provinha o dinheiro para subsistirem e sustentarem os 17 jovens com quem viviam. E conviviam há cerca de dois anos. Como e em que língua se comunicavam com esses mesmos jovens. Depois, tratando-se de jovens entre 10 e 17 anos, parece pouco crível estarmos perante caso de pedofilia. Parece mais adequado falar em sodomia. Pergunte-se, ainda, como é que indo esses jovens frequentar, todos os dias, escolas públicas nunca lhes passou pela cabeça abandonarem o local onde eram maltratados e violentados. Denunciar as condições em que viviam. Ou, sendo tantos e, alguns, em idade adulta, qual o motivo que os impediu, em caso extremo, de passarem de agredidos a agressores. Competindo, agora, ao Tribunal julgar, cabe também ao Tribunal esclarecer. E, entre os vários aspectos a esclarecer está o de saber se estamos perante um caso de cativeiro, de cárcere consentido ou não. Quais eram as regras que regulavam as relações entre dominadores e dominados. Qual o código ou as regras secretas que ambas as partes haviam assumido respeitar e uma deles violou. Em síntese, quem violou o código secreto e porque motivo.

domingo, junho 15, 2008

mentir e fazer mentir é feio

Desde que foi divulgada, a situação interna no Instituto Nacional de Segurança Social já fez correr muita tinta. Em tudo quanto é órgão de Informação escrita. E muita mais tinta poderá e deverá fazer correr. Só assim irá saber-se quem é quem em todo o processo. Quem desviou dinheiro. Quanto dinheiro, exactamente, foi desviado. E, como e quem irá responsabilizar-se por repor o dinheiro desviado. Dinheiro que, diga-se, é produto da contribuição de muitos milhares de trabalhadores. E, das respectivas empresas empregadoras. Terá feito bem, terá procedido correctamente a Primeira Ministra quando, há dias, veio a público com um discurso que pretende tranquilizador. Ao anunciar a realização de uma nova auditoria ao INSS. Auditoria essa, incumbida a departamentos especializados do Ministério das Finanças. E que, em nosso modesto entender, deverá ocupar-se não apenas em conhecer sobre métodos e processo de investimentos. Deverá, ir mais ao fundo das questões. Deverá averiguar quais os métodos e processos utilizados no cálculo das pensões. E da sua actualização. Mais ainda, se uma direcção ou um conselho de administração do INSS tem competência legal para fixar pensões. Ou, se assim não estamos perante um competência usurpada ao Governo, representado pelo Ministério do Trabalho.


A gestão corrente, de curto e de médio prazos, pouco importa aos contribuintes do INSS como é feita. Interessa-lhes outras e mais profundas questões. Interessa-lhes saber que o dinheiro por si descontado está a ser bem rentabilizado. Que foi aplicado em operações financeiras sérias, honestas e seguras. Que está a receber o juro mais elevado praticado no país. Como lhes interessa ter a garantia que sempre que o Governo decrete ajustamento salarial e de pensões, a decisão é cumprida. Isto porque, ao que se pode provar, a partir de certo momento o INSS deixou de actualizar as pensões. Deixou de actualizar as pensões acima do valor da pensão mínima. Simplificando, o INSS está a actualizar todas as pensões apenas no valor correspondente à pensão mínima. A justificação, quando solicitada, é verbal. E, o argumento é de que o INSS não possui fundos para actualizar pensões mais altas do que a pensão mínima. Verdade ou mentira, cabe à nova auditoria esclarecer. E, também, saber quem deu à Primeira-Ministra a informação falsa, segundo a qual as pensões quando são pagas anualmente elas são actualizadas. Não é verdade que assim esteja a acontecer. Alguém mentiu à Primeira – Ministra. Qual a intenção da mentira, o que se pretende encobrir com a mentira, são questões que podem ser averiguadas. E, devem. Mas, e em última análise, mentir e fazer mentir é feio.

