domingo, outubro 26, 2008

somos a favor da Revolução Verde

Há, hoje, ao que parece, muitas definições para Revolução Verde. No saber, no conhecer e na simplicidade de Lina Magaia, Revolução Verde é produzir para comer. Guebuza não precisa de dizer como se faz a Revolução Verde. Ela faz-se produzindo (Magazine, 22 do corrente). Para mim, guardo uma visão, talvez, mais académica. Menos prática. Mais teórica. Passa por querer saber como se pode e se deve fazer esse produzir para comer. E se produzir para comer é uma primeira ambição, um primeiro objectivo, se se deve ficar por aí. Se não é necessário produzir para além das necessidades imediatas, básicas, primárias. Se não é preciso produzir excedentes. Se não é preciso produzir para o mercado. E, se para se produzir para o mercado, se torna imperioso ou não que esse mercado exista. Ora, se não existe, tem de ser criado. Logo, em paralelo com o aumento da produção e da produtividade, com a criação de excedentes, não podem ser ignorados os meios e os mecanismos que permitam a troca. O funcionamento do mercado. Mas, convenhamos, a Revolução Verde não é um processo mecânico nem mecanicista. Não se limita à mera produção de produtos agrícolas. Passa pela sua transformação. Passa pela produção animal. Pela abertura e melhoramento das vias de circulação. Pelos meios de circulação. Pela expansão dos meios de comunicação para os centros urbanos rurais. Como o telefone, a rádio, a televisão. Exige, sem dúvida e por último, uma forte intervenção do Estado. Aos mais diversos níveis. A começar pela tentativa de quebrar resistências à mudança. A começar pela tentativa de alteração de hábitos e de costumes, que se verifiquem como entraves ao processo. Que é global.


Nesta semana que terminou, Maputo acolheu mais uma reunião da Via Campesina. Ao que parece a primeira em África. Esta organização foi criada em 1992. Trata-se de um movimento autónomo, pluralista, mas com ligações políticas e económicas. A avaliar pelos pronunciamentos públicos feitos na capital moçambicana, é contra a Revolução Verde. Reprova a Revolução Verde. Ao que parece e pelo que se ouviu, de forma absoluta e radical. Fundamentalista. O que não poderá conduzir a nada de bom nem de positivo. Aconselha o saber feito de experiência que se deve ser mais ponderado. Mais pragmático. Ora, que se seja contra uma revolução verde feita à base de sementes geneticamente modificadas, todos somos. Porque, para além de outras questões, deixa o camponês dependente de novas sementes em cada sementeira. Ou seja, dependente de multinacionais para quem a fome dos camponeses é o objectivo do seu negócio. Mas, atenção. Uma coisa é ser-se contra uma revolução verde feita à base de sementes geneticamente modificadas. Outra, é ser-se contra a Revolução Verde. Nós por cá, nós em Moçambique, somos a favor da Revolução Verde.

domingo, outubro 19, 2008

somos potenciais alvos dos criminosos

Com certa regularidade, a Polícia vem a público informar o que foi a actividade criminosa em determinado período de tempo. Ou num certo espaço geográfico. Quase, ou sempre, vem prestar essa informação em determinado ou certo dia da semana. Sempre à mesma hora e no mesmo local. Como acontece com as missas dominicais. A que os crentes assistem, um pouco por todo o país. Ou a que se obrigam a assistir. Porque querem e a isso os move a sua crença. Já em termos de informação policial, em termos de informação sobre a segurança a ordem públicas, as coisas deveriam ser diferentes. Deveríamos saber mais, muito mais do que aquilo que nos é dado saber. E, em tempo útil. Enquanto não, continuaremos a saber do assalto aqui, do roubo além, depois, muito depois de consumados. Em momento algum, que a memória recorde, terá havido notícia da antecipação da actividade policial. E que terá vindo a público dizer isso mesmo e aconselhar os cidadãos sobre a forma de se protegerem. De se precaverem de assaltantes e de ladrões. Fornecendo, inclusive, números de telefones para chamadas de emergência. Numa acção diária e concertada. Repetida. Através de jornais, de rádios, de televisões. Que é, que devia ser assim, ninguém o ignora. Se não é feito assim, talvez seja porque outros e diferentes interesses se levantam. Porque outras e mais altas vozes se fazem ouvir. Ou escutar. Ou são ouvidas.


