sábado, julho 08, 2006

Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo de Julho 2, 2006

antes e depois

Luís David


interesses cruzados

Decorria o ano de 1985 quando a RENAMO destruiu cerca de 300 torres de transporte de energia de Cahora Bassa para a África do sul. Ao tempo, Portugal não terá reagido. Não terá tomado uma posição pública de condenação. É necessário entender que era um tempo em que, de forma aberta ou encoberta, apoiava, de diferentes maneiras, o movimento que Afonso Dhlakama já dirigia. Mesmo perante elevados prejuízos financeiros. Como terá sido o caso, pela sua qualidade de principal accionista da hidroeléctrica. Ora, acontece que a guerra, todas as guerras, obedecem a estratégias complicadas, difíceis de entender. Sem lógica. As referências, tantas vezes feitas, ao envolvimento a militares no activo ou a serviços secretos, parecem querer dizer exactamente isso. Parecem provar que os objectivos pelos quais se diz declarar uma guerra podem não ser aqueles que se pretendem atingir. E, esta guerra passou, sem margem para dúvidas pelos interesses do eixo Salisbúria-Pretória-Lisboa. Negar que assim não foi, será como negar a história. Como será negar a história não entender que as motivações e os objectivos de quem lutava não eram exactamente os mesmos de quem, do exterior, mandava destruir, raptar, matar.


Após prolongadas e demoradas conversações, o processo parecia próximo do fim. Parecia que Portugal, finalmente, havia aceite fazer uma negociação séria. Havia compreendido que os objectivos que ditaram a construção da barragem pertencem ao passado, pertencem a outro tempo, pertencem ao tempo do senhor António de Oliveira Salazar. Numa palavra e em resumo, parecia ter entendido que a Barragem de Cahora Bassa foi construída numa perspectiva colonial – fascista. E, acrescente-se, de acordo com uma estratégia militar que visava, em ultima análise, permitir a continuidade da permanência de Portugal em Moçambique. Como país dominador, obviamente. E que havendo entendido, o que afinal parece não ter ainda percebido, havia aceite passar a accionista minoritário da Hidroeléctrica de Cahora Bassa. Mas, ao que se verifica, enganou-se quem pensou que outros assim haviam pensado, que outros eram movidos por esta visão. É que, entre os outros, há alguns com desejos e com interesses bem diversos, bem diferentes. Diferenciados. E, a prova aí está, através de declarações públicas, recentes, de governantes portugueses. Cuja argumentação é menos do que falaciosa. O pode querer dizer, o que bem pode significar, que os objectivos e os interesses de quem fala não os mesmos que quem manda falar. Que há interesses escondidos, que há interesses cruzados.