domingo, março 06, 2011

Evitar que o feitiço se revolte contra o feiticeiro

Em boa hora decidiu o Centro de Integridade Pública (CIP) proceder a uma investigação sobre a actuação da Polícia de Trânsito (PT). Ou, talvez melhor, sobre as suas diferentes formas de actuação. E, tornar público, divulgar, os resultados do oportuno trabalho que realizou. Não por nos ter vindo trazer grandes novidades. Não por nos ter vindo mostrar ou revelar algo que qualquer condutor não soubesse. Não saiba. Desde há muito. Mas por tal divulgação poder vir a ser importante contributo no fazer mudar comportamentos. No fazer alterar métodos e processos de actuação. Assim haja vontade, capacidade e força para agir. Voltando ao tema, a primeira parte da referida investigação veio publicada na edição do passado dia 3 do jornal “Notícias” (página 2). Titula o matutino: “Arbitrariedades e extorsões: A mácula da Polícia de Trânsito”. E, inicia a local com o seguinte texto: “O grosso dos agentes da Polícia de Trânsito (PT) continua a seguir comportamentos menos abonatórios, apostando na corrupção em forma de detenções arbitrárias, chantagem e extorsão”. E, para nos situar melhor sobre a dimensão do problema, que para além de problema adquiriu a dimensão de catástrofe, acrescenta: “Isto acontece a par do banho de sangue nas estradas nacionais e da existência de alguns polícias exemplares e incorruptíveis”. Aqui, também eu sou testemunha de que sim. E, entendo, em meu modesto entender que tais comportamentos deveriam ser registados e apontados como método de trabalho a seguir. Deveriam constituir norma de trabalho. Por exemplo, das muitas vezes que fui e sou mandado parar em plena cidade de Maputo, me foi dito coisa simples. E, também bonita: “Papá pode seguir. Já não tem idade para roubar carros”.



Sem ter tido acesso à totalidade do texto da investigação, parece oportuno começar por tecer algumas considerações sobre aspectos parciais. Sobre determinados aspectos. Aliás, já aqui e em diversas ocasiões abordados. Como é o da presença, actuação e protagonismo concedido à Polícia de Protecção (PT). Sobre a matéria, diz a investigação que “A concorrência a estes locais (de controlo), denominados postos bancos, é forte, traduzindo-se numa luta titânica envolvendo PT e PP, embora estes últimos estejam munidos de armas do tipo AK-47 com a missão de proteger os agentes de trânsito ou reagir em caso de fuga ou reacção armada por parte dos automobilistas, bem como efectuar revistas em viaturas suspeitas. [...] Todavia, ao invés de garantirem a protecção dos agentes de trânsito e ou revistas às viaturas suspeitas, os mesmos fazem-se passar por agentes de trânsito e interpelam os condutores, munidos de AK-47, exigindo cartas de condução e simulando a passagens de multas, sem no entanto possuírem algum livro de aviso de multas”. Aqui, de novo, levantam-se duas questões. A primeira, é para saber o motivo pelo qual uma multa não pode ser paga no local da transgressão. Real ou hipotética. É que assim, a continuar-se a proceder como se está a proceder, é o Estado que está a fomentar a corrupção. A segunda, a segunda questão, consiste em saber o motivo pelo qual se permite que a PT, os chamados “cinzentinhos”, por si sós, tenham autoridade, legitimidade e poder para travar a marcha, a circulação de um qualquer e pacato automobilista. Respondamos que autoridade e legitimidade não têm. Poder tem. É o poder de lhes terem concedido o porte de uma AK-47. Que muito provavelmente mal sabem manejar. Por serem miúdos e imbecis. O que tanto pode resultar de um erro como de uma opção. Para tentar justificar essas tantas balas perdidas. Que tanto matam. Até um dia. Até ao dia em que o feitiço se decida revoltar contra o feiticeiro. Ainda estamos a tempo de evitar que o feitiço de revolte contra o feiticeiro. Temos de evitar que o feitiço se revolte contra o feiticeiro.