domingo, dezembro 14, 2008

colocam em dúvida se vivemos num estado capturado

Muitas e muitas vezes, ganham direito a letra de Imprensa críticas a telenovelas. Sobretudo de origem brasileira. Mas, nós por cá, internamente, também temos as nossas novelas. Uma delas, conheceu novo capítulo. Novo episódio. Se é novela humorística, se é dramática, se é trágico – cómica, ainda ninguém se atreveu a classificá-la. Mesmo com esta falta, com esta falha, com esta ausência de clarificação e sem sabermos quando iremos assistir ao próximo episódio, ao próximo capítulo, podemos sugerir título para a farsa. Entre os vários e muitos possíveis, aqui ficam algumas ideias: “Anibalzinho feliz e de novo entre nós”, “Sempre igual entre pares”, “Vergonha nacional”. A escolha do título, como se oferece óbvio, fica ao critério de cada leitor. Desde já e com a advertência de que a sua escolha vale nada. É igual a nada. Ao que foi também noticiado, sete agentes da Polícia estão a ser investigados. Sobre como terá saído da cadeia o tal de Aníbal, e mais dois outros reclusos. Todos os três, agora, com direito à exposição das suas fotos em locais públicos. Quer dizer, agentes da Polícia deixaram-nos fugir. Agora, a Polícia pede-nos a nós, cidadãos honestos, pacíficos, pagadores de Impostos ao Estado, ajuda na sua captura. Não de um dos fugitivos. Dos três. Sem sequer explicar e mantendo como mistério o motivo pelo qual todos os três saíram da cadeia no mesmo momento e pelo mesmo processo. Também tem coincidência, no tempo, a detenção de três indiciados no assassinato de Siba-Siba Macuácua. Como coincidência no tempo tem, a liberdade, sob caução de dois dos acusados no chamado “Caso Manhenje”. Muito provavelmente, aquilo que parecem ser coincidências no tempo, serão nada mais do que isso. Serão, apenas coincidências. Mas, convenhamos, apenas assim.


Em “Há mais bicicletas – mas haverá desenvolvimento?”, Joseph Hanlon e Teresa Smart transportam-nos e fazem-nos recuar no tempo. Uma viagem que, sendo um recuo, é, também e essencialmente, um desafio para a compreensão do presente. Do nosso hoje. Escrevem os autores (pag. 235), depois de definirem o que entendem por “estados predadores” e “estados desenvolvimentistas”: Vemos que a Frelimo estava dividida em dois grupos, o “estado predador” e o “estado desenvolvimentista”, segundo estas duas abordagens. Alguns dentro da Frelimo tentaram bloquear a predação dos outros e fazer força por um capitalismo mais benigno, mais social-democrata, com um grau maior de intervenção. E, pouco adiante (pag. 237), acrescentam: Muitos do grupo predador cada vez mais pareciam convencidos de que lhe pertencia uma porção de tudo o que estivesse a acontecer. Era difícil para Moçambicanos ou estrangeiros montarem negócios sem que um membro da elite da Frelimo recebesse uma porção. Em licenças, autorizações e concessões de terra tinha de haver sempre subornos ou participação. Os moçambicanos começaram a “falar de cabritismo”. Já na página seguinte, depois de explicitarem o que consideram Corrupção Administrativa e Captura do Estado, escrevem os autores: Cabritismo pode envolver dois tipos de corrupção. Mas a captura do estado tornou-se cada vez mais evidente nos anos 90. Um aspecto fundamental da captura do Estado, segundo um estudo do Banco Mundial, é a “venda de decisões cíveis e criminais dos tribunais a interesses privados (e) má utilização dos fundos do Banco Central”, que aparecem cada vez mais. O sistema judicial tem sido mantido deliberadamente fraco, de modo a que casos contra a numenclatura sejam deixados no esquecimento. De facto, em concreto e salvo opinião contrária, quando um tal de Aníbal e seus comparsas de crime entra e sai da prisão, colocam em dúvida se vivemos num estado capturado.

