domingo, setembro 30, 2007

África deve boicotar a Cimeira de Lisboa

Chamam-lhe de Cimeira África-Europa. Mas, é suposto que se realize na Europa. Mais precisamente e muito claramente em Lisboa. Caso, efectivamente, venha a realizar-se. Então e só por isso, pelo facto de pretender reunir dirigentes europeus e africanos em país europeu, deveria chamar-se de Cimeira Europa-África. Mas não. Os colonialistas decidiram pelo inverso. E tentam impor o inverso. Porque, não tenhamos ilusões, são eles quem decide. Ou pensa que decide. Ou que pensa que é quem decide melhor. O motivo que parece querer impedir o Presidente do Zimbabwé em participar na referida Cimeira, estão escondidos. Não são os da sua boa ou má governação. Não são o que ele possa ter de bom ou de mau pelos seus governados. O que está em causa, isso sim, é que paira uma ameaça sobre os interesses económicos da Coroa Britânica em terras que foram colonizadas por Cecil Rhodes. Rhodes, como todos o sabemos, deu o seu nome às terras por si usurpadas e ocupadas em nome da Coroa. E teve como projecto maior, estabelecer a ligação ferroviária entre o Cabo e o Cairo. Nunca o conseguiu, para bem ou para mal da Região. Por isso, por o não ter conseguido, ainda hoje as vias ferroviárias são o que são. Partem do interior para o mar.


A escolha do local para a realização desta chamada Cimeira África-Europa parece ser, de todo, infeliz. Por vários e variados motivos. E, o mais importante parece ser o de Portugal não ter descolonizado. Quando foi possível e se apresentava como viável descolonizar. Portugal foi obrigado a descolonizar. Depois de ter perdido a guerra em todas as frentes militares. Portugal, é bom que se fique claro, saiu derrotado, em termos militares, naquilo que eram as suas colónias da Guiné, de Angola e de Moçambique. Mas, mais e talvez pior. No mesmo período, apoiou a Guerra de Secessão no Biafra. Para o efeito fez exilar, a mando de Marcelo Caetano, Mário Soares para São Tomé. Donde era coordenado e dirigido o apoio americano aos secessionistas. Para tentar manter o poder na Guiné-Bissau, invadiu a Guine-Conacri. Estamos no tempo de Spínola, que tinha como homem de mão Alpoim Galvão. No mesmo período, transformou Savimbi em colaborador da PIDE e em informador do Exército colonial, para tentar evitar nova derrota militar. Também e igualmente, sem sucesso, em Moçambique, apoiou uma RENAMO que, a conquistar o poder seria defensora dos seus interesses colonialistas. Hoje, e em termos históricos, sabendo nós o que sabemos da história recente, parece fazer todo o sentido a posição assumida pela SADC. E, a menos que mudem os termos e as exigências sobre os participantes, faz todo o sentido que África boicote a projectada Cimeira de Lisboa. E que deixe os colonialistas em monólogo uns com os outros. Muito embora consciente de que o preço a pagar pelo boicote possa ser elevado. O que está em questão para a ida ou não ida do Presidente do Zimbabwé a Lisboa não é forma como ele governa o seu país. É a forma como ele trata os interesses económicos estrangeiros, particularmente britânicos. Para além de que, todos o sabemos, ouro, diamantes e petróleo são, desde há muito, motivo de cobiça e de guerras. São as causas de todas as guerras actuais. Nesta perspectiva, África deve boicotar a Cimeira de Lisboa.