domingo, junho 08, 2008

o que mais há é dinheiro

Desvios de fundos, não são fenómenos novos. Querem aconteçam em instituições privadas, públicas ou do Estado. E, isto em Moçambique como em diferentes e muitos outros países. Pode é ser diferente a sua abordagem e a forma do seu tratamento. Até a sua definição. Por exemplo, hoje, no nosso país, parece ter passado a chamar-se rombo ao roubo. Não passa, naturalmente, de um eufemismo. Mas, e é muito provável que assim possa ser. Procura-se, então, distinguir duas categorias de crime. E de ladrões. Uma, o assaltante, o ladrão à mão armada. Seja a arma branca ou, como vulgarmente se diz, tipo pistola. A outra, o chamado ladrão de colarinho branco. No primeiro tipo de crime, impera a violência. Que pode ir até à morte do assaltado. Há tiros, há barulho, há sangue, há confusão. No segundo caso, trata-se de crime silencioso. Em muitos casos silenciado. Como se compreende, não ficaria bem equiparar um a outro tipos de crimes. E de criminosos. Sabemos, está escrito, em diferentes países da América Latina muitos dos chamados rombos foram, pura e simplesmente silenciados. Abafados. O FMI terá sugerido aos Governos locais para cobrirem os montantes roubados. De acordos com as suas políticas e os seus modelos de desenvolvimento. Ou seja, que o Estado deveria repor os montantes roubados. Com o dinheiro dos impostos. Em defesa do bom nome, da estabilidade e do prestígio dos defraudados. Ao que rezam as crónicas e os estudos e as investigações, a sugestão terá sido acolhida. Logo, tudo terminou em bem.


Em matéria de dinheiro desviado, aí temos mais um escândalo. Trata-se do rombo sofrido pelo Instituto Nacional de Segurança Social. Estimado em oito milhões de dólares norte-americanos. Dinheiro este descontado pelos trabalhadores moçambicanos. Ao longo de muitos anos. E que era suposto ter tido aplicações rentáveis. Por forma a terem assegurada um pensão condigna. Mas não. Não será bem assim. Grande parte do dinheiro descontado pelos trabalhadores e pelas respectivas empresas, terá ido parar às contas de uns tantos funcionários. Desonestos. Agora descobertos. Para que tal acontecesse, valeu a intervenção da Ministra do Trabalho. Ao mandar abrir e instaurar inquérito. Numa linha de actuação que tem vindo a seguir e que só pode merecer referência positiva. Tanto no plano ético, como no plano moral, como no da justiça e da justiça social. É este posicionamento correcto e consistente, coerente, que a obrigam a ter de ir mais além. Para assumir e dizer como e quem terá de repor os valores desviados. Roubados. De resto, sem um posicionamento claro, fica a dúvida se valerá a pena descontar para a Segurança Social. Tanto mais que a actualização das pensões é feita com base na pensão mínima. Não com base na pensão de cada um. Que corresponde e foi calculada em função do que cada um descontou. Neste campo, Moçambique será caso único. E exemplo de negação do que se entende por segurança e por justiça social. Cabe à Ministra repor essa justiça social. Para tanto, não falta dinheiro. A verdade dos factos diz que o que mais há é dinheiro.

domingo, junho 01, 2008

os valores que ditam aceitação e rejeição

Ele há coisas que me causam algum espanto. Que me levantam muitas dúvidas. Sobre o porquê assim. Uma delas, entre várias, diferentes e diferenciadas outras, é o das reduzidas tiragens de certos livros. Escritos por moçambicanos, sim. Sobre a cultura dos moçambicanos, também. Livros esses, obras essas que, penso, deveriam estar disponíveis em todo o país. Que deveriam estar acessíveis em tudo quanto é país. Moçambique, portanto. Mas não, não é possível. Melhor, possível é. Mas, assim não acontece. Apesar de considerar que deveriam ser de leitura obrigatória. Em certos círculos. Ditos, chamados, intelectuais. De estudo. De reflexão. Também, em escolas e universidades que leccionam a matéria. Ou não. Convenhamos, desde já, que editar 750 exemplares de um livro sobre a cultura de um povo moçambicano parece nada. Mas, infelizmente, até poderá vir a provar-se ser muito. O que significa que parte significativa da edição esteja destinada a apodrecer nas prateleiras das poucas livrarias onde venha a ser exposta. Muito por hipótese, apenas na cidade de Maputo. Esperar mais, poderá ser esperar muito. Mas, num momento em que se começa a assistir a um salutar movimento para reactivar e apetrechar bibliotecas, há que pensar o com quê. Com que tipo e com que género de livros.

