domingo, setembro 23, 2012

Devolver ao povo o dinheiro que é do povo

Estamos perante um escândalo. Mais um. Desta vez, e ao que tudo indica, um escândalo financeiro. Talvez diferente de todos os anteriores. Por se tratar de um caso que já foi definido como “agiotagem”. Quando não de um roubo. Mais ou menos sofisticado. Mas de um roubo. E o que se passa parece ser bem simples. Trata-se, aparentemente de uma máquina, de uma engrenagem legal para ganhar dinheiro. Ilegal. Pelo menos e em último lugar, imoral. Vejamos o que escreve o jornal “Notícias”, na sua edição da passada segunda-feira, sobre alguns bancos de microcrédito. Titula, a toda a largura da primeira página que FARE denuncia manipulação de juros. Esclarece, logo a seguir, que Alguns bancos de microcrédito estão envolvidos em esquemas de empolamento ilícito das taxas de juro, nos empréstimos que concedem para o financiamento de actividades de produção de alimentos, geração de emprego e promoção do sector privado, sobretudo nas zonas rurais. Trata-se, ao que lemos a seguir, de uma denúncia feita pelo presidente do Fundo de Apoio à Reabilitação Económica (FARE). Segundo o referido oficial do Governo, (...) os bancos de microcrédito recebem fundos da sua instituição a uma taxa de juro que oscila entre os 6 e os 12 por cento, mas o dinheiro é vendido aos produtores das zonas rurais com juros que chegam a atingir os 60 por cento. De acordo com o matutino, citando o referido responsável, (...) o esquema adoptado atinge o extremo de “agiotagem inaceitável”, sobretudo por violar de forma grosseira as recomendação do Banco de Moçambique sobre a matéria. A local acrescenta que As taxas de juro aplicadas por algumas instituições de microcrédito nas zonas rurais são absolutamente obscenas. O FARE disponibiliza o dinheiro a taxas definidas em conformidade com os indicadores do Banco Central. Quer dizer, nós colocamos o dinheiro a um preço competitivo, mas chegam aos utentes finais a taxas inaceitáveis (...). Ignoro se a legislação moçambicana prevê o crime de agiotagem. E, se pune a agiotagem como crime. Mas talvez nem seja necessário ir tão longe e por vias sinuosas. Bem mais simples é querer saber se estamos ou não perante um crime. Muito hipoteticamente uma acção criminosa organizada. Praticada por pessoas e organizações identificadas. Facilmente identificáveis. Ora, se este Fundo, se o FARE tem como finalidade o financiamento de actividades de produção de alimentos, geração de emprego e promoção do sector privado, sobretudo nas zonas rurais parece que estamos a seguir por uma estrada sinuosa. Demasiado sinuosa. E que, com quase total certeza que não nos irá conduzir a nenhum bom local. A nenhum “bom porto”. Ou estamos enganados, e basta tentar provar que sim, o que se verifica é que estamos a impedir o desenvolvimento, a atrofiar o desenvolvimento. Em vez de promover o desenvolvimento Apenas uma questão bem simples. Demasiado elementar. Se eu, como cidadão, como acontece com todos os cidadãos normais, e que se pretendem iguais perante a lei, violar uma postura municipal, uma regra de trânsito, uma lei, posso e devo ser punido, de acordo com a infracção cometida, o que impede que outros, meus iguais o sejam de igual forma. Sem o necessário ponto de interrogação, trata-se uma dúvida. É que hoje, quando governo, Banco de Moçambique, instituições da Justiça já conhecem publicamente estes desmandos, custa compreender o motivo ninguém agiu, ainda, para repor a normalidade e a legalidade. De facto, uma coisa é ser povo. Lutar no campo para produzir. Para tentar criar riqueza. Outra e bem diferente, é vestir fato escuro, camisa branca, gravata na cor da moda. E fazer-se transportar em carro de luxo. Aqui, a questão que fica por saber é durante quanto tempo mais haveremos de ter de coabitar com estas salmonelas. A paciência, como tudo, incluindo a própria vida, tem limites. Talvez seja bom começarem a pensar em devolver ao povo o dinheiro que é do povo.