domingo, dezembro 07, 2008

um direito de soberania

O Conselho de Ministro aprovou, esta semana, um decreto que fixa quotas para a contratação de trabalhadores estrangeiros. Mais precisamente, define a percentagem de trabalhadores estrangeiros permitida em função do número de efectivos totais. A medida, como é fácil de perceber, pretende desencorajar a contratação de estrangeiros e proteger o emprego de nacionais. A medida, em si, é bem vinda. A medida, em si, é correcta. Necessita é de ser aplicada com rigor. E, para atingir os efeitos pretendidos, não pode admitir excepções. Nem desvios de aplicação. É que na edição do mesmo dia do “Notícias” (03.12.08, pag. 27), o matutino escrevia: “Inspector do Trabalho Suspenso em Maputo”. Isto, devido ao seu mau comportamento. A local tinha como origem um comunicado do Ministério do Trabalho. De acordo com o qual o inspector em causa é apontado tanto por colegas como por diversas entidades empregadoras da província de Maputo, como estando a denegrir a imagem da instituição ao se envolver em muitos esquemas ilícitos nas inspecções laborais. Ora, perante este caso, perante esta situação, perante mais esta situação, o problema não está na lei. Não está na legislação existente ou que possa vir a ser aprovada. Por mais elaborada e por mais perfeita que o possa vir a ser. O problema está nos funcionários a quem é confiada a nobre missão de aplicar a Lei. E, sobre esta questão, ao que parece, estaremos todos claros.

Nesta mesma semana (“Magazine”, 03.12.08), ficámos todos a saber que dois cidadãos paquistaneses foram detidos, em Moçambique, com mais de 2.3 milhões de dólares, libras e euros. Na fronteira de Machipanda. Acrescentemos, para melhor entendimento dos factos, quando iam a sair de Moçambique. Quando iam a sair com todo esse dinheiro. Logo, não eram investidores. Que, por aqui, tanto são reclamados. E, publicamente, acarinhados. Acrescente-se que se trata, também, de um dos primeiros casos em que os detidos têm nome. E em que a notícia é fértil em detalhes. Mas em que, como é comum neste tipo de notícias, os detidos nada sabem. Dizem não ser eles os donos do dinheiro. Dizem terem sido, apenas, contratados para transportar o dinheiro. Como dizem não conhecer o nomes dos donos do dinheiro. Comum a outros casos, é facto de terem tentado subornar os agentes que os detiveram. Ao bom estilo da mafia e da camorra napolitana. Digamos, acrescentemos. Não menos surpreendente é a libertação de uma moçambicana, que também tem nome e morada, acusada do tráfico de estrangeiros. No total, eram 18 entre cidadãos de nacionalidade paquistanesa e indiana. Que não se sabe ao que vinham. Nem ao que iam. Ou que ninguém quer revelar com pormenor. Provavelmente, para evitar mortes mais do que certas. Mas que são inevitáveis. Que sempre aconteceram. Quando se entra em jogos políticos e quando e onde quem está no poder tem poder nenhum. Em tese, colocam-se duas questões pertinentes. É, em primeiro, a questão de saber se quem pensa que manda, manda. A segunda, é a questão de se quem manda, efectivamente, manda. Na prática, nem sempre quem pensa que manda, efectivamente, manda. Na prática e na realidade, muitas das vezes, o poder é simples ilusão. E, se assim, ter a ilusão do poder é não ter poder. O poder só é poder quando quem tem poder de exercer o poder sabe exercer o poder. O poder é, em última análise, um direito de soberania.