Parece haver alguns tipos de crime em relação aos quais a Polícia está a evitar reportar. Divulgar dados, números e contornos. A chamar a atenção. A alertar o cidadão para que este se possa precaver e evitar ser vítima de bandos criminosos. Repito, de bandos de criminosos. Que estão e continuam a actuar, impunemente, na capital do país. Trata-se de casos que, não tendo sido divulgados publicamente, foram reportados à Polícia. Que aconteceram. E, acontecerem á relativamente bastante tempo, como estão a acontecer no presente. Como estão a repetir-se no presente. São os casos de indivíduos que, em certas zonas da cidade, se atiram contra viaturas em movimento. E que simulam terem sido atropelados. A partir daí, choram e clamam por socorro. Simulam fracturas múltiplas. Umas vezes nas pernas. Outras nos braços. Outros, contusões no tórax. Querem ser, todos eles, transportados até ao hospital na viatura que dizem os ter atropelado. Mas, não sós. Na companhia de amigo pedestre que, entretanto, chega local. Ou de amigo que, por “acaso” passava na sua viatura. Quando descoberto no Hospital, se aí consegue chegar, o vigarista ensaia a fuga. A Policia sabe que está a acontecer assim. Sabe e tem provas de vários casos protagonizados pelo mesmo indivíduo no espaço de poucos dias. Em diferentes pontos de Maputo. Sabe que um mesmo indivíduo simulou ter sido atropelado num espaço de poucos dias. Terá registos das ocorrências. Se fez alguma coisa para o neutralizar, será segredo policial. Como sempre acontece. Que fez coisa nenhuma para evitar possíveis novas vítimas, fez. Quer dizer, não fez. Mas, para além de não ter feito, como habitualmente não faz, ou faz mal, evitou alertar o cidadão para os novos processos utilizados pelos criminosos. Daqui resulta, em último, que todos nós somos potenciais alvos dos criminosos.

domingo, outubro 12, 2008

Assim haja vontade

A corrupção não é fenómeno típico nacional. Moçambicano. Existe por aí. Existe pelo mundo fora. Embora revestido ou vestido com as mais diversas e diferentes roupagens. As mais diversas formas de camuflagem. A corrupção, pode ser comparada a uma hidra. Está e vive onde há dinheiro. Começa onde há dinheiro. Acaba quando acaba o dinheiro. Mas, como dinheiro nunca acaba, apenas muda de mãos ou de local, ensaia transformação. O que se passa no sector das estradas, pode ser apenas um caso. Talvez exemplar. Como parece ter confirmado a 7ª Reunião Anual da Associação dos Fundos de Manutenção de Estradas em África. Esta semana realizada em Maputo. E, no decorrer da qual terá havido consenso entre os participantes que a corrupção nos concursos públicos para obras de manutenção de estradas constitui uma séria ameaça para as economias de muitos países africanos por conduzir ao descaminhos de elevadas somas do erário público. (Notícias de 8 do corrente). E, a local adianta que uma das propostas apresentadas vai no sentido de os países africanos simplificarem os procedimentos que regem a gestão dos concursos públicos, o que pode ser alcançado através da redução do número de pessoas envolvidas tanto na negociação como na celebração dos contratos. Acreditamos e aceitamos que a proposta tenha sido elaborada por sábios. Só que os tais procedimentos, muitas das vezes, são impostos pelos doadores. E, havemos, também, de reflectir que entre os doadores não há sempre nem só homens puros, Honestos, Também os há com as suas fraquezas. Com os seus fracos pelo dinheiro. Quer dizer, menos sérios, menos honestos. Talvez, até e em última análise, desonestos. Corruptos.


