sábado, julho 08, 2006

Publicado em Maputo, Moçambique, no Jornal Domingo de Junho 25, 2006

antes e depois

Luís David


o petróleo tem muita força

Ouro, diamantes, petróleo. Três importantes fontes de riqueza. Três importantes elementos, três importantes factores de convulsão política. De lutas pelo poder político. Em casos extremos, motivo de guerra. Naturalmente fratricidas. Hoje, mais do que nunca antes, o petróleo constitui-se – ou pode constituir – factor destabilizador de um país, de uma região. Vivemos, desde há alguma décadas, numa economia assente, baseada, no petróleo. Numa época em que o desenvolvimento exige o consumo de mais e mais petróleo. Logo, parece compreensível que seja o petróleo que mais exércitos faz movimentar. Quer para o controlo das reservas, quer para o controlo das rotas de transporte. É assim no mundo inteiro. E, África faz parte do mundo. Sudão e Nigéria são exemplos actuais. Maus exemplos, claramente. Mas, são exemplos reais de lutas internas pelo controlo da exploração e pela distribuição da riqueza gerada com a sua venda no exterior. Em ambos os casos, que não serão os únicos a nível do Continente, podem existir conflitos étnicos e religiosos. Há sinais da existência de um profundo conflito entre cristianismo e Islão. Neste contexto, embora, aparentemente, possamos estar perante guerras de baixa intensidade, estaremos, igualmente, perante conflitos de duração prolongada. E, logo, só por si, consumidores de uma riqueza que se pretende equitativamente distribuída.


A um outro nível, ao nível dos países integrantes da CPLP, Angola foi o que serviu de cenário ao conflito mais prolongado. No período posterior à independência de cada um. Poderá dizer-se, sem margem para acusação de especulação, que à guerra angolana não é estranho o facto da existência de diamantes e de petróleo. Principalmente petróleo. Ao longo da sua história recente, a Guiné-Bissau tem sido, terra de golpes e de contra-golpes. Mas, também ali há petróleo. A São Tomé e Príncipe, em tempos idos terra de escravos e da monocultura do cacau, bastou o cheiro do petróleo. Logo começaram as lutas internas pelo poder. Pela posse da riqueza. Mais recentemente, foi a vez de Timor-Leste engrossar a lista dos países em convulsão política por culpa do petróleo. Também aqui, como em muitas outras partes do mundo, o petróleo está a fazer movimentar exércitos. Já está a fazer movimentar exércitos. De países vizinhos, uns, como a Austrália. De país bem longínquo, outro, como Portugal. Subjacente a esta crise política e institucional, podem estar, e parecem estar, conflitos entre elites locais. Obviamente, com interesses radicados no exterior. Mas, e talvez pior do que isso, podemos estar perante o reacender de um conflito religioso secular. Que teve a sua origem quando o primeiro português ali chegado pretendeu criar meia ilha cristã num mar de ilhas muçulmanas .Meia ilha cristã, repita-se, como espinho encravado no país com maior população muçulmana do mundo. Naturalmente, haverá muitos outros factores que conduziram ao despoletar da presente crise. Há. E há, sobretudo, muito oportunismo. Que pouco ou nada terá a ver com os interesses nacionais, com os interesses do povo timorense. Os próximos dias serão decisivos para se saber quem vence. Se vence o petróleo ou se vence a religião. Na certeza, porém, de que o vencedor de hoje poderá não ser um vencedor definitivo. E com a certeza de que o petróleo tem muita força.