domingo, novembro 30, 2008

um presente envenenado

Muito provavelmente, a este tempo, já terão sido divulgados os resultados finais das eleições autárquicas. Que, podem ter acrescido, que podem ter acrescentado pouco ou nada aos resultados parciais. Que poderão trazer novidade nenhuma em relação ao que vinha sendo conhecido. E, o que era conhecido atribuía a presidência de 42 dos 43 municípios à FRELIMO. As perdas da RENAMO, neste capítulo, parecem motivar algum descontentamento interno. Daí que quadros desta formação política tenham vindo a público defender a realização de um congresso extraordinário. De facto, a este nível de governação, a RENAMO perdeu terreno e perdeu espaço. Governa, hoje, em menos locais. Para se ser claro e objectivo, governa em nenhum local. Não governa nenhum município do país. Aparentemente, estamos perante um fenómeno que contraria a lógica. Porque a lógica seria consolidar posições antigas e conquistar novas. Assim não aconteceu. Mas, certamente, haverá outros aspectos a não perder de vista. Quando e principalmente, no seu íntimo, Afonso Dhlakama, já possa ter assumido que tem um mínimo de possibilidades de vir a ser Presidente da República. Talvez possibilidades nenhumas.

Vista a questão por prisma diferente, fica, neste momento, por saber quem irá ou quem poderá partilhar a vitória pessoal de Daviz Simango na Beira. E, muito claramente, se a vitória de Simango pode significar, em termos de futuro, uma derrota da RENAMO ou uma derrota da FRELIMO. A RENAMO, como a conhecemos hoje e conhecendo a sua génese, parece facilmente integrável. É facilmente dominável pela FRELIMO. Ou por uma certa FRELIMO. Será uma questão de negociação. De estatuto a conceder ao seu líder. Que já percebeu, que já entendeu, que tem hipótese nenhuma de chegar, em tempo algum, a Presidente da República. Por isso, resta-lhe a possibilidade de continuar a negociar para manter o estatuto de líder da oposição. O que já não será mau. E, ao que parece, não irá para além das suas ambições. A vitória de Simango na cidade da Beira, não é, em si, um processo simples. A sua governação vai exigir alianças. Pode vir a motivar a criação de novas formações políticas. Do que parece existirem poucas dúvidas. Por certo, os derrotados Namburete, em Maputo, e Samo Gumo, na Matola, serão potenciais aliados do vencedor na cidade da Beira. Às próximas presidenciais. Se assim, estamos perante um presente envenenado.

domingo, novembro 16, 2008

que a morte de Makeba inspire Saviano para novos combates

Miriam Makeba morreu aos 76 anos. Morreu perto de Nápoles, na Itália. Morreu de crise cardíaca e após ter cantado. Em missão das Nações Unidas e para chamar a atenção do mundo para uma questão aparentemente simples. A da necessidade de um muito maior empenho no combate ao crime organizado e ao tráfico de drogas. Ao crime organizado que, naquela região, tem como expoente máximo a Camorra. Ou, se se preferir morreu no decorrer de um concerto em homenagem a Roberto Saviano, autor de “Gomorra”. Que, hoje, vive “oculto e sob protecção policial”. Após a edição deste seu primeiro livro, que já vendeu mais de um milhão de exemplares em Itália. Um livro sobre o qual o “The Guardian” escreveu: “(...), de vez em quando, é preciso parar e relembrar que se trata da vida de uma grande cidade, numa nação rica, na Europa Ocidental; em membro fundador da UE; um país cujos negócios se interligam – perigosamente, sugere Saviano – com os nossos.