domingo, setembro 23, 2007

Cerveja e água são negócio

Jornais, rádios e televisões, muitas vezes nos surpreendem em matéria de publicidade. Pela negativa. Naturalmente e para que não restem dúvidas. Digamos que, por vezes, talvez muitas, se nos depara aquilo a que bem se pode chamar de publicidade enganosa. Outras vezes, a publicidade será a produtos de duvidosa qualidade. Também acontece serem publicitados produtos estrangeiros numa linguagem e em termos que nada tem a ver com a realidade nacional. Ou com a cultura indígena local, se assim o permitirem que o digamos. Não se quer dizer, com o atrás dito, que a publicidade, em si própria seja má. Não. O que se está a dizer é que é bem pior do quer má. E, quando se está dizer que é pior do que má, já se poupa, já se evita o recurso ao vernáculo apropriado. Adequado. Pois, bem, o que se está a dizer, o que se está a procurar fazer entender, é que a dita publicidade deve obedecer a regras e a normas. Para que o potencial comprador possa encontrar o produto ou o serviço publicitado. Tal como foram publicitados. E não, como parece poder acontecer, como pode ter acontecido, de formas e maneiras diferentes. Para que quem se dê ao trabalho de procurar o produto ou o serviço publicitado não corra o risco de sofrer desilusão. E de ter de pagar caro. Veja-se só, quanta publicidade enganosa não anda por aí. Podemos, até, citar como mais recente aquela que foi feita pela tvcabo. Que prometeu e deu, mas que depois retirou. Sem mais. É caso para dizer, que em terra de cegos, quem tem um olho é rei. Ou para questionar, se faz sentido Moçambique ir participar na Cimeira Europa-África.


Atenho-me e atento-me, já num tempo mais recente, numa outra peça publicitária. Numa obra prima de anúncio publicitário. Obra prima, será de deixar claro, desde já, pela negativa. Trata-se, aqui, de um anúncio da Águas de Moçambique, que insulta quem comprou a última edição do “Magazine” (19 de Setembro de 2007), quem gosta de beber cerveja nacional e quem paga, pontualmente, a água que consome. Perguntam os senhores a quem, para nossa desdita e má sorte, foi atribuído o direito de fazerem chegar a água a nossas casas, se Sabia que? E, o anúncio, matreco e saloio, em estilo copofónico, dá a resposta. Diz, em legenda sobre quatro garrafas, que 2,5 litros de cerveja custam 125, 00 Mt. Em outras legenda, sobre uns tantos jerricans de plástico, afirma que 10.000 Litros de Água, seu consumo mínimo mensal, custam 120.00 Mt. E, apela de forma carinhosa, infantil e burrical: Pague a sua factura de água, contribuindo assim para a melhoria do serviço. Claro que sim. Mesmo que seja impossível deixar de reconhecer que a melhoria do serviço não se compadece com a exigência de comprovativos de pagamento. Nas tardes de sexta-feira. E de dívidas que nunca existiram. Aquilino Ribeiro, cujos restos mortais repousam desde há poucos dias no Panteão Nacional, em Lisboa, fez da literatura uma causa. E da sua causa uma luta. E não lutou, com toda a certeza, para que estes pedaços de asno, exportados para Moçambique, para aqui fossem enviados com a missão confundir cerveja com água. Sejamos claros: Em Moçambique, cerveja é cerveja, água é água. Cerveja e água são negócio.

domingo, setembro 16, 2007

ter coragem para transformar o colonialismo em passado

Parece incontroverso, que contra factos não há argumentos. E, os factos são que a RENAMO possui homens armados em Marínguè. Ninguém o desmente, todos o confirmam. E, confirmam quando justificam ou tentam justificar a razão para a sua existência. Ora, à partida, estamos perante uma razão sem razão. E, uma razão sem razão é uma razão que não existe. É, em princípio, a negação da razão. Ora, vejamos o que se diz e escreve sobre o acontecido, recentemente, em Marínguè. Para o “Zambeze”, a confusão começou quando um grupo de militares da segurança da Renamo decidiu sair à rua armados e devidamente fardados, numa operação de patrulha nalgumas das artérias da vila, começando pela pista do aeródromo local e a zona onde se encontra instalada a sede distrital da Renamo naquele distrito (...). Por sua vez, o “Savana” cita o secretário - geral da Renamo a reconhecer a existência de homens armados da RENAMO na vila de Marínguè, mas justificou a sua presença com a necessidade de proteger infra-estruturas do partido. Mais escreve, que Mamade revelou que a RENAMO possui um efectivo de 20 mil homens na reserva que poderão ser mobilizados caso o partido seja provocado. Ora, até aqui e desde já, pelo menos duas conclusões podem ser tiradas. A primeira, é a de que a RENAMO, efectivamente, tem e está a utilizar homens armados e fardados com determinados objectivos. Seus. Partidários. A segunda, é de possuindo 20 mil reservistas que podem ser mobilizados caso possa ser provocada, significa exactamente isso. Significa que se esses reservistas não foram mobilizados foi pelo simples facto de ninguém ter provocado a RENAMO. Para além da dúvida sobre a capacidade em mobilizar 20 homens armados. Uma leitura do livro do general Xisto Pereira, chefe de um dos muitos serviços secretos portugueses, sobre o apoio de Portugal à RENAMO durante a chamada guerra dos 16 anos, aconselha alguma prudência nos números.