Manifestei o meu espanto por um determinado livro ter merecido, apenas, a edição de 750 exemplares. Neste ano de 2008. Apesar de patrocinado por empresa nacional. Se assim não, provavelmente teria sido imprimido exemplar nenhum. Ora, o livro em questão tem como título “O povo macua e a sua cultura”. O autor é Francisco Lerma Martínez, missionário da Consolata. Actualmente, Superior da Casa Regional dos Missionários da Consolata em Maputo. Trata-se, como explica o autor, de um estudo e trabalho de campo realizado durante um período determinado no tempo e no espaço (Maúa e distritos limítrofes de Niassa, 1971-1985), e de um texto de tese doutoral. Teve, o autor, como colega de estudos, em Roma, o padre Filipe Couto. Actual Reitor da UEM. Da apresenta a esta 2ª edição da obra se encarregou Brazão Mazula, antigo Reitor da mesma UEM. Na introdução, procurando situar o âmbito e o espaço do seu trabalho, o autor escreve: Procurarei apresentar o povo macua a partir de onde comecei a conhecê-lo, o distrito de Maúa, província do Niassa, no norte de Moçambique (...) Foi aí que conheci alguns dos valores culturais deste povo, os quais procurarei transmitir neste trabalho. Se o objectivo terá sido conseguido ou não, é tarefa de outros. Fica a mensagem de que se trata de um livro que muitos devem ler. E debater. Para entenderem onde acaba e onde começa tradição e a modernidade. Onde tradição e modernidade são afluentes ou confluentes. Quais os valores que ditam aceitação e rejeição.

domingo, maio 25, 2008

o melhor é mesmo perder a memória

Por vezes, a memória não resiste ao tempo. Ao tempo que passou. Que vai passando. E, se isso acontece, se isso pode acontecer, com testemunhas ou declarantes em sede de Tribunal, também pode assim suceder com o jornalista. No caso concreto, prejuízo nenhum acarreta recordar ou não a data do acontecido. Recordar ou não recordar a semana o mês e o ano do acontecido. Importa, isso sim, saber que aconteceu. E, de facto aconteceu. Foi neste mesmo espaço, em tempo sem memória de data, que se escreveu o que se escreveu. Talvez nem uma nem única vez. E, o que se escreveu, neste espaço, está escrito. Consta de arquivo. Talvez recordar que o que foi escrito em tempo passado, foi que Aníbal dos Santos Júnior não havia fugido da prisão. Foi que, por estas ou por palavras diferentes, que lhe haviam abertos a porta para sair. Ou, se se preferir, que o haviam mandado sair. Quem e porquê o possa ter feito, era secundário. À data do escrito. Embora fosse evidente. Mais do que evidente, o quem e o porquê. Hoje, passados anos, depois de um julgamento à revelia e outro presencial, é o próprio condenado que nos vem dizer: Eu nunca escapei. Eu era sempre retirado. (Magazine, 21 de Maio de 2008).


As declarações que têm vindo sendo feitas no decorrer do julgamento do chamado “Caso Albano Silva podem causar algumas preocupações. Levantar dúvidas, até. E, muitas. Uma das dúvidas é, até que ponto as revelações feitas nas últimas semanas em Tribunal podem ou não fazer rever processos e repetir julgamentos. Transitados em julgado ou não. Isto é, até que ponto, em nome da Justiça, se deve ir mais além para fazer Justiça. E, para desmentir ou confirmar afirmações repetidas, tantas vezes feitas. Segundo as quais, há presos que deviam estar fora da prisão e há quem estando em liberdade deveria estar detido. Depois, por fim, para concluir, parece ser importante esclarecer um outro e não menos importante aspecto. É o do assassinato de Siba-Siba Macuácua. Logo se existe, ou se existiu, ligação alguma entre a forma como o dinheiro foi retirado, dos cofres de uma e de outra instituição bancária. Ou seja, dos extintos Banco Comercial de Moçambique e Banco Austral. Há, em todos este processos, muitas áreas de penumbra. Daí as dúvidas sobre onde começa e onde acaba o crime organizado. Ou, até, se ele existe. Que há quem não poupe esforços, nem dinheiro, para fazer divulgar as suas posições em jornais da praça, é um facto. E entre perder a vida e perder a memória, o melhor é mesmo perder a memória

