domingo, abril 24, 2011

Colocar o comboio a circular nos carris

Quem por hábito ou por dever de ofício de escreve, fica sempre à espera que a sua crítica ou sugestão seja acolhida. Que aquilo que considera como erros, defeitos ou situações e formas de actuação menos correctas, menos claras, possam vir a ser alteradas. Corrigidas. Muitas vezes tal não acontece. Embora pareça ser e se apresente como mais fácil e mais lógico alterar uma qualquer forma de actuação. Do que persistir no erro. No errado. É assim que quando a crítica encontra acolhimento tal resulta em satisfação por parte de quem criticou. De quem sugeriu algo. Pode enquadrar-se neste caso uma decisão recente do INAV. No sentido de só fazer exigir certificação de inspecção de veículos automóveis e a nova carta de condução a partir de Julho próximo. Antes do mais, surge como uma medida acertada. E que irá, certamente, colocar fim a todo um processo sinuoso. De diz hoje uma coisa, amanhã outra. Segundo o “Notícias” (edição de 20 do corrente, página 5), “Uma das razões que forçou as autoridades a recuarem com a fiscalização e penalização dos condutores teve a ver com a falta de centros de inspecção aos veículos em todas as províncias, de modo a que todos pudessem se beneficiar dos serviços”. Acrescenta o matutino que “No que tange à troca da carta de condução cor-de-rosa, o INAV foi obrigado a fazer vários adiamentos para que mais condutores pudessem obter a licença de condução biométrica.”. Afinal, parece ter chegado ao fim a novela. Que se prolongou por demasiado tempo. Desnecessariamente. Assim os respectivos serviços de atendimento ao público se mostrem capacitados e disponíveis.



De saudar, é, igualmente a posição assumida pelo director-geral do mesmo Instituto. O citado diário, no referido dia (página 3), titula que, no que respeita à formação de condutores, “INAV ameaça fechar escola do MINT”. A local, assim resumida, pode parecer uma bomba. Mas, não é. A afirmação tem fundamentos e, ao que parece, suporte legal. É que, o referido responsável ao visitar escolas de condução, detectou várias irregularidades. Uma das quais “é o facto de cerca de 80 por cento dos que frequentam o estabelecimento não pertencerem aos quadros do MINT, tendo considerado ‘concorrência desleal’ às escolas de condução que têm de pagar impostos.”. Adianta a notícia que, “como centro de formação, está isento de qualquer contribuição fiscal, por isso cobra 1400 meticais no acto de matrícula, contra pouco mais de quatro mil meticais em vigor em algumas escolas de condução.”. Para o responsável do INAV, que terá detectado várias irregularidades de funcionamento, “o centro tem estado a receber candidatos que não fazem parte deste grupo-alvo, o que, para ele, é uma ilegalidade.”. Para além de concorrência desleal. Acrescentamos nós. E, concorrência desleal praticada por uma instituição do Estado. Ou por ele tutelada. Em prejuízo de privados que exercem a sua actividade legalmente. E que, também, certamente, são cumpridores dos seus deveres fiscais. Digamos que não é sempre, que não é todos os dias, que são raras, atitudes como esta. De um servidor do Estado que aponta erros, falhas ou ilegalidades no funcionamento de instituições tuteladas pelo mesmo Estado. Que uns procuram servir e de que outros procuram servir-se. Sejam quais venham ser as consequências deste posicionamento público, alguém terá atirado uma pedra no charco. Num dos muitos charcos que nos rodeiam. Por haver entendido, possivelmente, já ser tempo de colocar o comboio a circular nos carris.

domingo, abril 17, 2011

recuar quando não há espaço para avançar

Saber
Parece estar a tornar-se normal. Parece estar a tornar-se prática de governação. O que a ser assim, a confirmar-se ser assim, a confirmar-se que é assim, trata-se de transformar o anormal em normal. Daí que, o vir a ser assim, poderá colocar-nos perante uma aberração. Que em nada abona a favor de quem tem por dever e por missão governar. O que não sendo tarefa fácil, nos tempos que correm, ou por isso mesmo, exige mais ponderação. Estudo aprofundado e análise dos efeitos ou consequências das medidas tomadas. Antes de serem anunciadas, divulgadas publicamente. Caso contrário, acontecerá o que está a acontecer nos últimos e tempos mais recente. Ou seja, hoje é divulgada uma medida, uma decisão. Como certa ou acertada e definitiva. Amanhã, uma semana depois, são anunciadas alteração ou correcções a essa medida ou decisão. Em consequência de reacções populares ou empresariais. Que conduzem a uma avaliação mais aprofundada, a novos estudos mais realistas. Mais de acordo com as realidades nacionais e as capacidades internas de execução. Exemplos não têm faltado em tempos recentes.