Durante alguns anos, após a assinatura dos Acordos de Roma, predominou a tese de que a RENAMO teria muitas dificuldades em transformar-se em partido político. Em abandonar as armas, em definitivo. A realidade e os acontecimentos mais recente, provam exactamente que assim é. Que estamos, ainda, perante um movimento armado e não perante um partido político. Perante um movimento que continua a procurar defender as suas ideias e os seus ideais através dos fuzis. Ora, levanta-se aqui já uma outra questão. E esta já não se situa no campo na razão. Talvez possa e deva situar-se no campo da Lógica. Mas, também, do Direito. E a questão que se levanta, é a de procurar resposta para saber como um membro do Conselho de Estado tem capacidade para mobilizar 20 homens. Que a serem mobilizados não o serão, em momento nenhum, para defender interesses do Estado. Há, acreditamos que haja, no meio de todos estes percursos sinuosos, em todas estas curvas e transgressões, motivos mais do que suficientes para se repensar sobre o que se pretende com a realização da Cimeira Europa-África. É que seja muito, seja pouco, seja nada, a participação de Moçambique deve ter como condição a retirada de apoios a uma RENAMO armada. E o retornar dos antigos agentes da PIDE para aqui progressivamente, enviados. É necessário, sobretudo, ter coragem para transformar o colonialismo em passado.

domingo, setembro 02, 2007

Os desafios são muitos e constituem desafio à imaginação moçambicana

Reitores das Universidades públicas da Região Austral de África estiveram, esta semana, reunidos em Maputo. E terão definido o desenvolvimento da agricultura e o desenvolvimento das zonas rurais como uma das prioridades dos currículos de ensino e aprendizagem. A definição, em princípio e até prova em contrário, não poderia ter sido mais justa, mais clara, nem mais correcta. Mas, e parece ser essa a questão de fundo, não basta formar. Torna-se necessário levar os formados para o campo, para os distritos. Torna-se necessário que os formados em técnicas agrícolas, pecuárias, silvicultoras não sejam colocados em gabinetes nas cidades. E, em simultâneo que, quando colocados no campo, lhes sejam proporcionados meios de investigação. E, meios para que, os resultados desta, possam, efectivamente, beneficiar o camponês. A introdução da semente melhorada é, na generalidade, um primeiro e importante passo para o aumento da produção agrícola. Mas, não será o único nem o decisivo. Não menos importante, parece ser o trabalho que conduza à eliminação do uso da enxada de cabo curto. E á introdução de meios tecnológicos de produção agrícola mais modernos. Logo, que permitam ao camponês gastar menos energias na sua produção. De outra forma, produzir mais e melhor com o mesmo gasto de energia. Humana. Sem perder de vista que a proibição de sementes genéticas é condição essencial para eliminar o ciclo da perpetuação da pobreza. Como todos sabemos, a semente genética tem um único ciclo de vegetação. E o camponês a quem seja fornecida hoje semente genética, necessita de semente genética para produzir na próxima campanha. O mesmo é dizer que caiu no ciclo infernal de dependência das multinacionais. E que, no próximo ano, só poderá produzir com nova semente. Obrigatoriamente importada. Vinda do estrangeiro.


A produção de riqueza nacional, ou, dito de forma diferente e por oposição ao chamado combate à pobreza, pode ter de passar por estratégias diferentes. E, em definitivo, deve passar. Primeiro, parece necessário criar oposição à concepção fundamentalista dominante, imposta do exterior, sobre trabalho de menores, conservação da natureza e ecologia. E, incentivar o camponês a produzir a galinha, o pato, o coelho, o cabrito. Mas, também, e sem receio, a caçar a gazela, o chango, o cabrito bravo, a galinha do mato, o javali, o porco preto. Para melhoria da sua dieta alimentar e para a comercialização. Como fonte de rendimento. Da mesma forma, parece útil e necessário, fundamentalmente e sobretudo, garantir condições para a conservação da produção nacional e a sua transferência. Dos locais de produção para os centros de consumo. Quer no país, quer no estrangeiro. Os desafios são muitos e constituem desafio à imaginação moçambicana.