Roberto Saviano nasceu em 1979 em Nápoles, onde vivia a trabalhava até que, em Setembro de 2006, o êxito do livro, que cita nomes e lugares, o obrigou a viver oculto e sob protecção policial permanente. “Gomorra”, foi editado em língua portuguesa, com data de Janeiro de 2008, pelas Edições Asa II. Trata-se de um trabalho de jornalismo de investigação. Ou, se assim se preferir, de uma viagem ao mundo dos negócios e do crime da Camorra. Onde impera o “trabalho infantil”, tema que irá merecer abordem em próxima edição. Dizer que, após mencionar o número de mortos, ano por ano, desde 1979 até 2005, Roberto Saviano escreve: Três mil e seiscentos mortos desde que nasci. A camorra matou mais do que a máfia siciliana, mais do que ‘ndrangheta’, mais do que a máfia russa, mais do que as famílias albanesas, mais do que a soma dos mortos feitos pela ETA em Espanha e pelo IRA na Irlanda, mais do que as Brigadas Vermelhas, do que os NAR e mais do que todas as vítimas do Estado ocorridas em Itália. A camorra matou mais do que todos. E, logo a seguir, para que não percamos de vista o local a que se refere, acrescenta: Aqui é o coração da Europa. Aqui se forja a maior parte da economia da nação. Quais são as suas estratégias de acção, pouco importa. O que é necessário é que a carne para canhão permaneça atolada nas periferias, rebentada nos emaranhados de cimento e lixo, nas fábricas clandestinas e nos armazéns de coca. E que ninguém faça sinal, que tudo pareça uma guerra de bandos, uma guerra de maltrapilhos. Já na página seguinte (147), o autor de “Gomorra” escreve: A matança de Secondigliano atrai a atenção que faltava pelas dinâmicas da camorra há vinte anos. No norte de Nápoles a guerra mata em pouco tempo, respeita os critérios jornalísticos da crónica, em pouco mais de um mês acumula dezenas e dezenas de vítimas. Parece feita de propósito para dar um morto a cada enviado. O sucesso para todos. Foi, sem dúvida, para chamar a atenção do mundo sobre como se desenvolve o crime organizado naquela região de Itália que Makeba aceitou participar num concerto em Nápoles. Dizer que morreu como sempre soube viver, é nada. Dizer que morreu a lutar contra injustiças sociais, é pouco. Mas, talvez seja justo considerar imperativo que a morte de Makeba inspire Saviano para novos combates.

domingo, novembro 09, 2008

não passavam de farinha do mesmo saco

A campanha eleitoral para as Autárquicas do próximo dia 19, está em marcha. Os concorrentes à presidência dos 43 municípios já se fizeram à rua. Isto é, iniciaram as suas campanhas de propaganda eleitoral. Pelos discursos ouvidos nos dois primeiros dias, não existe matéria para qualquer tipo de avaliação. Para fazer uma avaliação. Para que se possa dizer onde e se há só promessas realizáveis. Ou se, pela inversa, também há promessas eleitorais que os candidatos sabem, de antemão, não poder nunca vir a cumprir. De registar, de salientar, o facto de o primeiro dia de campanha ter sido calmo. Pese o facto de uns poucos incidentes, isolados e localizados, entre simpatizantes de partidos concorrentes adversários. Neste contexto, resta desejar que este tipo de incidentes tenham sido os primeiros e os únicos. Que não se repitam. Que não tenham sequência e que tenham sido, apenas, precedente. De resto, a violência, o confronto físico não levam a local nenhum. Não podem resolver problema nenhum. E, se há ou quando houver violação da Lei, existe apenas uma solução. Só existe uma solução legal e civilizada. A do recurso às autoridades competentes.


Já no interior da RENAMO, surgem discursos diferentes. Bem diferenciados. Discursos, aparentemente, antagónicos. O que também não admira. Por não ser a primeira vez que tal acontece. De um lado, está o discurso belicoso e incitando à violência primária. Ameaçador. Do outro lado, ouve-se um discurso conciliatório, pacifista, legalista. Um discurso que, no mínimo, aponta para a aceitação do veredicto final do Tribunal Administrativo. Isto, depois de a Comissão Nacional de Eleições ter confirmado a exclusão de três candidatos deste partido. À presidências de outros tantos municípios. Devido à apresentação de documentação irregular. Ameaçar boicotar as eleições caso os referidos candidatos sejam, definitivamente, excluídos, não leva a lado nenhum. Revela, isso sim, uma total falta de cultura política. E um elevado défice democrático. A menos que estejamos perante uma nova estratégia eleitoral. Ou uma farsa. Com o objectivo de criar, única e exclusivamente, factos políticos. Em que possa haver uma divisão de tarefas. Segundo a qual, a um cabe a tarefa de desempenhar o papel de mau. Para o outro, fica a tarefa de desempenhar o papel de bom. Se assim, o método não contem qualquer inovação. Não constitui novidade. Possa não ter sido inventado pela polícia política colonial, foi por ela muito utilizada nos interrogatórios dos presos políticos. Uma vezes, eram interrogados pelo polícia mau. Noutras ocasiões, pelo polícia bom. Na verdade e em definitivo, não passavam de farinha do mesmo saco.