Foi grande, foi enorme, como todos estamos recordados, a confusão lançada em torno de quanto são transportes e comunicações. Desde a inspecção obrigatória de viaturas à troca de cartas de condução, passando pela aquisição de barcos destinados ao transporte público na Baía de Maputo. Que continuam a não navegar por falta de dinheiro dos potenciais utilizadores. Mesmo depois de a tarifa inicial ter sido reduzida para metade. O tempo, que parece ser, ainda, o melhor conselheiro do homem, veio demonstrar que as duas primeiras não eram exequíveis. No tempo definido e no espaço em que deviam ter efeito. Por fim, sucedeu o caso do registo obrigatório dos telefones do pré-pago. Decretado em Setembro de 2010 e prorrogado por duas vezes. Acompanhado da ameaça de bloqueamento caso não fosse cumprida a decisão governamental. O certo, é que parece que não foi. Tão pouco o será. A avaliar pelas palavras pelas palavras do director executivo da Vodacom. Que, recentemente (última edição do “Magazine”), terá afirmado que a “Vodacom não vai bloquear nenhum número que não tenha sido registado porque até agora ainda não estão criadas as condições para que tal decisão possa ser efectivada”. Trata-se, ao que parece, de dar um passo em frente e dois passos para trás. Ou talvez, ainda, pior. Em sentido idêntico, parece terem caminhado algumas medidas recentes do Conselho de Ministros. Que, depois de críticas de vários sectores da sociedade, começaram a sofrer correcções. Sobre o que foi deliberado na última sessão do Conselho de Ministros, titula o jornal “Notícias”, (edição de 13 do corrente) que foram “Alterados critérios para cesta básica”. Em seguida, o matutino informa que “Os cidadãos cujos rendimentos mensais sejam iguais ou inferiores a 2500 meticais são agora elegíveis à cesta básica recentemente introduzida pelo Governo, com o objectivo de apoiar pessoas de baixa renda”. Segundo a explicação que se segue, “a mudança resulta da alteração de critérios de elegibilidade inicialmente estabelecidos (...”. Para o porta-voz da sessão do Conselho de Ministros, “a alteração dos critérios fora prevista aquando do lançamento do programa, altura em que o Governo prometeu aperfeiçoar os mecanismos antes da entrada em vigor da medida (...). Seja. De qualquer forma, no caso de medidas do género, de profundo impacto social, parece aconselhável mais prudência. Mais ponderação. O que não impede que se possa firmar que é digno saber recuar quando não há espaço para avançar.

domingo, abril 10, 2011

forma eficaz de combater a pobreza urbana

Uma

É, ou parece ser, hoje, claro para todos nós, estarmos perante um crescente e galopante aumento do custo de vida. Que poderá agravar-se nos próximos meses. Seja, quando forem retirados alguns subsídios a determinados produtos. Actualmente suportados pelo Estado. Logo quando isso aconteça, o Governo já veio a público anunciar a entrada em vigor de umas outras tantas medidas. Com o intuito, com o objectivo de tornar possível a sobrevivência dos concidadãos com menores rendimentos. São medidas, até ao momento, pouco claras. Tanto no que se refere à forma da sua aplicação e da sua execução, como quanto à sua abrangência. Em proveito de quantos se pretende que sejam os primeiros e únicos e únicos beneficiários. Há, convenhamos, até ao momento, enormes zonas de penumbra, Que, em nada, contribuem para criar tranquilidade geral. Menos, ainda, abonam em favor de uma gestão transparente. Em primeira análise, e isso parece ser sentimento geral, a introdução das medidas anunciadas apresenta-se com poucas possibilidades de sucesso. De atingir os objectivos anunciados como os pretendidos. E, não será necessário recordar, aqui, uma tendência dominante em situações semelhantes. Que é a de os pobres se tornarem impacientes. E, por serem pobres terem muito pouco ou nada a perder. Foi assim em todos os tempos e em todas as épocas históricas. Em diferentes locais. Façamos votos para que impere o bom senso e a capacidade de análise. Por forma a evitar que uma versão actualizada desses levantamentos, dessas revoluções populares e descomandadas tenha por cenário Moçambique.



