segunda-feira, outubro 16, 2006

Publicado em Maputo, Moçambique, no Jornal Domingo de Outubro 15, 2006

antes e depois

Luís David


a situação preocupa


O tempo a que me refiro, é o tempo presente. É o tempo actual. É o de hoje. O espaço, o espaço é o da cidade de Maputo. E de suas periferias. De suas várias e múltiplas periferias. Ora, é neste tempo e neste espaço, neste tempo presente e neste espaço bem delimitado, que começa a ser difícil viver. Talvez e melhor, sobreviver ou continuar vivo. Quando se é honesto, quando se é cidadão honesto. E, neste como em todos os casos e situações similares, semelhantes, iguais, ser não é parecer. Ser é, exactamente, significa exactamente, ser. Porque o crime violento, o assalto com arma de fogo, está a aumentar. Está a crescer. De forma alarmante. O cidadão. Qualquer cidadão, hoje, na cidade de Maputo, corre o risco de sentir apontada uma arma de fogo à cabeça. Para lhe roubarem carro e bens pessoais. Depois, depois, procede como qualquer cidadão honesto pensa ser correcto proceder. Comunica a ocorrência à esquadra de polícia mais próxima. E, aí, a partir daí, começa o calvário, tem início o martírio. Um doloroso percurso. É que o início da investigação parece, ao cidadão honesto, estar a ser retardado. Que o processo está a demorar mais tempo que o necessário, que o justificável para chegar ao investigador. Cinco dias depois de ser roubado com uma arma apontada à cabeça, o cidadão honesto fica a saber que, sequer, a ocorrência foi comunicada aos postos fronteiriços. Para tentar evitar a saída da viatura do país. Sequer, à Interpol. Mais, que nessa tarde de sexta-feira não já não há ninguém para receber mensagens do lado de lá da fronteira. Logo, qualquer comunicação às Polícias dos países vizinhos só será feita segunda-feira seguinte. Naturalmente, e sem qualquer ofensa aos cidadãos honesto deste país, a questão que, obrigatoriamente, tem de ser colocada é se este comportamento pode ser enquadrado no combate ao crime ou ser visto como colaboração com o criminoso. Sem que se pretenda tirar conclusões precipitadas, parece poder concluir-se que, em certos casos, haverá alguma promiscuidade entre polícia e ladrão. Ou, então, concedendo o benefício da dúvida, as nossas polícias estão, ainda, amarradas a processos burocráticos tão antiquados, que só ao ladrão beneficiam.


De quando em quando, de quando em vez, de tempos em tempos, perante a pressão da opinião pública e dos roubados, dos baleados e dos assassinados, surge reacção. Infelizmente, e sem possibilidade de desmentido, apenas a nível de discurso político. Como foi o caso desta semana. Quem leu a primeira página do jornal “Notícias” da última sexta-feira, ficou informado que os “Comandantes da PRM prometem repor a ordem”. Isto na zona sul do país. Logo, se prometem repor a ordem, significa que neste momento não há não existe ordem. E, na verdade não existe. Mais, que são os próprios comandantes a reconhecer que não existe ordem. Aliás, as primeiras linhas da referida notícia são claras e elucidativas: A onda de criminalidade que nos tempos que correm ganhou contornos alarmantes, com a ocorrência de crimes violentos, nomeadamente com recurso a armas de fogo, poderá reduzir nos próximos tempos, com a concretização de acções coordenadas entre as unidades policiais estacionadas nas três províncias da região sul do país, incluindo a cidade de Maputo. Acrescenta a notícia que Esta promessa foi feita por Luís Magueza, novo comandante da PRM na capital, durante os trabalhos da sexta reunião dos governadores do sul, realizada esta semana na Namaacha. Ora, salvo melhor opinião, o que nós, o que todos nós queremos, como cidadãos honestos, pagadores de impostos, é bem mais do que promessas. É algo vá para além do discurso político. O que queremos, o que temos o direito de exigir é acção. E, perante a realidade que se vive na capital do país, o que queremos é que, se necessário, o senhor comandante vista o seu colete à prova de bala e dirija pessoalmente operações contra criminosos. A não ser assim, corremos o risco de ver aumentar o número de linchamentos. Até de inocentes. Como pode já estar a acontecer. Com toda a responsabilidade, no mínimo moral, das autoridades policiais. E, quando acontecem linchamentos, quando se sucedem os casos de justiça pelas próprias mãos, podemos estar a caminhar para uma situação sem retorno. Desejamos que não. É que a etapa seguinte, é o poder cair na rua. Mesmo que não, mesmo que o discurso político possa tentar ser tranquilizante, tranquilizador, a situação preocupa.