domingo, novembro 02, 2008

que se pronunciem os donos da verdade

Quando as águas do Nilo saem do leito do rio e inundam as margens, não há motivo para alarmes. Significa que as terras marginais, as terras adjacentes, ficam, naturalmente, fertilizadas. Significa época ou ano de cultura fértil. Abundante. Os homens não podem, não têm meios nem técnica nem poderes para evitar que as águas do Nilo saiam do seu leito normal. Habitual. Mas, em termos agrícolas, em termos de agricultura indígena, sabem como tirar o máximo de benefícios, o máximo de rendimento nas terras cobertas por muitas toneladas de lama. A lama, transportada para as margens pelas águas da inundação, é como que um benefício dos céus. Nós, por cá, parece não termos, fenómenos semelhantes. Nem cultura assim. Nós por cá, temos queimadas. Tema de muita falácia em tempos recentes. Modernamente, chamam de queimadas descontroladas às queimadas feitas pelos nativos. Pelos indígenas. Muito provavelmente, trata-se de um termo sugerido por uma qualquer ONG. Para não dizer imposto. Quer-se dizer, um eufemismo. Ora, digamos, com toda a propriedade, as queimadas, em si mesmas, não são um mal. E, constituem um factor importante na fertilização dos solos. As queimadas não começaram a ser feitas em Moçambique. Nem começaram a ser feitas ontem. Nem há dez, cinquenta ou cem anos. As queimadas começaram a ser feitas em épocas remotas. Remontam ao tempo em que o homem aprendeu a fazer fogo. Aqui, estamos a falar em termos de milénios. As nossas queimadas, nacionais, moçambicanas, não são descontroladas desde ontem nem desde de anteontem. Sempre foram descontroladas. Porque, se quisermos ser sérios e honestos, não há processo de controlar uma queimada a partir do momento em que é lançado fogo na mata. O que está a acontecer, parece simples. Elementar. As queimadas ditas descontroladas começaram a afectar interesses estrangeiros instalados. Interesses do capitalismo selvagem. Que nada têm a ver com a defesa da natureza. E, muito menos, das populações locais.


Dois incêndios no edifício do Ministério da Agricultura e um em serviços dependentes do Ministério das Finanças, em curto espaço de tempo, justificam alguma reflexão. Deveria. E uma reflexão séria e honesta. Mais do que uma reflexão, uma investigação. Que vá para além do que é óbvio e por todos sabido. Da esfarrapada desculpa da falta de meios para combater o fogo. A questão de fundo, nos casos em apreço, não é se existiam ou não existiam meios para combater o fogo. A questão de fundo não está em saber se os edifícios têm ou não escadas exteriores. Todos sabemos que não têm. E, não têm, aqui, como o não têm em nenhum outro país do mundo. Por tal não ser obrigatório. Em nenhum país se obriga a existência de uma escada interior e outra exterior. Sempre e quando exista um elevador. De resto, se o edifício não tinha condições de segurança para albergar um departamento do Estado, deveria ter sido recusado para tal fim. Mas, todas estas questões não passam de questões periféricas. Secundárias. Em definitivo, o que está em questão é saber se estamos perante simples acidentes, perante incidentes ou perante actos de sabotagem. Se sim ou se não, que se pronunciem os donos da verdade.

