domingo, novembro 07, 2004

Publicado em Maputo, Moçambique no Jornal Domingo de 7 de Novembro, 2004

antes e depois

Luís David


que seja uma ida sem vinda


Como todos sabemos, o Mundo é redondo. Mas, também é pequeno. Pequeno no sentido em que o que se passa, o que acontece, neste momento, em um qualquer ponto, é conhecido quase no imediato a um nível global. Graças, naturalmente, às modernas tecnologias de informação e de comunicação. Foi por isso e graças a estas tecnologias, que ficámos a saber, em tempo quase real, que os observadores da Organização para a Segurança e Cooperação da Europa (OSCE) haviam sido impedidos de entrar nas assembleias de voto nos Estados Unidos. Um dos deputados europeus disse à Imprensa que “nós não fomos autorizados a entrar nas assembleias de voto”. E, terá acrescentado, “é um problema, pois, embora tenhamos sido convidados oficialmente para seguir estas eleições, não fizeram passar essa mensagem às assembleias de voto”. Pior, segundo o referido observador, foi mandado para trás em três das quatro assembleias de voto que quis visitar. Quer isto dizer, salvo melhor opinião, que os três observadores europeus foram obrigados a cumprir a legislação americana sobre matéria eleitoral. E, tenham ou não gostado, tiveram de a cumprir. E de se calar. E, parece que se calaram como se cala o cordeiro quando se sente ameaçado pelo lobo. Diz, ainda, a mesma notícia, que os observadores da OSCE “recolheram as suas experiências sobre a democracia norte-americana para um relatório a elaborar sobre o mesmo tema”. Mais não diz a citada notícia mas, podemos especular sem risco de erro, entraram no primeiro avião e regressaram aos seus países europeus. Onde, certamente, e é invariavelmente assim, irão afirmar missão cumprida.


Nós por cá, nestas quentes terras do Índico, em tempo de eleições, também recebemos observadores europeus. Ainda bem. Ainda bem, porque é sempre bom receber visitas. Visitantes ilustres, se assim se pode escrever. E, ainda bem porque, sendo Moçambique um país territorialmente bem mais pequeno do que os Estados Unidos da América, teve a honra de acolher, de receber, com muita antecedência, um número de observadores eleitorais europeus muito maior do que aquele que receberam os norte-americanos. Certamente, creio sinceramente, isto não é por sermos um país de pretos nem por os europeus nos considerarem um país de corruptos. Será para nosso bem, na sua óptica. E, eles, assim acreditam, assim o dizem, assim tentam fazer acreditar. Daí, certamente, o seu empenhamento em declarações públicas, as suas conferências de Imprensa onde se podem escutar declarações de intimidação e de ameaça. Em última análise, de chantagem. A estes senhores, ditos observadores, ditos observadores imparciais, não lhes assiste mais nenhum direito que não seja o de observarem e respeitarem a legislação moçambicana. Da mesma forma que respeitaram a legislação norte-americana. Por muito que isso lhes possa ter custado. Em termos de observação eleitoral, a União Europeia não tem o direito de aceitar, num caso, um critério americano e, noutro recusar o mesmo critério moçambicano. Pelo simples facto de ser moçambicano. Indígena de África. Querem não fazer relatório nenhum, querem ir embora, querem regressar à pátria Europa, pois que sim, que vão. Que regressem em paz. Mas, que seja uma ida sem vinda.