domingo, julho 04, 2010

Mendicidade fomentada

Na nossa sociedade, como em todas, no geral, são gerados e desenvolvidos fenómenos nem sempre fáceis de entender. Logo, de explicar. Por assim, se assim, necessitam de explicação aprofundada. Profunda. Por quem tenha capacidade, conhecimento, engenho e arte para o poder fazer. Digamos, também, o dever institucional de fazer mais de quanto tem feito. E de divulgar publicamente as conclusões a que chegou. E, a partir destas, as medidas tomadas, as medidas a serem postas em prática. Para corrigir e alterar situações que se apresentam como anormais. Que podem ser consideradas como anormais. Mas passíveis de ser modificadas. Corrigidas. Partindo do princípio que o homem, o ser humano, tem essas capacidades. Essas capacidades para corrigir, para modificar, para alterar. Para, assim, evitar e sair do imobilismo. Condição primeira para sair da dependência. Mesmo quando tal signifique criar dependências. Gerir dependências.


Vivemos num país dependente de donativos. Vivemos num país que luta por se libertar dos donativos externos. Mas, vivemos, também, num país onde pedir pode transformar-se em cultura. E, cultura do Estado, que o discurso oficial não consegue ofuscar. Mas, também, ou por isso mesmo cultura do cidadão. Não será, certamente, por mero acaso que, hoje, neste tempo presente, há um cada vez maior número de crianças, de idosos e de deficientes físicos a pedir nas artérias de Maputo. Não só de Maputo, como na maioria dos centros urbanos. Pedir, passou a ser normal. Seja com que pretexto, como que argumento. Seja para pagar o “chapa”, seja para comprar um pão, seja para comprar caderno ou lápis. Não raras vezes, comprovadamente, a moeda entregue através da janela nem visa nenhum desses objectivos. Serve, simplesmente, para jogos de batota na berma de um qualquer passeio. E, sem receio de erro, sem muita margem para erro, a culpa é, em primeiro lugar de quem dá. De quem dando, com a simples intenção de ajudar, pode estar a alimentar o que bem se pode definir como a “indústria da pedinchice”. É que, bem vistas as coisas, a quanto maior número se dá uma moeda, maior número surge a pedir no mesmo local. Nos dias ou nas semanas seguintes. Dizer que um pedinte que desenvolva a sua actividade em cruzamento ou esquina estratégica na capital do país, arrecada, por dia, muitas centenas de meticais. Por mês, muitos salários mínimos. Em igual período de tempo, vários salários de um professor primário ou de um enfermeiro. Sem outro esforço, sem outro conhecimento, sem outra necessidade de saber que vá para além do estender da mão. Aparentemente, estamos perante grupos organizados e fortemente hierarquizados. Que podem, muito bem, quase de certeza, obedecer a um comando. Que podem, muito bem, obedecer a um comando dirigido por estrangeiros. Que, pretensamente, dizem estar a combater o trabalho infantil. Mas que sem números, sem estatísticas, verdadeiras ou falsas, sobre o número de pedintes, deixam de ter razão para existir. Perdem o emprego. E, os chorudos salários. Daí, como necessidade de sobrevivência, terem como solução fomentar a mendicidade. Compete a nós investigar e esclarecer, internamente, se estamos perante casos de pobreza ou de mendicidade fomentada.