domingo, outubro 26, 2008

somos a favor da Revolução Verde

Há, hoje, ao que parece, muitas definições para Revolução Verde. No saber, no conhecer e na simplicidade de Lina Magaia, Revolução Verde é produzir para comer. Guebuza não precisa de dizer como se faz a Revolução Verde. Ela faz-se produzindo (Magazine, 22 do corrente). Para mim, guardo uma visão, talvez, mais académica. Menos prática. Mais teórica. Passa por querer saber como se pode e se deve fazer esse produzir para comer. E se produzir para comer é uma primeira ambição, um primeiro objectivo, se se deve ficar por aí. Se não é necessário produzir para além das necessidades imediatas, básicas, primárias. Se não é preciso produzir excedentes. Se não é preciso produzir para o mercado. E, se para se produzir para o mercado, se torna imperioso ou não que esse mercado exista. Ora, se não existe, tem de ser criado. Logo, em paralelo com o aumento da produção e da produtividade, com a criação de excedentes, não podem ser ignorados os meios e os mecanismos que permitam a troca. O funcionamento do mercado. Mas, convenhamos, a Revolução Verde não é um processo mecânico nem mecanicista. Não se limita à mera produção de produtos agrícolas. Passa pela sua transformação. Passa pela produção animal. Pela abertura e melhoramento das vias de circulação. Pelos meios de circulação. Pela expansão dos meios de comunicação para os centros urbanos rurais. Como o telefone, a rádio, a televisão. Exige, sem dúvida e por último, uma forte intervenção do Estado. Aos mais diversos níveis. A começar pela tentativa de quebrar resistências à mudança. A começar pela tentativa de alteração de hábitos e de costumes, que se verifiquem como entraves ao processo. Que é global.


Nesta semana que terminou, Maputo acolheu mais uma reunião da Via Campesina. Ao que parece a primeira em África. Esta organização foi criada em 1992. Trata-se de um movimento autónomo, pluralista, mas com ligações políticas e económicas. A avaliar pelos pronunciamentos públicos feitos na capital moçambicana, é contra a Revolução Verde. Reprova a Revolução Verde. Ao que parece e pelo que se ouviu, de forma absoluta e radical. Fundamentalista. O que não poderá conduzir a nada de bom nem de positivo. Aconselha o saber feito de experiência que se deve ser mais ponderado. Mais pragmático. Ora, que se seja contra uma revolução verde feita à base de sementes geneticamente modificadas, todos somos. Porque, para além de outras questões, deixa o camponês dependente de novas sementes em cada sementeira. Ou seja, dependente de multinacionais para quem a fome dos camponeses é o objectivo do seu negócio. Mas, atenção. Uma coisa é ser-se contra uma revolução verde feita à base de sementes geneticamente modificadas. Outra, é ser-se contra a Revolução Verde. Nós por cá, nós em Moçambique, somos a favor da Revolução Verde.

domingo, outubro 19, 2008

somos potenciais alvos dos criminosos

Com certa regularidade, a Polícia vem a público informar o que foi a actividade criminosa em determinado período de tempo. Ou num certo espaço geográfico. Quase, ou sempre, vem prestar essa informação em determinado ou certo dia da semana. Sempre à mesma hora e no mesmo local. Como acontece com as missas dominicais. A que os crentes assistem, um pouco por todo o país. Ou a que se obrigam a assistir. Porque querem e a isso os move a sua crença. Já em termos de informação policial, em termos de informação sobre a segurança a ordem públicas, as coisas deveriam ser diferentes. Deveríamos saber mais, muito mais do que aquilo que nos é dado saber. E, em tempo útil. Enquanto não, continuaremos a saber do assalto aqui, do roubo além, depois, muito depois de consumados. Em momento algum, que a memória recorde, terá havido notícia da antecipação da actividade policial. E que terá vindo a público dizer isso mesmo e aconselhar os cidadãos sobre a forma de se protegerem. De se precaverem de assaltantes e de ladrões. Fornecendo, inclusive, números de telefones para chamadas de emergência. Numa acção diária e concertada. Repetida. Através de jornais, de rádios, de televisões. Que é, que devia ser assim, ninguém o ignora. Se não é feito assim, talvez seja porque outros e diferentes interesses se levantam. Porque outras e mais altas vozes se fazem ouvir. Ou escutar. Ou são ouvidas.


