domingo, novembro 06, 2005

Publicado em Maputo, Moçambique, no Jornal Domingo de Novembro 6, 2005


antes e depois

Luís David

uma forma de evitar investigar e descobrir a verdade

O caminho mais curto para evitar a verdade, para tentar travar a investigação sobre a verdade, é tentar perpetuar um dogma. Insistir no mito e criar o rito. Para que ambos, amanhã, sejam apresentados, sejam transformados em história. Como verdade. Absoluta. Ora, muito provavelmente, história e verdade podem ser processos incompatíveis. Por serem sempre processos. E, sendo processos, nada nos darem de definitivo. A não ser a dúvida. Não há, não terá havido até hoje, uma verdade definitiva. Como não houve uma história acabada. Verdade e história podem ser, neste plano, apenas conceitos. Conceitos que se adoptam como bons, como certos, como correctos. Válidos num determinado tempo, relativamente a um determinado espaço. Mas que, amanhã, podem mudar. Podem valer nada, coisa nenhuma. Basta para tal que aumente o nosso conhecimento, que surjam factos novos. Não aceitar que a descoberta de factos novos pode mudar a nossa visão da história, é missão do dogmático. Pior. O dogmático ao recusar o princípio da dúvida, como método de investigação, tenta fazer perpetuar o dogma. E, ao tentar perpetuar o dogma, tenta impedir a aquisição de visão outra, de visão diferente, sobre o que não sendo único, nem unilateral, pode bem ser diverso e ser diferente. Digamos, em resumo, que o dogmático, ao tentar impedir outra visão, visão diferente da sua, daquilo a que chamamos história, não passa de um medíocre falsificador da história. Ou, em termo popular, numa perspectiva história, hoje, o dogmático, equivale ao que, em termos económicos, o povo classifica como de informal.



Tudo o que existe, tudo o sabemos ou julgamos saber existir, hoje, tem um antes e tem um depois. Isto para que, alguns mais distraídos e pouco dados à investigação, possam entender, definitivamente, que para poderem perceber o que aconteceu num determinado momento, necessitam saber o que se passou antes desse momento. E, em nome da verdade, não digam apenas disparates sobre o que se passou depois. Especuladores, de lá e de cá tendem, hoje, ambos os dois, em vender a sua verdade, o seu dogma, sobre a morte de Samora Machel. Um, faz, em livro, leitura diferentes de documentos conhecidos publicamente, vai para vinte anos. De investigação, apresenta nada. Outro, nem isso. Repete, simplesmente, aquilo a chama de investigação. Feita por outros, Não por si. E, neste repetir o que outros escreveram, fica-se na dúvida sobre o que se pretende encobrir. Sobre o que se pretende que não seja, jamais, matéria de investigação. Sente-se que há medos sobre um investigação, jornalística, séria, honesta e imparcial. Sendo certo que investigar dá trabalho, também teremos de aceitar que investigar pode trazer algumas surpresas. Riscos. Que os assumidos detentores da verdade oficial não desejam correr. Samora Machel foi, sem a mínima dúvida, em missão de paz. Caso tivesse regressado a Moçambique, e todos os seus acompanhantes tivessem cumprido a sua missão, a situação na África Austral poderia ter sido radicalmente alterada. Continuar a tentar atribuir a morte de Samora Machel, unicamente, ao regime sul-africano da época, é simples e fácil. Mas continua, também, uma forma de evitar investigar e descobrir a verdade.