Como se não bastasse o agravamento do custo de vida por esta via, a que alguns chamam de inflação importada, também acontece por outra. Pela via interna. E esta, a interna, tem nada a ver com o aumento do preço do petróleo, da farinha de trigo ou do arroz. No mercado internacional, claro. Tivéssemos nós, de facto, uma associação de defesa dos consumidores e muitas coisas poderiam acontecer de forma diferente. Mas, não temos. Legalmente, parece que temos duas. Na prática, a actuar em defesa do consumidor, temos nenhuma. O seu trabalho visível é igual a zero. É nada. Mas, como se tudo isto não bastasse, também nos está a cair em cima, também nos está a sair do bolso, o aumento de impostos e de taxas municipais. Primeiro, foi o escandaloso aumento do Imposto Predial Autárquico. Que, houve quem tenha vindo a público defender, de forma acabrunhada, infantil e nada convincente, tratar-se de uma actualização dos valores. Pode ser verdade. Mas será uma verdade que não convence nem uma criança acabada de entrar para a escola primária. E que, admitamos, mesmo quando possa ser legal se apresenta como ilegítima. Para governar bem, mesmo só para governar, é necessário ter legitimidade. O que, e ao que parece, está a ser uma condição e uma qualidade cada dia mais rara. Agora, e por fim, anuncia-se que “Parquímetros operam a partir desta semana” na capital do país (“Notícias” de 4 de Abril corrente). A local, parca em pormenores e como se está a tornar normal entre nós, não informa sobre qual o dispositivo que dá cobertura legal à decisão municipal. Possivelmente, nenhum. É que, como todos sabemos, num Estado de Direito, não basta um vereador municipal vir a público manifestar os seus desejos, os seus sonhos, para que tal se transforme, por simples magia, em postura ou em lei. Trata-se aqui, como em diferentes outros, de uma situação sinuosa e pouco clara. Nada clara. Quando não de abuso de poder legislativo, de total falta de legitimidade de governação. Segundo esta ideia maquiavélica, vamos ter de pagar por tudo e por nada. Vamos ter de passar a pagar pelo que fazemos e pelo que não fazemos. Já pagamos para poder circular e agora iremos ter de pagar por não circular. Por estacionar a viatura em determinados locais que os sábios, que os sages cá do burgo nos irão dizer quais são. Segundo os seus critérios. Bendito país é o nosso onde ainda não foi criado um imposto sobre a incompetência. Por certo, seria um contributo importante, uma forma eficaz de combater a pobreza urbana.

domingo, abril 03, 2011

O primeiro tiro saiu pela culatra

Ler jornais devia significar ficar informado. Ficar mais bem informado do que quem não lê. Mas, nem sempre assim acontece. Por vezes, não raras, sucede o inverso. Sucede o contrário. Sucede que a notícia que nos é dada a ler, desinforma. Baralha e confunde o leitor. O que pode resultar de deficiente trabalho por parte de quem escreveu. Como também por lhe ter sido fornecida informação e dados menos claros. Digamos, confusa ou parcial. Não abrangente. Não cobrindo todos os campos e todas as áreas que era suposto dever cobrir. Ora, partamos do princípio que a informação serve e favorece sempre quem a dá, quem a liberta. Sendo assim - e ainda está por provar que não seja sempre assim -, estamos diante de notícia que não responde aos desejos, aos anseios ou aos interesses de quem lê. Sem querer misturar assuntos, questões, é como o que sucede bastas e frequentes vezes. Em querer atribuir ao jornalista o dever de respeitar o “segredo de justiça”. O que parece óbvio mas que nem sempre é aceite, é que o “segredo de justiça” constitui matéria que apenas diz respeito aos funcionários do Aparelho da Justiça. Ao jornalista compete respeitar outras regras e outras normas. A começar pelo direito à Informação. Se luta ou não por tal, é uma outra que questão.


Não nos dispersemos, não percamos de vista a questão central. A título de exemplo, deixemos uma notícia publicada na última edição do “Magazine Independente”. Informa o semanário que, em 2010, “EDM atingiu seis mil milhões de meticais em lucros”. E, logo a seguir diz que “A Electricidade de Moçambique (EDM) atingiu em 2010, cerca de seis mil milhões de meticais de lucros totais, não obstante a crise económica e financeira internacional. Este crescimento situou-se na ordem dos 13 por cento se comparados com os lucros obtidos em 2009.” De seguida, o jornal dá espaço ao PCA da EDM para apresentar dados que pretendem justificar o título. Dados e percentagens que, a nós simples consumidores de energia de baixa tensão, nada dizem, em nada esclarecem. Depois, e, em aparente contradição com o escrito anteriormente, acrescenta: “As receitas registadas no ano passado estiveram perto dos seis mil milhões de meticais (...).”. Entre o título da notícia, o parágrafo de abertura e o anteriormente citado parece haver uma contradição gritante. E há. É que num momento fala-se em lucro e noutro em receita. O que não é exactamente a mesma coisa. Pelo contrário, são coisas completamente diferentes. E que podem permitir o levantar de muitas outras questões. Questões que não são marginais nem periféricas. É, isso sim, centrais. Uma delas, é sobre a imposição do sistema pré-pago. Outra, é sobre os aumentos do preço da energia a quem utiliza este sistema. Sempre e quando a quem fornece a energia lhe apetece porque tem o poder arbitrário de proceder ao seu corte. Estranho, no meio de tudo isto, por entre toda esta vozearia, perante as tentativas para demonstrar tanto crescimento, tanta melhoria, Tanto lucro, sejam sempre os mesmos a pagar a crise. E a sofrer os aumentos nos preços da energia. Pode ser que não. Pode ser que esta tentativa de mostrar serviço ao patrão seja honesta. Como pode ser resultado de vaidade ou de ingenuidade. Tudo, afinal, fraquezas humanas. A realidade e a experiência demonstram que, em muitos casos como o presente, o primeiro tiro saiu pela culatra.