Parece haver alguns tipos de crime em relação aos quais a Polícia está a evitar reportar. Divulgar dados, números e contornos. A chamar a atenção. A alertar o cidadão para que este se possa precaver e evitar ser vítima de bandos criminosos. Repito, de bandos de criminosos. Que estão e continuam a actuar, impunemente, na capital do país. Trata-se de casos que, não tendo sido divulgados publicamente, foram reportados à Polícia. Que aconteceram. E, acontecerem á relativamente bastante tempo, como estão a acontecer no presente. Como estão a repetir-se no presente. São os casos de indivíduos que, em certas zonas da cidade, se atiram contra viaturas em movimento. E que simulam terem sido atropelados. A partir daí, choram e clamam por socorro. Simulam fracturas múltiplas. Umas vezes nas pernas. Outras nos braços. Outros, contusões no tórax. Querem ser, todos eles, transportados até ao hospital na viatura que dizem os ter atropelado. Mas, não sós. Na companhia de amigo pedestre que, entretanto, chega local. Ou de amigo que, por “acaso” passava na sua viatura. Quando descoberto no Hospital, se aí consegue chegar, o vigarista ensaia a fuga. A Policia sabe que está a acontecer assim. Sabe e tem provas de vários casos protagonizados pelo mesmo indivíduo no espaço de poucos dias. Em diferentes pontos de Maputo. Sabe que um mesmo indivíduo simulou ter sido atropelado num espaço de poucos dias. Terá registos das ocorrências. Se fez alguma coisa para o neutralizar, será segredo policial. Como sempre acontece. Que fez coisa nenhuma para evitar possíveis novas vítimas, fez. Quer dizer, não fez. Mas, para além de não ter feito, como habitualmente não faz, ou faz mal, evitou alertar o cidadão para os novos processos utilizados pelos criminosos. Daqui resulta, em último, que todos nós somos potenciais alvos dos criminosos.

domingo, outubro 12, 2008

Assim haja vontade

A corrupção não é fenómeno típico nacional. Moçambicano. Existe por aí. Existe pelo mundo fora. Embora revestido ou vestido com as mais diversas e diferentes roupagens. As mais diversas formas de camuflagem. A corrupção, pode ser comparada a uma hidra. Está e vive onde há dinheiro. Começa onde há dinheiro. Acaba quando acaba o dinheiro. Mas, como dinheiro nunca acaba, apenas muda de mãos ou de local, ensaia transformação. O que se passa no sector das estradas, pode ser apenas um caso. Talvez exemplar. Como parece ter confirmado a 7ª Reunião Anual da Associação dos Fundos de Manutenção de Estradas em África. Esta semana realizada em Maputo. E, no decorrer da qual terá havido consenso entre os participantes que a corrupção nos concursos públicos para obras de manutenção de estradas constitui uma séria ameaça para as economias de muitos países africanos por conduzir ao descaminhos de elevadas somas do erário público. (Notícias de 8 do corrente). E, a local adianta que uma das propostas apresentadas vai no sentido de os países africanos simplificarem os procedimentos que regem a gestão dos concursos públicos, o que pode ser alcançado através da redução do número de pessoas envolvidas tanto na negociação como na celebração dos contratos. Acreditamos e aceitamos que a proposta tenha sido elaborada por sábios. Só que os tais procedimentos, muitas das vezes, são impostos pelos doadores. E, havemos, também, de reflectir que entre os doadores não há sempre nem só homens puros, Honestos, Também os há com as suas fraquezas. Com os seus fracos pelo dinheiro. Quer dizer, menos sérios, menos honestos. Talvez, até e em última análise, desonestos. Corruptos.