domingo, maio 18, 2008

deixem trabalhar quem quer trabalhar

De tempos em tempos surgem, entre nós, notícias que muito bem nos poderiam deixar alarmados. Preocupados. Mas não, não devem. Não haverá razão, não haverá motivo para tanto. É que, aparentemente, tentam ser denúncias. Denúncias do que se pretende sejam ilegalidades. Denúncias do que se pretendem sejam violações de direitos consagrados universalmente. Por convenções. Mas, as convenções são isso mesmo. São convenções. São convénios. São acordos de princípios. Não são leis. Salvo quando inclusas no ordenamento jurídico interno de um Estado. Assim, as denúncias, muitas dessas pretensas denúncias de pretensas violações podem não ter em vista a defesa dos direitos dos hipotéticos violados. Podem ter objectivos outros. Em completo alheiros aos seus interesses, como pessoas, e ao interesse nacional. Serão, então, denúncias fomentadas e alimentadas por interesses outros. Como começa a tornar-se frequente. Demasiado habitual. Passam uns bons pares de anos, recordo, foi noticiado um caso de prostituição infantil em Chimoio. Que envolvia soldados das Nações Unidas em missão de paz. Notícia que, nas custou perceber, na época, terá sido incentivada por quem queria impor-nos determinados valores morais. Falsos. De falsa moral. Ou, na pior das hipóteses, assentes em premissas falsas. Valeu, na altura, a corajosa intervenção do actual Ministro das Obras Públicas e Habitação. À época governador provincial. Ao explicar que não se tratava de crianças mas de adolescentes. E, por aí em diante. Com argumentos suficientemente convincentes. Para se perceber, para alguns terem percebido, que a moral não é um valor em absoluto. Que não é um valor em si. Ou, se assim, convenhamos, não passa de um valor relativo. Ou variável.


Já muito depois, passemos ao recentemente. Ao hoje. Ao tempo em que há por aí uns tantos de híbridos e de híbridas que, a coberto de capas de bem fazer, vieram em frente com campanhas a favor do coitadinho. E, o coitadinho é o miúdo ou o jovem que, em mercados ou junto de estabelecimentos comerciais, se propõe transportar compra de quem comprou. A troco de algumas moedas. Não, não se pode ver mal nisso. Ninguém de boa fé pode ver como mal a prestação de um serviço a troco de pagamento. Já no plano inverso, sim. A concepção de coitadinho e a expressão estamos aqui para ajudar, só queremos ajudar, comportam profunda carga racista. Pode ser, e será, involuntária. Inconsciente, até. Mas é, objectivamente, um posicionamento racista. Primário. Ainda esta semana (quarta-feira), o jornal “Notícias” escrevia que “Orfandade propicia mão-de-obra infantil”. E relatava o caso de alguns jovens, dos seus 13 anos, que, na cidade da Beira, vendem ovos para apoiar o sustento familiar. Ora, se os jovens fazem negócio por conta própria, como parece ser o caso, tem mal nenhum. E deveria, isso sim, ser louvada a sua iniciativa. Como deveriam ser divulgadas, enaltecidas e encorajas todas as iniciativas de trabalho. Individual e colectivo. Afinal, do que mais precisamos são de incentivos ao trabalho socialmente útil. Continuamos, cá entre nós, com muitos pruridos importados sobre o trabalho. Uma vezes são as crianças, outras as mulheres, outras ainda a defesa de interesses mesquinhos. Tudo, no conjunto, para impedir de trabalhar quem pretende trabalhar. E, objectivamente, em defesa, não dos direitos de quem trabalha mas de direitos inversos. Então, deixem trabalhar quem quer trabalhar.

