domingo, junho 20, 2004

Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo de 20 de Junho, 2004

antes e depois

Luís David


Queremos diálogo entre moçambicanos


Muito bem. Obviamente que sim. Que todos estamos predispostos para o diálogo. Que todos estamos dispostos a dialogar sobre a melhor forma de gerir ou de gestão das áreas comuns dos condomínios. Aliás, trata-se de um desejo manifestado repetidamente. Assim, é de saudar a posição divulgada, esta semana, publicamente, pelo Governo. Através do Ministério das Obras Públicas e habitação. É que, afinal, esta é a posição que lhe conhecíamos de muitos anos atrás. Pena é, isso sim, que não tenha sido dada continuidade a um processo iniciado com base na confiança mútua, na sinceridade, na harmonização de interesses. Pena é, também, que tenham passado vários anos sem nada se fazer. Sem nada ter sido feito. Anos de um vazio absoluto. Ou, talvez não. Talvez tenham sido anos que alguns aproveitaram para sugar as últimas gotas de leite da teta da vaca. Uma vaca velha de idade, decrépita, moribunda. Uma vaca que, desde há muitos anos, dera o que lhe era possível dar. Por isso, por todo este processo de tentar sacar à vaca um leite que ela já não podia dar, foi um tempo perdido. Foi um tempo perdido, inútil e maldosamente, no processo de organização dos condomínios. E, como todos sabemos, o tempo perdido não se pode recuperar. O tempo passado, é, sempre, tempo passado. Da mesma forma que, nas revoluções não é possível “queimar” etapas. Tudo tem o seu tempo. Tudo tem o seu ritmo.


Concordemos, pois, que todos estamos predispostos para o diálogo. Mas, há, existe, porém, uma questão que não parece de menor importância. É que, quando se fala em diálogo é necessário que haja duas ou mais pessoas ou entidades dispostas ao diálogo. O diálogo não é um processo de sentido único. Unilateral. O diálogo é um processo de sentido bi ou multilateral. E a APIE não é, hoje, como não o é, desde há muitos anos, um parceiro de diálogo das Comissões de Moradores. A APIE é, simplesmente, um condómino, como o são muitas dezenas de milhares de cidadãos moçambicanos que compraram as suas casas ao Estado. A APIE não tem mais nem menos direitos, não tem mais nem menos poderes sobre a propriedade imobiliária registada em seu nome. Ainda pertença do Estado. Sabe e reconheceu esta filosofia o Ministério das Obras Públicas e Habitação. Daí o ter criado um Gabinete para gerir os interesses em conflito. Um Gabinete dotado, à data da sua criação, de engenheiros, de arquitectos e de outros técnicos qualificados. Que se deslocaram a mais de uma dezenas de prédios da cidade de Maputo onde, na presença das Comissões de Moradores, fizeram um levantamento dos problemas e das deficiências dos edifícios para, posterior, reparação a custas do Estado. As Comissões de Moradores organizadas são muito anteriores à actual direcção da APIE. Com elas, com essas Comissões de Moradores, já dialogava o Ministério das Obras Públicas e Habitação antes de a actual direcção da APIE ter chegado ao poder. É, portanto, falsa e não passa de mentira barata a mensagem que a directora do APIE da cidade de Maputo anda a tentar fazer passar. Ao dizer que as Comissões de Moradores tiveram cinco anos para se organizarem e não se organizaram. Perguntemos, então, nós, o que fez a APIE nestes últimos cinco anos. A resposta só pode ser nada. Ou, então, que vendeu e alienou áreas pertencentes aos espaços comuns dos edifícios. Em prejuízo dos condóminos. E que continua a receber rendas de outros espaços que cedeu ilicitamente. Ilegalmente. Sejamos claros e para finalizar: Diálogo sim, diálogo com corruptos e com representantes dos interesses neocoloniais, não. Diálogo com fascistas, não. Queremos diálogo entre moçambicanos.