domingo, novembro 26, 2006

Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo de Novembro 26, 2006

antes e depois

Luís David


há interesses e há interesses

Há trinta anos, Moçambique produzia e imprimia o livro escolar. As primeiras centenas de milhar de exemplares foram impressas na rotativa da Tempográfica. Que, pouco anos após, viria necessitar de uma grande reparação. Ao que se dizia na época, principalmente devido à fraca qualidade do papel. Então, importado do Brasil. Em paralelo, ao que a memória recorda, foram sendo criadas condições para a criação do CEGRAF. Concluídas as obras e montado o equipamento, moderno na época, faltavam técnicos e operários. A solução foi encontrada, mais uma vez, recorrendo à Tempográfica. Que se viu, assim, privada dos seus operários mais experientes e mais competentes. Durante muitos anos, foi o livro escolar moçambicano impresso, na sua totalidade, em Moçambique. Naturalmente, o posterior crescimento gradual da rede escolar e do número de alunos veio criar novas exigências. Que começaram por ultrapassar a capacidade de impressão existente no país. Logo, tornou-se necessário procurar e encontrar soluções alternativas. Tornou-se forçoso recorrer a gráficas em diferentes países. E, se o desejado aumento de quantidade foi conseguido com relativa facilidade, nem tudo correu pelo melhor nos primeiros anos. É que, em termos de qualidade registou-se um abaixamento significativo. E que ia desde legendas de imagens trocadas a erros de ortografia. Situações que, ao que parece, o tempo também terá corrigido.


Durante um longo período de tempo, o investimento na indústria gráfica nacional foi quase nenhum. Ou, mesmo nenhum. O que significa que o parque gráfico nacional existente foi caminhando, lenta mas inevitavelmente, para uma quase total degradação. Moçambique perdia, desta forma, a capacidade de produzir artigos de qualidade. Em favor de empresas de países vizinhos e, até, de mais longe. De outros continentes. A partir de determinado momento, porém, a situação começou a conhecer um movimento inverso. Daí que hoje, de novo, se volte a ouvir falar em imprimir o livro escolar no país. Pelo menos, uma parte das necessidades. E, neste contexto, é de louvar, sem reservas, a posição assumida pelo Ministério da Educação e Cultura. A possibilidade que está a criar para que as gráficas nacionais existentes possam candidatar-se à impressão do livro escolar. Ou que outras se venham a instalar com idêntica finalidade. De resto, hoje, faz pouco sentido que, como norma, o livro escolar seja impresso, ano após ano, no estrangeiro. Afigura-se, para além de lógico, como normal e necessário que se comece a inverter a situação. Pode acontecer, e está a acontecer pelo que tem vindo a público, que alterações de normas e de procedimentos estão a produzir receios e reacções. Mas, como todos sabemos, mudanças provocam sempre resistências. Por certo, através do diálogo, será possível acomodar os interesses e os direitos de todos os intervenientes no processo. Contudo, o que não parece correcto nem admissível é recuar perante o objectivo traçado. Até porque há interesses e há interesses.