terça-feira, maio 25, 2004

Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo de 23 de maio de 2004

antes e depois

Luís David

um acto de coragem


Poucas são as coisas que surpreendem. Pela positiva e neste país. Um país desgastado e descrente. Não por não ter motivos para crer. No sentido de acreditar. Mas, por tanto e tantas vezes lhe tentarem fazer acreditar que o que parece é. Quando muitas das vezes, quem sabe se na maioria das vezes, o que parece não é. É que o que é, é. E, o que é, de facto, é que o tal de Aníbal mais uma vez, pela segunda vez, saiu da prisão onde cumpria pena pesada. E, se saiu, como tudo indica que saiu, é porque foi deixado sair. Ou foi mandado sair. Parece, aqui, poder-se concluir que o que parece não é. Que estamos perante uma situação em que o que parece não é. E o que parece, ou se diz que é, é a BO ser uma cadeia de máxima segurança. Mas, não é. Está comprovado que não é. Porque não há cadeias de máxima segurança sem guardas da máxima confiança. O que há, todos o sabemos, são cadeias dotadas de meios de segurança e de vigilância mais sofisticados do que outras. Mas, não há nem pode haver cadeias de máxima segurança quando ou enquanto houver poderes que parecem sobrepor-se ao Poder. Dito de outra forma, poderes, aparentemente, paralelos. E, isto, sem que o Poder seja abalado, beliscado. Sem que o Poder se sinta ameaçado. E, aqui, então, o que parece, é. Ou, se não é, parece ser.


Em menor número, talvez, mas também há algumas que nos surpreendem pela positiva. Que nos levam a acreditar que este país, podendo parecer descrente, tem suficientes motivos para crer. E que possui uma significativa reserva moral para poder acreditar. Que há uma reserva moral que sabe colocar interesses colectivos acima de mesquinhos interesses pessoais. É nesta linha de pensamento que não pode passar sem referência, nem sem registo, a decisão do Conselho Municipal de Maputo. No sentido de mandar suspender as obras da chamada Catedral da IURD, em plena Avenida Julius Nyerere. Autorizadas, vá lá o comum dos cidadãos querer saber a troco de quê ou de quanto, pelos anteriores gestores municipais. A decisão tomada, esta semana, é, sem sombra de dúvida, aquilo a que se pode chamar uma “pedrada no charco”. No charco das águas turvas e putrefactas em que a capital do país estava a ser submersa. Em que foi mergulhada por pessoas sem moral nem escrúpulos, por gestores incompetentes e, bem pior que isso, corruptos. Claramente, ter mandado embargar as obras da dita Catedral da IURDE não resolve os muitos problemas da cidade de Maputo. Resolve um. Apenas um. Muitos outros, muitas outras decisões anteriores, necessitam análise cuidada. Necessitam, sobretudo, ser vistas numa perspectiva de abuso do poder e de má gestão. Para não ir mais além. E, esse mais além, é o de uma gestão corrupta. É preciso dar tempo ao tempo. Para já, é de justiça afirmar que travar a construção da dita obra trata-se de um acto de coragem.