domingo, março 10, 2013

Não votar é um direito

Quem possa ter tido o privilégio de ver na internet as imagens sobre o que virá a ser a ponte Maputo - Catembe terá fica maravilhado. Aquilo é tudo beleza, tudo harmonia. Segundo as imagens, serão muitos quilómetros de alcatrão enquadrados em paradisíacos espaços verdes. Arborizados e arrelvados. Ou seja, o ideal a sobrepor-se ao real. Um trabalho perfeito “made in China”. A começar, em termos de imagens. De propaganda para nativo ver e embasbacar. Agora, a realidade, o real, parece apontar em sentido diverso. Parece apontar para um conflito de grandes proporções e de consequências imprevisíveis. Escrevendo sobre o que se está a passar no “Distrito Municipal de Katembe”, o “Notícias” titulava (página 2, edição de 5 do corrente) que Há barulha por causa da construção da ponte. E, logo a seguir, escrevia que Não há dúvida que o distrito municipal da Katembe está a ser foco das atenções dos vários residentes da cidade de Maputo e Matola, e também de investidores nacionais e estrangeiros. Ao que tudo indica, a corrida para a ocupação de espaços é frenética. Espaços, aqui, significam terra. A terra que a FRELIMO libertou mas que, hoje, é propriedade de apenas alguns. Poucos. Como se pode ler a seguir. Acrescenta a local que O início das obras de construção de novas infra-estruturas, nomeadamente a ponte Maputo – Katembe e as estradas que ligam aquele ponto aos postos administrativos de Ponta d’Ouro e da Bela Vista no distrito de Matutuíne e de Boane, na província de Maputo está a criar conflitos sem procedentes entre a edilidade e os nativos. (Sublinhado meu). Uma das moradoras na zona, terá dito ao matutino que adquiriu o seu espaço há alguns anos e numa manhã destas quando saía para o serviço deparei-me com um “X” numa das minhas casas e ninguém me explicou o seu significado. Foi quando soube que a minha casa iria ser removida para dar lugar às obras de construção da estrada (...). Outro morador na zona, terá explicado que não houve nenhum encontro entre os moradores e a edilidade para esclarecer os projectos que estão a ser implementados e que oportunidades existem para eles. Aparentemente, na sua visão, serão poucas. Ou nenhumas. Mas é necessário perceber, também, que eles, moradores, são incómodos. São inconvenientes. Estão no local errado. Nunca deveriam ter estado onde estão. Depois, ao que se diz resistem, às mudanças. Quer dizer, são reaccionários. Como se dizia quando a terra era do povo. Agora não. Estamos no tempo do vale tudo. Vejamos só mais este naco de prosa, esta explicação do referido matutino, dada por um vereador municipal, sobre o que se está a passar: O problema é que os nativos querem continuar a vender terrenos de forma ilegal mesmo depois do início das demarcações de espaços, alegadamente porque pertenciam aos seus antepassados e que são deles, por direito. Se leio bem o que se está a passar, estamos mais uma vez perante uma solução adiada para um conflito real e actual. Uma das muitas questões que se podem colocar relativamente à construção da polémica ponte, é se o Conselho Municipal da Cidade de Maputo (CMCM) está em condições de gerir os muitos conflitos de terras que se adivinham. Que já se avizinham. Que já começaram a surgir. Em grande parte, fruto e produto da sua ignorância, da sua incompetência administrativa, do seu desejo e gosto por dinheiro fácil. Resultado e consequência da construção de obras de fachada. Ou de obras mal adjudicadas. Como parece ser caso paradigmático a construção do prolongamento da Avenida Nyerere. Será que já ninguém vê o que está a acontecer na capital do país? Será que já ninguém olha por nós, simples munícipes pagantes de impostos e de taxas? Condenados a viver e a conviver com o lixo, os buracos, as águas estagnadas, a falta de água, os cortes constantes de energia eléctrica? Sem direitos a nada nem a coisa nenhuma. Nesta cidade de Maputo, o nosso único acto libertador é o de não ter de votar em próximas eleições. E poder afirmar que não votar é um direito.