sábado, novembro 05, 2005

Publicado em Maputo, Moçambique, no Jornal Domingo de Outubro 23, 2005

antes e depois

Luís David


pode não ser simples acaso


Aconteceu durante semanas, ao longo de meses. Sempre em dias certos. Sempre pelas mesmas artérias da cidade de Maputo. Era a marcha ou desfile dos ex-trabalhadores na extinta RDA. Foi a forma que encontraram para reclamar direitos que defendiam ter. E, convenhamos, todos, todos têm o direito de defender os seus direitos. De reclamar e de protestar, quando sentem ou entendem que esses direitos não estão a ser respeitados. Outro aspecto, não menos importante, é que os direitos de uns acabam onde começam os direitos de outros. Quando se envereda pelo caminho da intimidação. Quando cidadãos pacíficos, quando transeuntes ocasionais de uma qualquer artéria, são ameaçados. E, ameaçados por nada. Quando se tenta negar a outros, o que através do protesto se quer defender. Ou, quando se ocupa propriedade alheia, quando se ocupa propriedade estrangeira. Aí, ao enveredar-se pelo caminho do excesso, corre-se o risco de perder a razão. A causa do protesto corre o risco de perder legitimidade. Corre o risco de perder legitimidade para protestar, quem por estes meios reclama.



Esta semana, estudantes bolseiros da Universidade Eduardo Mondlane entenderam reclamar. Reclamar, o que julgam ser direito seu e dever da parte contra quem protestam e reclamam. Protestar, no que foi apresentado como motivo público, contra o Regulamento das Bolsas. Assiste-lhes, sem reservas, todo o direito e toda a legitimidade para o fazer. Em sede própria, de forma pacífica e ordeira. O que não lhes assiste, é o direito de bloquear artérias e tentar impedir que outros cidadãos por elas circulem. O que não lhes assiste é o direito ao distúrbio, o direito de atentarem contra os direitos de outros cidadãos. Desta forma, ao procederem desta forma, perdem toda a legitimidade de protestar. Perde razão o protesto. A causa do protesto deixa de ter razão. Perde toda a legitimidade pretender defender opiniões, ou mesmo o que pensa ser direitos, violando o que é direito de outros. Publicamente consagrado. Possa ou não ser coincidência, a forma de protesto dos antigos trabalhadores na extinta RDA e a forma de protesto deste grupo de estudantes, encontra muitas semelhanças. Pode ser simples coincidência. Como pode não ser simples acaso.