sábado, fevereiro 28, 2004

Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo
29 de Fevereiro 2004

antes e depois

Luís David




Queira o moçambicano, cidadão comum do país Moçambique, obter pedaço de terra para construir casa ou criar projecto agrícola. Seja qual seja o local preferido. Passa mal. Sendo que terra, que é o que há de mais, é sempre difícil de obter. Crédito, sendo moçambicano, é, ainda, um bem mais raro. E bem mais caro. È que, ao moçambicano, crédito bancário só é concedido mediante hipoteca de bem superior ao valor do empréstimo pedido, seguro do bem hipotecado, seguro de vida para o qual é exigido electrocardiograma, raio X ao tórax, análise às urinas e análise ao HIV/SIDA. Depois, depois se verá se o moçambicano terá, ou não, acesso ao empréstimo solicitado. Para trás ficam as despesas, de muitos milhares de contos, com a obtenção de documentos. De dezenas de milhar de contos, que tudo isto custa. Convenhamos que é difícil a vida do moçambicano. Que é difícil ser moçambicano em Moçambique.


O hipotético caso de tráfico de crianças, ou de órgão humanos de crianças, na província e Nampula, trouxe à luz do dia outras questões. Que podendo parecer marginais são, contudo, fundamentais para que nos possamos situar no país real. Na país Moçambique. Então explique lá, quem tem o dever de explicar, e quem tem o dever de explicar publicamente, quais os processos legais seguidos para conceder 300 hectares de terras a um casal de estrangeiros. E que explique, quem tem o dever de explicar, como é que uma instituição ligada ao Estado, no caso o GAPI, financia um projecto de duvidosa rentabilidade. Podemos ir mais longe. E perguntar qual a garantia do retorno. Aparentemente é nenhuma. E, podemos até perguntar, se é necessário que estrangeiros venham investir em aviários. Certamente que não. O moçambicano sabe criar galinhas. Sabe criar patos e coelhos. Em Maputo, como em Nampula.. E pode fazer essa criação, mesmo quando não tem os benefícios do investidor estrangeiro. A questão está em saber o que é isso do investido estrangeiro.