Em termos de corrupção e de desvios de dinheiro do Estado, continuamos sem motivos para alegria nenhuma. Muito pelo contrário. Primeiro, foram as detenções relacionadas com o chamado “Caso dos 220 milhões do MINT”. Até ao presente sem grande evolução. Depois, agora, muito se escreve sobre a forma de gestão da empresa Aeroportos de Moçambique. A serem verdadeiros os dados e os números divulgados, estamos perante um escândalo. Mais um. Envolvendo, neste caso, figuras que se consideravam de reputadas. Acima de qualquer suspeita. Figuras a que alguns chamam de colunáveis. Possa acontecer, por hipótese, que paguem para o ser. Ou o parecer ser. Mas, isso, até pouco importa. Serão questões menores. A questão de fundo, é muito outra. É a de saber o destino a ser dado aos bens que possam ter adquirido com o dinheiro que constitui motivo de detenção. É a questão de saber se, acaso condenados e depois de cumprida a pena, continuam na posse e beneficiar dos bens adquiridos com dinheiro obtido de forma ilegal. Ou se, pelo contrário, quando comprovado o desvio de fundos, esses bens revertem para o Estado. De resto, já é tempo de se investigarem muitos sinais exteriores de riqueza. Capacidade para tanto parece existir. Assim haja vontade.

domingo, outubro 05, 2008

não podemos viver na ambiguidade

O país que somos, parece viver sob a lógica da contradição. Ou sob o síndroma da contradição. Talvez nem seja o país. Não o é. Com toda a certeza. Será apenas uma parte do país. Uma parte pequena. Talvez ínfima. Digamos que a elite. Mas, muito provavelmente, nem ela. Nem toda ela. Que seja, então, apenas uma parte dela. E, uma parte da parte que lê e escreve para jornais. Que se pode fazer ouvir nos audiovisuais. O que leva a ter de colocar a questão se. E, se, como. Ou seja, se essa minoria, se esses tantos poucos, possui capacidade para exercer influência, para influenciar os outros. Para influir na maneira de pensar dos outros. Não só na maneira de pensar. Também na maneira de agir e de se comportarem. Trata-se de um exercício difícil de resolver. De solucionar. O que não significa que não possa ser resolvido. Ou que não tenha solução. Em teoria, nada é impossível. Em teoria não há impossíveis. Da mesma forma que havemos de reconhecer que quanto sabemos e conhecemos, resulta de descobertas. Não de invenções. De descobertas do existente e, até então, por descobrir. Amanhã, depois, poderá ser diferente. Até ao presente, até ontem, foi assim. Foi convencionado que devia ser assim.

Temos o raro condão, talvez o mérito de desejar, de pedir, hoje, o que recusamos amanhã. Possa até nem ser mérito. Possa ser demérito. Hoje, clamamos pelo combate à corrupção. Dizemos que queremos saber quem se apropriou de bens alheios. De bens e de dinheiro do Estado. Em proveito próprio. Amanhã, quando nos apresentam nomes, dizemos não. E, se facto são esses os supostos, deixem-nos em liberdade. Parece ser o que está a acontecer. Parece ser o que se está a passar perante a detenção de uma dezena de funcionários do Estado. Não de um estado qualquer. Do nosso Estado. Que parece estar a provocar alguma intranquilidade. Algum receio, algum medo. Não questionamos. Parece que se perdeu a capacidade de raciocínio. Ninguém pergunta, ainda ninguém perguntou, quantos postos de saúde ou quantas salas de aulas podiam ter sido construídos com o dinheiro desviado. Quantas motas e quantos carros, quantos sistemas de comunicações ou quantos pares de fardamento poderiam ter sido adquiridos com o dinheiro desviado. Até prova em contrário, parece ter havido desvio de dinheiro do Ministério do Interior. Quem desviou ou quem não desviou, é outra questão. De concreto, sem possibilidade para desmentido, é ter havido desvio de fundos do Estado. Perante esta realidade, coloca-se uma segunda. Que é a de não se acreditar na Justiça quando não tenta fazer Justiça. E de não se acreditar na Justiça quando tenta fazer Justiça. Estamos, sem dúvida, perante uma contradição. Que não é aparente e pode ser resultante de conflitos de interesses. Ou de acções programadas de desinformação. O que parece claro e concreto, é que não podemos viver na ambiguidade.