domingo, maio 11, 2008

uma linguagem moderada

Parece que já não restam muitas dúvidas. Talvez nenhumas. É que estamos perante um crise alimentar. E, uma crise global. Não uma crise circunscrita. Não uma crise limitada a determinados países ou a determinadas regiões. Não uma crise anunciada. Não uma crise que há-se ou pode vir. Estamos perante uma crise. Que é real, já nos nossos dias. E que poderá levar à morte de muitas centenas de milhões de seres humanos. Uma crise que, segundo o Secretário-Geral das Nações Unidas, se não for tratada adequadamente (...) pode-se desdobrar em múltiplas crises afectando o comércio, o desenvolvimento e mesmo a segurança sócio-política do mundo. A subsistência de centenas de milhões de pessoas está ameaçada. Na opinião de Ban-Ki-moon seria importante estimular o desenvolvimento agrícola, particularmente em África e noutras regiões mais afectadas. Por isso, devem ser tomadas medidas que facilitem o acesso de pequenos produtores rurais a sementes, fertilizantes e outros insumos. De resto, esta crise não começou do nada. Cresceu de mais de uma década de negligência e de políticas ineficazes de desenvolvimento. Precisamos recomeçar, segundo escreve o jornal “Notícias” na sua edição de 7 do corrente.


Perante as notícias que nos chegam, todos os dias, a conclusão a tirar é a de que estamos perante uma crise alimentar geral. Global. Que já se manifesta em diferentes países e região do mundo. Também em Moçambique. Como parece óbvio. Que temos que produzir mais comida, que temos que produzir maior quantidade de produtos agrícolas no mesmo espaço de terra, sim. Concordemos que sim. Digamos que, em boa hora, a Revolução Verde foi lançada com esse objectivo. Um objectivo que, sem reservas, todos temos o dever de apoiar. Mas, digamos, também, que a Revolução Verde não é, nem pode ser, um processo voluntário. Um processo voluntarioso. Caso contrário, deixaria de ser revolução. De resto, das revoluções verdes bem sucedidas, podemos citar um exemplo. O da Índia. País onde às pachorrentas vacas sagradas era concedido o direito de fazerem parar o trânsito. E onde, a partir de certa altura, foram, obrigatoriamente encurraladas pelos seus donos. Caso não, o Estado assumiu o direito de as abater. Mesmo indo contra hábitos e tradições ancestrais. Contra mitos, tradições e tabus. Uma revolução, seja ela rotulada de verde, cultural, amarela ou azul é, sempre e inevitavelmente, um processo violento. Mas legítimo. Não se faz através de lei nem de decreto. E, como processo, pode ser mais ou menos longo. Mas, não um processo ligeiro ou que possa ser aligeirado. Ora, num contexto de crise alimentar global, o que não devemos é criar falsas expectativas. Criar ilusões. E vir dizer, como já se houve dizer, que podemos vir tirar benefícios dessa crise. Não podemos e, infelizmente, não haveremos de retirar. Em diferentes graus, a crise irá afectar ricos e pobres. Muito menos uns, muito mais outros. Mas, sem dúvida, a gravidade e a dimensão do problema aconselha à ponderação. À reflexão. À calma e a uma análise objectiva e realista. Sobretudo, também, a uma linguagem moderada.

domingo, maio 04, 2008

um modelo desadequado à realidade

Começou o Primeiro de Maio por ser uma data e um símbolo da luta dos trabalhadores. Luta por melhores condições de vida, por melhores salários. Por salários considerados mais justos e, também e fundamentalmente, pela redução do número de horas de trabalho. Digamos, para ser mais concretos, por uma jornada de oito horas diárias de trabalho. Feriado Nacional em alguns países, o Primeiro de Maio sempre foi dia escolhido para manifestações em outros. Desfiles grandiosos ali, dia de repressão aqui. Como se o capital pudesse ter finalidades diferentes. Objectivos diferentes. Em sistemas sociais diferentes. Sistemas sociais, sim. E, entenda-se, o socialismo, até prova em contrário, nunca terá sido um sistema económico. Terá sido um sistema social. Talvez possa não ter sido mais do que uma utopia. No mínimo, e no longo prazo, não conseguiu afirmar-se nem encontrar forma, ou fórmula, para distribuir a riqueza produzida de forma equitativa. Mais justa. Ou não quis, ou não o quiseram os homens. Então, ao que se sabe hoje, nunca esteve ausente nos modos de produção de qualquer país do mundo. Que o socialismo não terá sido mais do que um capitalismo de Estado. E que, passada essa fase, aí temos hoje uma China e uma Índia a disputarem a partilha de quanto se lhes apresenta essencial ao seu desenvolvimento. Desde o petróleo às terras cultiváveis, desde os mercados comerciais aos mercados de trabalho. É que crescer, já cresceram o suficiente. Agora, estão a lutar por se desenvolver.


