domingo, fevereiro 13, 2005

Publicado em Maputo, Moçambique, no Jornal Domingo de 13 de Fevereiro, 2005


antes e depois

Luís David


quem trava esta falta de moral e de ética

No nosso país, com não rara frequência, falamos da falta de valores. Da perda de valores. Elaboramos sobre comportamentos que consideremos errados. Á imagem do que foram os comportamentos de ontem. Que tomamos como modelo, como ideal. Dizemos que já não há Ética nem Moral. Mais e invariavelmente, o mal é dos outros, o mal está nos outros. Com os pais que não sabem educar os filhos ou com os filhos que não respeitam os pais. O mesmo é dizer, os mais velhos. Temos, quase sempre, um horizonte curto. Limitado. Não no atingir da vista mas no alcançar do pensamento. Pensamos curto. E, pensar curto, pensar que o mundo e o mundo actual ainda não vai para além da nossa rua, do nosso bairro, da nossa cidade, do nosso país é limitar, à partida, a solução. Queremos viver, queremos fazer repor a ordem antiga. Por pretendermos que seja melhor do que a actual. Queremos viver no presente o passado. Não percebemos que o passado foi, o presente é, o futuro será. Apelamos para a ajuda da Igreja, pedimos à sociedade civil para agir. Uma sociedade civil que ninguém sabe, nem mais nem menos, o que é. Que hipoteticamente só possa existir em teoria. E, esquecemos, ou fazemos, voluntariamente, por esquecer, dois elementos que parecem ser fundamentais: Nós próprios, cada um de nós, e o Estado. Ou, se assim se preferir, por ordem inversa, o Estado e cada um de nós. Onde, cada um de nós não pode abdicar da missão de pressionar o Estado no sentido de impor, repito, impor aquilo que devam ser os valores éticos e morais dominantes.


Pode parecer repetitivo afirmar que estamos a viver numa fase de capitalismo selvagem. Numa fase de capitalismo sem regras, sem normas, sem ética, sem moral. Pode parecer mas não é. Basta tomarmos como exemplo as campanhas publicitárias que estão a ser desenvolvidas pelos dois operadores de telefonia móvel. Campanhas essas que estão a custar muitos milhões de contos. Para concluir ser necessária e urgente a intervenção do Estado. Diz o anuncio de uma dessas empresas: Josefina, te agramo muito. Trata-se, obviamente, de um texto escrito por um burro. E, como os burros, nas últimas eleições, não tiveram direito a voto, deve ser tornado público quem escreveu o texto. Sobretudo, para que as nossas crianças e os adolescentes não adoptem este mau exemplo de escrever português. A outra empresa de telefonia móvel, que tem revelado um total incapacidade para escrever textos, bons ou maus, optou por utilizar imagens de símbolos e de Heróis Nacionais. Craveirinha e Samora fizeram bem mais por Moçambique do que aquilo que pretende que eles possam ter feito para poderem, para se darem ao direito, de utilizarem as suas imagens em campanhas publicitárias de medíocre qualidade. Sem criatividade, muito menos imaginação. Gostava também de saber, apenas por simples curiosidade, se os familiares de Samora e de Craveirinha autorizaram a utilização das fotografias dos seus mortos em anúncios publicitários. Se sim, tudo bem. Devem ter recebido muitos milhões e devem dizer, publicamente, quantos. Se não, devem dizer, igualmente, como pensam proceder. Ao Estado, ao Estado moçambicano, deixo o pedido, singelo e humilde, de esclarecimento se imagens de Heróis Nacionais podem ser vulgarizadas em campanhas publicitárias, em minha opinião, medíocres. Que enfermam de um mínimo de imaginação e que se situam no campo do oportunismo político. Bem sei, a mediocridade e a incompetência nunca pagaram imposto. E, terá sido o que valeu a muitos. Mas, hoje, o desafio está sem saber quem trava esta falta de moral e de ética.