quinta-feira, setembro 28, 2006

Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo de Setembro 24, 2006


antes e depois

Luís David



só o trabalho permite reduzir a pobreza


Sem que seja ainda prática corrente, já se registam gestos de solidariedade entre moçambicanos. Um pouco de todo o país, surgem notícias de apoio, de ajuda a necessitados. Uma ajuda que se destina a resolver situações pontuais. Contudo, pode muito bem reflectir, parece reflectir, alguma capacidade e desejo de minorar sofrimentos de quem nada tem. Nada possui. De tudo carece. Parece ser, e pode muito bem ser, o despertar de um sentimento que, certamente, pode ser ampliado. Que deve ser ampliado. Como iniciativa local e nacional. Como movimento de ajuda de moçambicanos a moçambicanos. Como movimento de carácter permanente. Enquadrado, dirigido, controlado por instituições ou associações existentes ou a criar. A quem os interessados possam fazer chegar, de forma regular e organizada, os seus donativos. A realidade recente mostra existir vontade de ajudar, mostra existir alguma capacidade interna para ajudar, mostra existir um sentimento de solidariedade latente. Que se revela e que se manifesta útil em situações pontuais. Mas que pode não estar a ser devidamente aproveitado. E que bem poderia ser incentivado e orientado para caminhos bem úteis. Como seja, por exemplo o apoio à velhice. Através da construção e apoio na manutenção de lares para idosos. Que, certamente, deixariam de ter necessidade de mendigar pelas artérias das principais cidades. Neste contexto, a criação de uma associação de amigos dos idosos pode não ser uma utopia. Pode ser uma realidade.


Os gestos de solidariedade tornados públicos até agora, são pessoais, pontuais e isolados. O que em nada tira mérito a quem pratica essas acções. Muito pelo contrário. Podem e devem ser apontados como exemplos a seguir. O que parece errado, o que parece abusivo, é que estejam, em alguns casos, a ser noticiados como exemplos de combate à pobreza. Não são nem nunca poderão ser exemplo de combate a nenhum tipo de pobreza. São, isso sim, ajuda. São apoios úteis e necessários para resolver situações pontuais e casos de necessidades pontuais. E, ainda bem que os resolvem. Bom seria, até, que mais houvessem. Que mais pessoas de predispusessem a apoiar outras pessoas em situação de carências extremas. Agora, teremos de ter algum cuidado quando pretendemos enquadrar gestos de solidariedade no combate à pobreza. Primeiro, porque o combate à pobreza não se faz isoladamente nem com donativos. Segundo, porque podemos estar a criar uma ilusão que conduza a relaxar motivações já existentes para o trabalho. Porque, naturalmente, só o trabalho permite gerar riqueza e reduzir a pobreza. Digamos, aceitemos, que na nossa realidade, o trabalho pode não ser tudo. Que não é tudo. Claro que não. Mas, o trabalho não é tudo na nossa realidade, como o não foi em realidade nenhuma. Em nenhuma outra parte do mundo. O que parece certo, sem risco de desmentido, é que só o trabalho permite reduzir a pobreza.