Em termos de comemorações do Primeiro de Maio, Moçambique poderá ter sido modelo. Em anos seguintes e próximos da independência. Foram grandes e grandiosas as manifestações. Concorridos os comícios. E, diga-se em abono da verdade, ia quem queria ir. Participava quem queria participar. Mesmo quando possa afirmar-se que era obrigatório estar presente, já não era obrigatório mostrar alegria. Nem acenar com bandeiras e com dísticos. Entender que assim foi, implicar recuar no tempo. Situarmo-nos no tempo. Em que a maioria das empresas haviam sido privatizadas. Eram pertença do Estado. A esta fase, decorridos anos, sucedeu uma outra. O que terá, inevitavelmente, provocado um diferente posicionamento dos trabalhadores. E, àquilo que terão sido o que se chamou jornadas de festa e de luta, sucederam-se, apenas, jornadas de luta. Se justa ou não, é outro aspecto. Neste contexto, parece pertinente colocar a questão de saber se o actual modelo de comemorações é válido. Se é justificável. Se é, como se gosta de dizer, sustentável. Se, numa sociedade capitalista, como a nossa, faz sentido presidirem às comemorações do Primeiro de Maio membros do Governo, sindicalista, empresários. Muito provavelmente, estaremos perante um modelo ultrapassado. Digamos, um modelo desadequado à realidade.

domingo, abril 27, 2008

o acessório não passa de negócio cueca

Maputo era, ainda, Lourenço Marques. E, na então capital da colónia, imperou, durante algum tempo, a lei de um assaltante, de um criminoso. Que era conhecido por “Zeca Russo”. Para alguns e, muito para algumas, descrentes com o rumo que o sistema colonial estava a seguir, tratava-se de um “justiceiro”. E, se assim o diziam, era por assim acreditarem. Diziam, recorde-se, roubava aos ricos para dar aos pobres. Sua mãe, então a residir num primeiro ou segundo andar de prémio situado na Rua da Sé, pensava igual. Para não dizer melhor. Saber do filho e da vida que o filho levava, sabia pouco. Mesmo nada. Há data dos acontecidos actos do jovem também tinha idade para pouco se preocupar. Para nos situarmos no tempo, digamos que passam mais de 35 anos. Aconteceu, porém, certo dia, ter cometido algum erro. Ao tempo do acontecido, houve quem tivesse falado em traição. Em cumplicidades com polícias. E, daí terá “Zeca Russo” sido capturado. E preso. Herói como era considerado por alguns, o “7 de Setembro” permitiu-se adquirir as liberdade e o ser passeado em viatura aberta pelas ruas da cidade. Os acontecimentos futuros permitiram que viesse a adquirir elevado estatuto na então Polícia de Investigação Criminal. Ao tempo de um tristemente célebre director. Ou, um director de triste memória. Então, com o estatuto ganho, voltou às tropelias do antigamente. Lançava, quotidianamente, o terror pelas artérias da capital. No “seu”, roubado, descapotável amarelo. Continuava a roubar e, se necessário, a matar. Até que um dia, talvez cansado, de tanta monotonia, decidiu migrar para a África do Sul. Anos depois, chegaram notícias de ter sido morto. Tanto poderá ser verdade como não. É que, também pode ser acontecido ter, simplesmente, feito uma operação plástica para iludir as autoridades. E ter continuado a viver.


