domingo, outubro 02, 2005

Publicado em Maputo, Moçambique, no Jornal Domingo de Outubro 2, 2005

antes e depois

Luís David


a hipótese de existência de petróleo é sempre uma tentação

Desde a Segunda Guerra Mundial, todas as guerras, todos os conflitos armados, foram classificados como conflitos de baixa ou de pequena intensidade. Por peritos e por especialistas militares. Isto é, de guerras onde se procura investir o mínimo de dinheiro e envolver o menor número possível de homens e de armas. Contudo, não deixam de ser guerras sangrentas, não deixam de ser guerras destruidoras. Não deixam de ser guerras que provocam dezenas, centenas de milhares de mortos. Não deixam de ser guerras que levam à destruição de indispensáveis infra-estruturas sociais colectivas. Que provocam, em última análise, a destruição do tecido social. Na Ásia e em África, principalmente, todos guardamos memórias recentes de conflitos, de confrontos armados sangrentos. Por motivos étnicos, por motivos religiosos, por motivos raciais, por motivos políticos ou ideológicos. Também por motivos económicos. E, aqui, o petróleo, parece ser, é, determinante na maioria dos casos, na maioria dos conflitos. Seja qual tenha sido o motivo, Moçambique viveu um período de treze anos de conflito armado. Um conflito entre moçambicanos desentendidos, desavindos.


Amanhã, melhor, depois do amanhã, completam-se treze anos que em Roma foi assinado o Acordo Geral de Paz. Significa isto, entende-se, assim, que passam treze anos que vivemos em paz. Mas, esta paz, acordada em Roma, parece ser, cada dia que passa, uma paz jugulada. Uma paz cativa de ameaças e de pronunciamentos belicistas. Uma paz assente na chantagem. Sobre a possibilidade, talvez hipotética e remota, do retomar da guerra. Entre irmãos, entre famílias moçambicanas. De voltar a opor moçambicanos a moçambicanos. De dar ordens a moçambicanos para assassinarem moçambicanos. A paz, objectivamente, passa por caminhos diferentes. Talvez opostos. Passa, para além do silenciar das armas, por saber trilhar o caminho da reconciliação. Caminho difícil, sem dúvida. Mas, talvez único para quem se assuma como patriota. Sejam de quem sejam as culpas, os acontecimentos de Montepuez e Mocímboa da Praia constituem perigosos incidentes. Talvez, mesmo, perigosos precedentes. Mas, pior, mais perigoso, parece ser continuar a permitir, segundo declarações públicas, que existem homens armados, que existem exércitos privados em determinadas regiões do país. O Estado, o Estado moçambicano, sendo, que é, um Estado unitário, não deve nem pode permitir estes desafios. Não deve, nem pode, permitir este tipo de provocações. Não deve e tem obrigação de impedir manobras que tenham como objectivo desencadear guerras de secessão. Sendo que o espaço para tal seja cada dia mais reduzido, a hipótese de existência de petróleo é sempre uma tentação.