Em termos de corrupção e de desvios de dinheiro do Estado, continuamos sem motivos para alegria nenhuma. Muito pelo contrário. Primeiro, foram as detenções relacionadas com o chamado “Caso dos 220 milhões do MINT”. Até ao presente sem grande evolução. Depois, agora, muito se escreve sobre a forma de gestão da empresa Aeroportos de Moçambique. A serem verdadeiros os dados e os números divulgados, estamos perante um escândalo. Mais um. Envolvendo, neste caso, figuras que se consideravam de reputadas. Acima de qualquer suspeita. Figuras a que alguns chamam de colunáveis. Possa acontecer, por hipótese, que paguem para o ser. Ou o parecer ser. Mas, isso, até pouco importa. Serão questões menores. A questão de fundo, é muito outra. É a de saber o destino a ser dado aos bens que possam ter adquirido com o dinheiro que constitui motivo de detenção. É a questão de saber se, acaso condenados e depois de cumprida a pena, continuam na posse e beneficiar dos bens adquiridos com dinheiro obtido de forma ilegal. Ou se, pelo contrário, quando comprovado o desvio de fundos, esses bens revertem para o Estado. De resto, já é tempo de se investigarem muitos sinais exteriores de riqueza. Capacidade para tanto parece existir. Assim haja vontade.

domingo, outubro 05, 2008

não podemos viver na ambiguidade

O país que somos, parece viver sob a lógica da contradição. Ou sob o síndroma da contradição. Talvez nem seja o país. Não o é. Com toda a certeza. Será apenas uma parte do país. Uma parte pequena. Talvez ínfima. Digamos que a elite. Mas, muito provavelmente, nem ela. Nem toda ela. Que seja, então, apenas uma parte dela. E, uma parte da parte que lê e escreve para jornais. Que se pode fazer ouvir nos audiovisuais. O que leva a ter de colocar a questão se. E, se, como. Ou seja, se essa minoria, se esses tantos poucos, possui capacidade para exercer influência, para influenciar os outros. Para influir na maneira de pensar dos outros. Não só na maneira de pensar. Também na maneira de agir e de se comportarem. Trata-se de um exercício difícil de resolver. De solucionar. O que não significa que não possa ser resolvido. Ou que não tenha solução. Em teoria, nada é impossível. Em teoria não há impossíveis. Da mesma forma que havemos de reconhecer que quanto sabemos e conhecemos, resulta de descobertas. Não de invenções. De descobertas do existente e, até então, por descobrir. Amanhã, depois, poderá ser diferente. Até ao presente, até ontem, foi assim. Foi convencionado que devia ser assim.

Temos o raro condão, talvez o mérito de desejar, de pedir, hoje, o que recusamos amanhã. Possa até nem ser mérito. Possa ser demérito. Hoje, clamamos pelo combate à corrupção. Dizemos que queremos saber quem se apropriou de bens alheios. De bens e de dinheiro do Estado. Em proveito próprio. Amanhã, quando nos apresentam nomes, dizemos não. E, se facto são esses os supostos, deixem-nos em liberdade. Parece ser o que está a acontecer. Parece ser o que se está a passar perante a detenção de uma dezena de funcionários do Estado. Não de um estado qualquer. Do nosso Estado. Que parece estar a provocar alguma intranquilidade. Algum receio, algum medo. Não questionamos. Parece que se perdeu a capacidade de raciocínio. Ninguém pergunta, ainda ninguém perguntou, quantos postos de saúde ou quantas salas de aulas podiam ter sido construídos com o dinheiro desviado. Quantas motas e quantos carros, quantos sistemas de comunicações ou quantos pares de fardamento poderiam ter sido adquiridos com o dinheiro desviado. Até prova em contrário, parece ter havido desvio de dinheiro do Ministério do Interior. Quem desviou ou quem não desviou, é outra questão. De concreto, sem possibilidade para desmentido, é ter havido desvio de fundos do Estado. Perante esta realidade, coloca-se uma segunda. Que é a de não se acreditar na Justiça quando não tenta fazer Justiça. E de não se acreditar na Justiça quando tenta fazer Justiça. Estamos, sem dúvida, perante uma contradição. Que não é aparente e pode ser resultante de conflitos de interesses. Ou de acções programadas de desinformação. O que parece claro e concreto, é que não podemos viver na ambiguidade.