A história do jornalismo em Moçambique fez-se, muitas vezes, de alguns equívocos. Como pode estar a acontecer no presente. Ao conceder demasiados espaços ao crime e ao criminoso. Dando deste, e de ambos, uma imagem que pouco terá a ver com a realidade e com os factos conhecidos. Quando não, adite-se, dando demasiado espaço à exploração e à exposição do sórdido e do anti-social. Talvez, do que foi convencionado ser a moral e a ética. Poderá ser assim que, avançando tempo, chegados aos dias de hoje, aí temos, agora, um tal de “Anibalzinho”. Quase elevado à categoria de vedeta. E, quando se não pede o perdão para os crimes pelos quais já foi julgado, e condenado, já estivemos mais longe. Haverá, muito provavelmente, uma questão de pudor. Agora, o motivo pelo qual tem direito a tanto espaço informativo, continua incógnito. Continua mistério. Assim, também, da mesma forma, é estranho as atenções dadas, os espaços informativos que estão a ser concedidos a um tal Ziqo e a um tal Engrácio. Ou, como outros lhe chamam, Engrácia. Talvez, não devessem merecer tanta atenção nem tanto espaço informativo. Um e outros. Sob risco e pena de estarmos a criar mitos. A produzir novelas. No mau sentido. E, o que perece, definitivamente mau, a desviar as atenções do que é fundamental para o que não passa de acessório. E, aqui, convenhamos, o acessório não passa de negócio cueca.

domingo, abril 20, 2008

Que se acautele quem deve acautelar

Com frequência, muita, são divulgadas notícias sobre a prisão de traficantes de drogas. E, também, de traficantes de seres humanos. Para os mais diversos fins. Vindas dos mais diversos países. Moçambique, não constitui excepção. A avaliar pelos relatos, no seu conjunto, no seu todo, pode fazer-se uma ideia dos esforços desenvolvidos pelas Polícias no combate ao crime. Mais precisamente no combate ao crime organizado. Que, em muitas situações, possui meios tão ou mais sofisticados, tão ou mais poderosos do que aqueles que foram incumbidos de manter a ordem e a segurança públicas. É assim que não surpreende a notícia originária do Brasil. Segundo a qual “Homens armados atacam prisão de máxima segurança”. Descreve o “Notícias” (edição de 16 do corrente) que Homens armados, disparando de carrinhas e voando num helicóptero, atacaram uma prisão de segurança máxima, em Campo Grande, no Brasil, onde estão detidos alguns narcotraficantes mas foram repelidos pelos guardas. A prisão atacada é aquela onde está encarcerado o barão da droga colombiano Juan Carlos Ramirez Abadia e o líder de um “gang” brasileiro Luiz Fernando da Costa. Segundo um director prisional, “A ideia era obviamente libertar reclusos. Não há outra razão para atacar uma penitenciária”. Para descanso dos leitores, acrescenta a notícia que “todos os atacantes fugiram e ninguém ficou ferido na prisão...”. É caso para dizer, ainda bem quando tudo acaba em bem. Mas, para dizer, também, que terá ficado o aviso.


Por cá, internamente, também muito se tem lido, dito, e visto, sofre o tráfico. Ou, os diversos tráficos. Entre os quais, o mais recente e mais mediático terá sido o chamado “Caso Diana”. O caso de uma mulher que aliciava e traficava raparigas para serem prostituídas na África do Sul. Um caso que, muito prometia. Ou que, dito de forma diferente, a nossa Polícia prometia muitas prisões. Mas, afinal, parece que não irá ser bem assim. Depois de, como costuma dizer-se, contadas as armas, pode, até, acontecer, haver nome mais nenhum. Nome verdadeiro mais nenhum. Para além do de “Diana”. Nome que, podendo, também, não ser verdadeiro, é atribuído a uma mulher que se diz estar presa. De resto, quanto ao resto, como era de prever, como era previsível, restam apenas hipóteses. É assim que segundo o jornal “Notícias” (15.04.08) Neste momento, a Polícia está a trabalhar com pseudónimos dos referidos comparsas da Diana, códigos estes fornecidos a partir do local onde se encontra sob custódia policial, como sendo elementos que consigo colaboram no tráfico de pessoas para exploração sexual. E, como que a prevenirmos para um possível desfecho do caso, a notícia acrescenta que por si só os pseudónimos não transmitem a idoneidade dos factos, tornando-se numa grande limitante para a Polícia efectuar mais detenções de suspeitos. Com o rumo que as coisas parece estarem a tomar, não custa acreditar que a tal de Diana até volte a frequentar a praia da Costa do Sol. Logo depois do seu julgamento. Com início marcado para 12 de Maio próximo. Que se acautele quem deve acautelar.

domingo, abril 13, 2008

não iremos capturar traficante algum

Moçambique parece enfrentar uma nova calamidade. Uma calamidade que dá pelo nome de tráfico de seres humanos. E, como nos tempos idos, passados, como nos tempos da escravatura, não pode deixar de haver conivência local. Nacional e regional. Diga-se, sem receio, sem temor de engano, que quem alicia, quem engana, quem captura, não é gente estranha. São, nos casos conhecidos, conhecidos, vizinhos, amigos, quando não, familiares das próprias vítimas. Em casos outros, talvez possa não ser exactamente assim. Poderá ser, poderá parecer, um processo aleatório. Agora, o que parece ser comum é o destino das vítimas. Tanto em termos geográficos como de finalidade. Então, em termos geográficos, o destino das vítimas parecer ser, invariavelmente, a África do Sul. A finalidade, tanto pode ser a mão-de-obra barata, escrava, como pode ser a prostituição. A escravatura sexual. Como, em última hipótese, poderá ser a doutrinação religiosa. Com objectivos de longo prazo. Na verdade, de todos os alegados casos conhecidos de tráfico de pessoas, por publicitados, pouco se sabe sobre o seu desfecho. Para além de haver vítimas. Aparentemente, trata-se de negócio rendoso, ou rentável. De tal forma, ou por assim, poucos ou ninguém se atrever numa investigação séria. Honesta. Para saber, para dar a conhecer onde começam e onde acabam as redes organizadas de tráfico de seres humanos. Condição primeira e primária para se poder falar no seu desmantelamento.


Há algum tempo, não muito, não demasiado, foi noticiado o transporte de algumas dezenas de crianças do Norte para o Sul do país. Em condições desumanas. Em condições indignas para a deslocação de qualquer animal. Em condições mais do que atentarias aos mais elementares direitos humanos. Um caso que tende a cair no esquecimento. Ou que já caiu. Por não interessar esclarecer. Depois, surgiram casos comprovados de aliciamento e tráfico de raparigas para a África do Sul. Hoje, parece cedo para pedir o conhecimento do seu desfecho. Ficamos com a promessa, que desejamos não ser falsa, de poder vir dar origem a muitas prisões. À prisão de muitas pessoas. Confiamos que assim possa vir a ser. Concedemos o benefício da dúvida. Agora, pelo “Notícias”, da última quarta-feira, ficámos a saber que foi Interceptado contentor com 155 ilegais em Tete. O contentor vinha do Malawi e, segundo o matutino, um morto e gente debilitada estavam a ser transportados em condições desumanas num camião com destino à Beira. O mesmo jornal informa, com detalhe, que o motorista do camião fugiu. Tal como havia sucedido com outro motorista, em situação semelhante, poucos dias antes. Depois, talvez na tentativa de nos tranquilizar, acrescenta: As empresas para as quais trabalhavam os fugitivos já forneceram as respectivas identidades, bem como ofereceram-se a colaborar nas investigações para a sua detenção, dado que, negam qualquer responsabilidade no negócio do transporte dos ilegais. Ora, o que estamos a ler é que proprietários dos camiões negam a sua participação no tráfico de seres humanos. Logo, em boa lógica, trata-se de um negócio dos motoristas. De motoristas que circulam centenas de quilómetros e, provavelmente, durante dias, sem conhecimento do dono da viatura. Mas que, ao que tudo indica, não roubaram a viatura ao legítimo proprietário. Ora, finalmente, dizer que perante a aberração das declarações dos proprietários das viaturas é necessários deixar claro que não somos, propriamente, um país nem de burros nem de parvos. Se a nossa Polícia se conforma e se fica confortável com a oferta da colaboração referida, trata-se de um problema, único e exclusivo, da Polícia. Mas, uma questão importa que fique clara. Não é com esta ingenuidade, não é incredulidade, não é com esta aceitação, passiva da concepção vigarista do vigarista que iremos combater o crime organizado. Desta forma, com este pensamento e esta forma de acção, não iremos capturar traficante algum.